Capitulo Três

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Allyssa estava encolhida em um canto da sala, seus olhos transmitiam todo o medo e a desconfiança que uma criança pode demonstrar; brilhavam tanto, que pareciam uma estrela perdida no espaço sideral. As bolsas de seus olhos estavam inchadas e rosadas. Cath envolveu seu braço no pescoço de Peter, com tanta força, que ele chegou a pensar que talvez ela o desmembrasse. A poeira que provinha das roupas de Peter ganhou vida e morreu no ar. Seu rosto estava absurdamente suado, um verdadeiro grude.

Ele caminhou, fazendo seus passos ecoarem, quebrando o silêncio mortal da sala de estar. Peter sentou ao lado da irmã, não tinha ideia de como fazer com que ela parasse de chorar. Aliás, ele nem mesmo sabia por que ela estava chorando. Ele beijou o topo de sua cabeça e dos dedos de Allyssa escapou um bilhete amarrotado. Ela olhou para o irmão, depois para Cath e por fim para o bilhete, que de tão amassado parecia uma bolinha de papel.

Ao ser aberto, o bilhete fez um farfalhar e os olhos do Peter percorreram aquelas letras.

“Queridos filhos, perdoem-me pelo que farei, mas achei que essa fosse a melhor saída. Vocês não merecem a mãe que têm... Uma alcoólatra que só lhes dá trabalho. Pretendo não voltar mais, pelo menos não enquanto estiver nessas condições, só quero que não me julguem pelo ato que cometi, eu os amo mais do que a mim mesma... Perdoem-me pelas palmadas. Ally, sei que você pode contar com o Peter... Para você Peter, eu deixo os meus agradecimentos e jamais esqueça: todas as coisas me são lícitas; mas nem todas me convêm”.

Passou-se um longo tempo, até que Peter conseguisse fazer com que a irmã se conformasse com a decisão da mãe... Mas a verdade é que nem mesmo ele tinha processado a ideia. Ela se foi para ele, não por completo, mas se foi. E grande parte dele não aceitava a partida de sua mãe. Nada o fazia acreditar que aquela mulher que ele banhou em água gelada tinha simplesmente saído de casa.

Peter segurou o rosto miúdo da irmã.

– Tudo bem Ally, ela vai voltar. Melhor enxugar essas lágrimas, eu vou cuidar de você, minha querida.

Ele enxugou o rosto molhado da irmã enquanto Cath enxugava o seu.

– Muito bem, agora temos que erguer a cabeça.

Ele levantou Allyssa do chão, abriu a janela e deixou a luz entrar. Era um dia horrível, um dia negro que não escaparia de sua mente. Tudo estava deserto, a não ser pelas cinzas que pareciam ter vida. No apartamento em frente ouviam-se gritos, gritos desesperados de uma pessoa que perdeu um alguém.

– Entre! ordenou Peter.

Kyle usava agora um manto preto, com um capuz preto cobrindo o rosto. Catherine ergueu-se do sofá, estupefata, e mais silêncio tomou conta do grupo que formavam. Allyssa deu um passo à frente e prosseguiu, deixando um eco escapar no ar a cada passada. A sala parecia pequena para o tamanho de sua curiosidade.

E então Kyle retirou o capuz, deixando a sua enorme tatuagem a mostra. Ally retrocedeu, seu espanto foi incalculável.

Peter não sabia como começar a história. Não sabia se tinha que começar pelo fim, pelo meio ou pelo início; a única coisa que lhe passou pela cabeça foi retirar a camisa e começar por ali. A tatuagem brilhava, causando impacto em dois pares de olhos incrédulos.

– Peter!

Foi a única coisa que ele ouviu, após minutos de espanto. Mais nada. Nem um sussurro. Nada. Existia o silêncio número um, o dois e o três. Apenas silêncio. Elas queriam ouvir a história, enquanto Kyle desejava regressar o mais rápido possível para o planeta Ignis.

๑๑๑

Allyssa aceitou a ideia de ter um irmão tatuado, com o destino traçado e de que ele era o único ser capaz de salvar a humanidade da possível destruição. Ela aceitou rápido demais. Quanto a Catherine, bom, havia um ar de desespero e um ar de dúvida, um “por quê?” cravado em seu rosto. O mais importante de tudo é que as duas decidiram não abandonar Peter, não importa para onde ele fosse. Depois de uma hora de assimilação, todos estavam prontos para sua nova jornada e Peter estava pronto para sua missão, com seu medo encoberto por uma carapaça.

Não levariam bagagens, uma vez que Kyle afirmou que as roupas humanas não eram adequadas e nem confortáveis para o ambiente em que viveriam.

Então partiram. Em meio ao fade in, em meio ao medo e à percepção de que nunca mais veriam sua mãe. E com uma frase que jamais escaparia da mente de Peter: “Todas as coisas me são lícitas; mas nem todas me convém.

* PRIMEIRO FATO QUE PETER DESCONHECIA *

Sua nova vida não seria nada fácil, as surpresas não o abandonariam, assim como o seu inimigo aparente.

O último AdãoWhere stories live. Discover now