Capítulo 25 - Departamento de Fiscalização

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– Bons sonhos – sussurrou, se acomodando, e o quarto mergulhou em quietude.

Eu tentava não me revirar na cama, para não fazer barulho, mas estava difícil adormecer com a consciência de que o odor que me cercava era o cheiro dele nos lençóis. Havia algo de sensual nisso, ainda que o próprio Pavel não estivesse deitado na cama comigo, mas no chão, próximo à janela.

Passei uns bons minutos assim, lutando para respirar mais baixo. De repente, uma sutil atenuada na obscuridade do quarto me fez olhar para aquele lado. Pavel também não estava dormindo. Afastara um pouco a cortina e observava o lado de fora, seu rosto concentrado plenamente visível à luz de um intenso luar.

– O que está fazendo? – eu sussurrei, sem conseguir me conter, e depois tapei а boca, quando ouvi Anna Anatolievna se mexendo.

Pavel voltou o rosto para mim, e acenou para que eu me aproximasse. Levantei silenciosamente e fui na ponta dos pés até onde ele estava, deitando de bruços ao lado dele, no chão.

– As estrelas estão muito bonitas hoje – ele sussurrou no meu ouvido. – Nem sempre dá para ver aqui em Leningrado, por causa da chuva frequente, então eu gosto de aproveitar quando o céu está assim. Olhe.

De onde eu estava, não dava para ver o vão revelado, e ele não podia afastar muito a cortina, para não iluminar demais o quarto. Não tive escolha a não ser me aproximar um pouco mais e praticamente me debruçar sobre ele para olhar para fora.

Pavel tinha razão. O céu parecia um manto real bem escuro, cravejado de diamantes, uns pequenos, outros graúdos, arrumados numa desordem que talvez formasse um desenho gigantesco, que éramos muito pequenos para entender.

– Realmente – murmurei, após um instante. – Dá vontade de ficar olhando sem piscar.

E, sem reparar, pousei a cabeça no peito magro dele, meus olhos ainda presos lá fora. Ele estremeceu levemente uma vez, e foi assim que eu me dei conta do que estava fazendo. Mas não tive vontade de me levantar. Estava tão bom ali.

– Incomodo? – sussurrei.

– Não – Pavel tornou, após um momento. Acheguei-me melhor a ele, sentindo a quentura da lateral do seu corpo, e o sono finalmente resolveu me visitar. De repente, dedos longos se entremearam em meu cabelo, dançando lentamente sobre o couro cabeludo.

– Incomodo? – ele perguntou, por sua vez.

– Não – eu bocejei. – Fale-me sobre elas – pedi, indicando as estrelas com o queixo. Sabia que ele se interessava por astronomia. A grandeza e o mistério do universo o fascinavam.

– Aquela é a Ursa Maior... – Pavel não demorou a me atender. Seus sussurros faziam leves cócegas em meu ouvido, enquanto a ponta dos dedos ainda brincava com meus cabelos. O cheiro dele estava obviamente mais presente ali do que nos lençóis, mas isso não foi óbice a que eu pegasse no sono, sentindo-me segura e aquecida, os olhos mirando os brilhos do céu até eles borrarem todos, escoando para dentro de um sonho mirabolante.

Alguma coisa apertando meu nariz me fez despertar. Abri os olhos atordoados para dar com um rosto pequenino, encimado por cachos louros, me encarando com curiosidade.

Devushka – balbuciou a menininha. – Kto?

A vozinha aguda despertou Pavel também. Ele se sentou e a pegou no colo, libertando-me das mãozinhas que puxavam meus cabelos.

– Essa é a Masha, Duniasha.

Os olhos claros continuavam me inspecionando.

Mama? – ela perguntou, em seguida. Pavel riu.

Dias VermelhosWhere stories live. Discover now