O piano brilhante

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Senti um cheirinho de lavanda, seguido de uma textura suave e aveludada. Mexi o corpo de leve e eu parecia estar deitada sobre nuvens. Que sensação maravilhosa. Só que aquele não podia ser o colchão de molas assassinas do meu dormitório. Mas se eu não estava sentindo as molas assassinas... Onde estava?

Abri os olhos e fitei o teto branco. Depois olhei para o quarto e vi móveis em madeira num tom próximo ao bege. Fiquei sentada na cama rapidamente e olhei o quarto inteiro. Havia uma porta de vidro e uma cortina branca e fina cobrindo-a. Aquilo estava começando a me assustar.

Onde eu havia dormido se aquele não era meu quarto?

Fiquei de pé e senti o piso de madeira. Percebi que meus sapatos não estavam por perto. Droga, eu não bebi na noite passada. Não tanto para não lembrar o que houve e aonde vim parar.

Fui até a porta e a abri devagar, coloquei a cabeça para fora e vi um corredor enorme cheio de portas brancas assim como a do quarto onde eu estava. Comecei a me lembrar da decoração de madeira escura e alguns tons mais claros misturando-se perfeitamente.

Será que eu havia dormido na casa do Steve? E eu não me lembraria?

Andei sem fazer barulho pelo corredor e cheguei até a enorme escada da entrada e então afirmei que havia dormido na casa dele. Eu não conseguia me lembrar como aquilo havia acontecido, mas acordei ali então dormi ali, era óbvio e idiota de se afirmar.

O lugar estava impecável e vazio, diferente de ontem na festa. Pensei em chamar por Steve, mas desisti. Se outra pessoa me visse e achasse que eu era uma louca ou uma assaltante isso não acabaria bem. Comecei a descer lentamente apoiando-me no corrimão que só faltava me deixar ver meu reflexo de tanto que brilhava.

Aquela casa devia consumir muita cera para brilhar tanto.

Desci andando quase na ponta dos pés até a sala de estar mais próxima, à minha direita, onde eu provavelmente não fui durante a festa, pois talvez reconhecesse. Nessa sala as paredes eram vermelhas e a decoração mais uma vez era em madeira escura, um casamento perfeito entre cores e texturas. A casa era linda, e eu só havia conhecido um quarto e duas salas. E a escada de conto de fadas, é claro.

À minha direita um quadro enorme me chamou atenção. Fui chegando perto sem acreditar no que estava vendo. Um autêntico Salvador Dalí. Só podia ser autêntico ou uma réplica minuciosamente perfeita. Eu podia não ser a melhor pessoa para distinguir se uma obra de arte era autêntica ou não, fui poucas vezes a museus e o que conheço de arte aprendi nos livros que meu pai dividia comigo.

Fiquei perdida admirando a obra ali a poucos centímetros de mim, nos museus não é permitido respirar perto do quadro. Mas ali não. Eu estava quase tocando a pintura para ver se era mesmo real, mas dei um pulo para trás quando ouvi alguém pigarrear alto. Olhei para trás e vi um senhor de cabelos grisalhos, olhos claros e uma cara de bravo de botar medo em qualquer um. Tudo isso dentro de um terno impecável.

- Nova hóspede? - ele falou com uma voz grave e eu senti o leve deboche em seu tom, principalmente quando ele me olhou de cima a baixo.

Eu havia acabado de acordar, estava descalça e com as roupas amassadas. E olhando para um quadro com cara de louca. Eu não estava lá muito apresentável.

- Não. Er... Eu sou... - gaguejei, nervosa na presença do homem que aparentava seus cinquenta anos e me olhava fazendo-me sentir constrangida só de estar ali. - Sou amiga do Steve. - respondi por fim rezando para que isso me salvasse, apesar de eu nem ser amiga dele.

- Amiga do Steven? Que surpreendente. - ele pareceu sorrir rapidamente e então se aproximou com passos lentos e pesados. Percebi que seus sapatos brilhavam como o resto da casa. - Meu filho não traz amigas, é sempre Brad que aparece por aqui ou um outro amigo dele, meio esquisito. - devia estar falando do Josh.

O AcordoWhere stories live. Discover now