Capítulo 10

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Ace não queria, mas desligou

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Ace não queria, mas desligou. Nicholas falou algo estranho do outro lado da linha, Nicholas e Ace parecem sérios demais, preocupados demais, tristes demais. Não que Ace seja a felicidade em pessoa, forjado ou esculpido para ver graça em qualquer coisa, mas sua voz está tão melancólica... Como se um novo lobo tivesse sido morto por suas mãos e ele acabou de perceber.

Guardei o celular em um dos bolsos do jeans e voltei ao trabalho que estava fazendo. Billie havia sumido no sótão, fingindo um grande interesse pelos poemas que Ace escrevera. Kai, vez ou outra, abria a porta e me olhava por alguns segundos, sempre parecendo pronto para questionar minhas mãos sujas de terra ou o modo como a porta dos fundos está tão escancarada. Entretanto ele apenas se afastava, fechava a porta e sumia por mais alguns minutos.

Demônio da Tasmânia. O que será que isso quer dizer? Eu não pude perguntar, não com Ace, meu quase-namorado imortal, falando comigo após tantos meses. Nicholas me alertou de todos os modos, mas não compreendi muito bem. Tenha cuidado, ele é uma fera não é uma frase que se use muito hoje em dia.

Olhei para fora, para além das portas pesadas e abertas. O dia está começando outra fez, se erguendo atrás da linha do horizonte. O céu está pálido até onde a vista alcança. Hora de ir.

Fechei as portas, tranquei-as e arrumei toda a minha bagunça. Pendurei novamente os vasos nas hastes suspensas à um metro e meio do chão, desliguei as luzes e observei as petunias acordarem devagarzinho.

— Billie? — andei até a sala, abrindo e fechando as portas no caminho. — Billie, onde você está? É hora de ir.

Kai estava parado no final do corredor, as mãos atrás da cabeça como um bandido detido, os joelhos meio flexionados.

— Kai? — chamei baixinho.

Ele virou o rosto, apenas o bastante para me ver esticada para um lado, curiosa para saber o que ele fazia ali.

— Tudo bem com você? — perguntei.

Ele balançou a cabeça afirmativamente.

— Billie e eu vamos voltar para casa agora — olhei em volta, talvez isso seja algo duro de se dizer, talvez ele não goste de ficar sozinho. — Tem todo o tipo de enlatados na dispensa, mas prometo trazer algo melhor amanhã. Combinado?

Kai tirou as mãos da cabeça e assumiu a postura de um soldado.

— Certo.

— Certo — repeti, também assumindo uma postura, a postura de irmã mais nova abandonada numa casa no meio do nada com um Demônio da Tasmânia. — Agora só preciso encontrar o idiota do Billie.

Abri uma outra porta. O quarto de Nicholas. Uma cama king size, coberta com vários lençóis azuis, cada azul muito parecido com o outro, mas não iguais, criando uma cascata nas bordas. Quadros com flores e casas de veraneio e a pintura puida de uma moça com belos olhos verdes e cabelos negros como a noite, bem diferentes dos quadros não compreensíveis no quarto de Ace. Sobre o criado mudo, um livro com capa de couro vermelho, com pequeninas folhas e flores e nuvens e árvores e que parecem patos canadenses cortados à laser. No chão, tapetes se sobrepõem, como se Nicholas estivesse tentando escolher o mais decorado antes de sair para Deus sabe onde.

Verão Taciturno (livro dois)Where stories live. Discover now