Capítulo 26 - O Trio de Estilo Musical Indefinido

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– Eu não-

– Está vendo isso aqui? – Kólia alcançou com dois passos a parede que em que eu estivera trabalhando, e apontou algumas pinceladas que se sobressaíam em relação ao restante. – Você não imagina o quanto de autocontrole está sendo necessário para ele não vir e corrigir tudo. A mão do pincel chega a tremer, olhe lá.

Pavel estreitou os olhos para o amigo, mas ele de fato segurava o pincel com um pouco mais de força que o necessário.

– Observe! Olhe só a veia pulsando no pescoço!

– Chega de besteira – Pavel desmontou a escada com um movimento, dobrando-a e encaixando-a debaixo do braço. – Vamos descer.

Eu catei os objetos que restavam e o segui. Outra escadinha dobrável e equipamentos aguardavam Pétia e Kólia no corredor. Descemos os nove lances, e a cada patamar, a fileira de gente engrossava. Éramos umas trinta ou quarenta pessoas, ao chegarmos ao térreo. Lá, formamos uma fila, para perfurar o cartão de ponto – ou, no meu caso, apresentar a autorização rascunhada por Ióssif para o responsável pela construção.

– Vamos lá para casa hoje? – Pétia convidou, quando nos vimos na rua.

– Não sei... – Pasha titubeou, relanceando o olhar para mim.

– Ah, vamos! Faz tempo que você não aparece. Hoje nem tem desculpa, é a festa da Yulia Mikhailovna, você nem pode ficar lá, mesmo – ele agarrou a manga de Pavel e o balançava enquanto insistia. – Leve ela junto! – exclamou, quando percebeu o motivo da hesitação. – Não vai deixar sua amiga ir embora da cidade sem assistir uma apresentação do nosso trio de estilo musical indefinido, certo? Você odiaria perder um espetáculo desses, não é, moça?

– Certamente – eu ri. – Eu gostaria de ir com vocês... se não tiver problema – acrescentei, para Pavel.

– Então está resolvido – Pétia puxou Pavel, para pô-lo em movimento. – A propósito, encontramos Andriusha no almoço e mandamos ele levar sua rabeca lá para casa.

– É um violino – corrigiu Pavel, agastado.

– E você está dizendo isso para um par de músicos – riu Kólia, dando uns tapas nas costas de Pasha, ao ultrapassá-lo.

Pavel girou os olhos para os amigos, que seguiam na nossa frente, já que a calçada era estreita demais para quatro pessoas andarem lado a lado. Então voltou sua atenção para mim.

– Não quer passar em casa e trocar de roupa? – perguntou. – A gente te espera.

Ele estava realmente incomodado com as minhas calças.

– Não, obrigada – descartei, com um sorriso. – Estou bem assim.

– Tem cer...

– Pelo amor de Deus, Pavel, a mulher passou o dia trabalhando numa construção – Pétia interrompeu. – Não é que não se veja nenhuma, mas é raro – justificou, olhando por cima do ombro. – Tá na cara que ela sabe cuidar. Relaxe, homem. E deixe a garota relaxar.

– Parece até que não confia nos próprios amigos – Kólia se fez de magoado novamente.

– E não confio, mesmo – Pavel empurrou o ombro da muralha à sua frente, que mal se moveu.

Kólia riu e não respondeu. Caminhamos um bom pedaço em silêncio. Apesar de ser quase verão, a presença de tantas águas na cidade esfriava a brisa vespertina, e eu me enrolei melhor no casaco, apressando o passo para acompanhar os rapazes.

– Que história é essa de que você não pode ficar na sua própria casa porque Yulia Mikhailovna está dando uma festa? – eu puxei assunto com Pavel, que caminhava pensativo, um pouco atrás dos amigos.

Dias VermelhosWhere stories live. Discover now