23 - REVELAÇÕES

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- Você esqueceu aquela história, né? - Paula virou de repente e me olhou de soslaio. Seus cabelos negros estavam presos em um rabo de cavalo no estilo punk.

- Que história? - Fingir estar desentendida, mas a verdade é que eu ainda nutria a ídeia dentro de mim.

- O casamento lá... Da sua irmã. - Eu senti a preocupação em sua voz, mas decidida, respondi:

- Nossa, nem lembrava. - Ela cerrou os olhos e me encarou desconfiada. A verdade é que no pouco tempo em que nos conheciamos, Paula já sabia muito sobre mim, e principalmente quando eu estava mentindo. - Acredite em mim, só lembrei agora que me falou.

- Entendi... Mas você estava tão determinada a alguns dias atrás, que achei que ainda estava pensando nisto, ou que... já estivesse tudo planejado.

- Claro que não.

Me calei por um momento, organizando as coisas em minha mesa de trabalho e vi um novo post do blog aparecer. Eram os novos desafios, e bem no final, no número 15, estava o desafio do suicídio.

- Que miserável... - Falei baixo, mas não o bastante para fazer Paula ficar em silêncio, ela me olhou novamente e esperou que eu continuasse. - Veja isto! - Virei a tela do computador e vi seus olhos soltarem das órbitas.

- Isso é muito ruim. - Vi a expressão de Paula mudar, suas sombrancelhas estavam contraídas e seus pulsos cerrados. - Sabe, o Max nunca me desceu a garganta, mas isso já é de mais, estou a ponto de me mandar deste lugar, só não vou embora porque...

Paula se calou derepente, pensei que alguém estivesse atrás de nós, mas nem um vento batia em meu rosto, então esperei que ela continuase, mas a garota continuou calada e de cabeça baixa. Eu não podia acreditar que ela tinha parado de falar na melhor parte, aquilo já estava virando uma tortura para mim.

- Por que...? - Falei na tentiva de ouvir sua voz. Ela respirou fundo e abriu a boca várias vezes como que quissesse falar algo, mas nada saia. Eu já estava ficando aflita com aquela situação. - Paula, por favor, pela nossa amizade, fala alguma coisa.

- O Max é gay. - Ela falou finalmente e pareceu se sentir culpada.

Parei por um momento. Ser gay hoje em dia, para algumas pessoas, era algo normal e corriqueiro, muitas pessoas eram gays, trans, bis... eu não conseguia entender o que aquilo tinha haver com ela, comigo ou com o Arthur. Mas era óbvio a minha surpresa, o Max, nem de longe, parecia ser homosexual, muito pelo contrário, se outra pessoa tivesse me contado, eu não acreditaria.

- Ta. Grande revelação, mas o que tem haver?

- A alguns anos atrás, um garoto magro e um pouco medrosso, chegou aqui na toca, frustado, sozinho, perdido. Tinha visto um anúncio na internet igual você. Ele era legal e logo conquistou a amizade de todos.

- Era o Max?

- Sim... Mas, tinha um cara que ele se apegou muito rapidamente, era o Arthur, sempre amigo e companheiro, Arthur sempre o ajudava nas tarefas mais simples. A amizade desses dois era de dar inveja, mas um dia, Max resolveu abrir seu coração e expor seus sentimentos a seu "amigo" Arthur. - Paula fez sinal de aspas e se inclinou em minha direção para cochichar as seguintes palavras. - Ele estava apaixonado pelo Arthur.

- Ai meu Deus. - Falei levando a mão a boca. - Eu achava que ele odiava o Arthur pela Ayan, na minha imaginação, os dois disputavam a atenção dela.

- Antes fosse... Arthur não correspondeu ao Max, claro. Mas até hoje ele não se conformou. A amizade deles nunca mais foi a mesma. ARTHUR o respeita pois ainda se sente culpado por tudo, grande besteira, esse viadinho merecia coisa pior. - Paula bateu na messa com força. - Nada contra os gays, mas este órdinario merece!

Alice e Paula, tem certeza que não querem ficar de papinho aqui na minha sala?

Ouvir a voz do líder pelos auto falantes e notei Paula levantar o dedo do meio para uma câmera próxima de nós.

Eu estava completamente chocada. Agora, tudo fazia sentido, o Max sempre fazia questão de machucar o Arthur, fazia questão de me maltratar na frente dele e de vez em quando soltava piadinhas sobre a família do Arthur que eu não sabia aonde estava naquele momento. Agora conseguia imaginar o quanto aquilo era chato para Arthur, o quanto deveria ser ruim toda aquela situação.

- Você está pensativa hoje. - Arthur falou naquela noite enquanto estavamos deitados no tapete em estampas medievais no meu quarto, ele estava com a cabeça apoiada em minhas coxas, e se concentrava em contar o número de cortes que eu carregava no pulso.

- Desculpa... - Afastei os meus braços dele e lhe encarei ainda longe. Eu estava pensando em como saíria da toca no dia seguinte, e que desculpa eu daria para não ir ao escritório.

- Ouvir Max reclamando no auto-falante mais cedo.

- Não foi nada de mais. - Falei com um sorriso para disfarçar.

Ficamos fazendo carinho um no outro até que Arthur dormiu ali mesmo. Era tão bom estar ali com ele, era tão maravilhoso ter-lo por perto, era meu momento de scape, não sabia se estava disposta a ariscar tudo aquilo só para ir ao casamento da Ramona.

E foi ali, observando aquele anjo suspirar serenamente, que pensei em desistir de tudo, ou fazer as coisas muito bem feitas. Duas opções, apenas uma escolha.

***

- Bom dia! - Tomei um susto ao abrir os olhos e notar dois olhos verdes me encarando pela manhã. - Eu sei que concordamos em um não dormi no quarto do outro, mas não sei o que aconteceu, acabei apagando ontem, desculpa.

- Não tem problema, amor. - Falei ainda me espriguiçando na cama. - Não vai fazer sua tarefa?

- Alice Collins, você está me expulsando? - Ele falou sorrindo e apertou minhas bochechas com seu jeito desengonçado. Sempre que o Arthur ia me dar carinho, agia de uma maneira como se nunca estivesse experimentado tal coisa, como uma criança aprendendo a andar.

- Estou, preciso me arrumar para começar o dia. - Falei sorrido, mas ele não parecia se importar, apenas me deu um beijo molhado e se foi.

Eu estava realmente ansiosa para que ele saísse, hoje era o grande dia, e nada poderia dar errado. Eu tinha decidido na noite enterior que iria sim ao casamento, e todo o meu plano precisaria estar perfeito.

Peguei o telefone, aquela era a parte em que eu ligava para Max avisando que estava doente.

- Tudo bem, vou mandar Paula ir aí te examinar. - Ele falou da outra linha sem me dar uma única chance de resposta.

Aquilo estava fora dos meus planos, fora da rota, eu precisava convenser Paula de que realmente não estava bem, mas, para a minha surpressa, ela entrou na sala em seu jalecto, sentou-se na cadeira, e acendeu seu cigarro fedorento com as pernas cruzadas.

- Sei o que está fazendo.

- Claro que sabe, estou doente.

- Para Alice! - Ela me olhou irritada. - Eu fazia isso com sua idade para fugir da escola, não tenta me fazer de burra, não à mim.

Fiquei chateada comigo mesma por ser tão óbvia. Já estava dando tchau ao meu plano quando...

- Aonde é o casamento? Vou ficar aqui tentando te dar cobertura, mas não abuse da sorte, volte cedo. - Paula falou um pouco mandona, eu não podia acreditar em tudo aquilo. Soltei da cama para lhe dar um abraço e agradecer-la. - Mas antes, precisamos dar um jeito para que não seja reconhecida, muita gente ficou sabendo sobre você.

- Como assim? - Perguntei curiosa. Paula levou a mão ao queixo e fez uma careta não muito legal...

ALICE Where stories live. Discover now