Capítulo 6: Sem saída.

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Era sexta feira, onze da noite e Sidney acabara de voltar do trabalho. Sim, teve de ficar até tarde em uma sexta feira. Embora fosse desgastante e um belo pé no saco, estava feliz por nada de estranho ter acontecido desde quinta feira. Nada de países surgindo do nada, nem pessoas se transformando em animais ou coisa parecida. Pela primeira vez ela estava feliz por sua rotina ter seguido como sempre.

Não é que ela apenas houvesse esquecido de tudo, mas ela simplesmente queria esquecer por um momento que algo de errado estava acontecendo com ela, ou que tudo que havia acontecido veio realmente de sua mente. Na noite anterior nem sequer conseguiu pregar os olhos, afinal, ficou com medo de dormir e sonhar com algo que não queria que se tornasse real, portanto, estava completamente desgastada e tudo o que queria era deitar em sua cama.

Estava no estacionamento de seu apartamento, um lugar escuro e soturno, com uma iluminação baixa e pouco convidativa. Quando era criança, sempre teve medo de lugares assim; ela sempre pedia a mão do pai como consolo, afim de protege-la do que a escuridão escondia. "Seja forte, Sidney. Você não terá minha mão a vida inteira. Não há nada o que temer na escuridão" seu pai sempre dizia, mal sabia ele que tudo o que a garota queria era a mão do pai naquele momento, naquele instante de fragilidade. Mas ela cresceu, e de fato não tem mais a mão do pai e de mais ninguém para segurar na dela, portanto, teria de enfrentar seus medos por ela mesma.

-- Droga. Minha cabeça vai explodir!—Disse ela, de dentes serrados.

A jovem caminhava a passos largos, com seu sapato fazendo eco por todo o lugar, ali era tudo o que podia ser ouvido, além das goteiras que caiam do teto, deixando poças de água no caminho. Enquanto andava, derrubou as chaves do apartamento de sua mão, sendo obrigada a agachar para pega-las no chão.

Por mais que tivesse parada, os barulhos de passos não haviam cessado; ela ainda podia escutar o som de alguém andando no lugar, até que também sumiram. Sidney olhou para trás num reflexo, mas tudo o que pode ver eram os carros estacionados no escuro. Se levantou, ajeitou o cachecol vermelho no pescoço e seguiu seu caminho até a porta de ferro que dava às escadas, só se lamentou por estar muito longe dela.

Enquanto andava percebeu que não eram apenas seus passos que ela conseguia escutar, isso fez sua caminhada ficar ainda mais ligeira. A paranoia parecia ter tomado conta de sua razão novamente, era como se ela jamais houvesse saído de sua cabeça nos últimos dias, por mais que ela quisesse. Mas será que a paranoia era responsável por trazer a tona até mesmo seus medos à vida?

Foi quando ouviu os passos atrás dela começarem a correr, pisando nas poças d'agua com força. Então não havia mais saída, teria de correr o mais rápido que podia até as escadas, de fato aquilo estava acontecendo de verdade, alguém estava a persegui-la!

Sem pensar duas vezes, Sidney lançou fora os sapatos e começou a subir os lances de escadas enquanto pegava impulso no corrimão . As luzes acionavam automaticamente a cada andar que ela subia, embora acendessem como uma luz lúgubre e tremeluzente, dando ainda mais desespero para a garota, que prosseguia a correr.

--Deus...DEUS!—Corria ela, quase tropeçando em cada degrau.

Quando finalmente conseguiu chegar em seu andar, entrou no apartamento apressada, sem deixar de olhar para trás antes de fechar a porta. Desejava com todas as forças que estivesse apenas sendo paranóica e que não havia ninguém à sua espreita. Mas ela de fato sentia que alguém estava a persegui-la.

Ficou ali, encarando a porta por alguns instantes, ofegante, esperando que alguém houvesse de bater nela como nos filmes, forçando a maçaneta e deixando entrar seja lá o que vira no estacionamento. Mas dessa vez, nada aconteceu.

Não havia outra alternativa: teria de tomar o remédio tarja preta receitado pelo psiquiatra, estava de fato tendo alucinações. Sem hesitar, correu para cozinha escura, ligou a luz e correu em direção a prateleira de remédios. Pegou logo dois comprimidos, tentou encher um copo de água, mas suas mãos trémulas a impediram. Portanto, os pôs na boca e foi logo pra torneira afim de acabar logo com aquilo.

Depois do momento de desespero, limpou os lábios molhados com o pulso e deu o último suspiro de alívio. Aquilo deveria bastar.

Mais que depressa, se aprontou para dormir, sem nem sequer tomar um banho para tentar aliviar todas as tensões que passara no dia. Tirou a roupa, ficando apenas de langerie e se pôs na cama, se cobrindo com o fino lençol.

--Desligar luzes...--Disse ela, com uma voz fraca e com os olhos já fechados.

Atendendo ao comando, se desligaram, deixando o recinto em total escuridão.

O silêncio do quarto era maior do que tudo. Ela podia, até mesmo, ouvir as batidas de seu próprio coração, enquanto lutava para pegar no sono e acabar com aquele dia de uma só vez. Os remédio que havia tomado deveriam ajudar.

--Boa noite...--Alguém sussurrou no pé do ouvido.

A garota saltou da cama em desespero, soltando um grito que deveria ter acordado todo o prédio naquela noite. Ela podia sentir os braços fortes lhe segurando pela cintura, enquanto tentava a todo custo se livrar deles. Teve sucesso por uns instantes, tentando correr na direção que acreditava estar a porta, contudo, foi surpreendida pelas mãos geladas e firmas que lhe arrastaram pelos calcanhares, para debaixo da cama.

Aquela noite estava muito longe de acabar. Estava prestes a iniciar seu segundo turno de sofrimento e bizarrice.

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Sidney abria os olhos aos poucos, mas não podia enxergar absolutamente nada. Estava jogada no chão, mas não o chão de madeira de seu apartamento, mas um chão de piso frio e empoeirado. Bem a sua frente, o único foco de luz era a fresta de uma porta, da qual Sidney se arrastou para alcançar.

Se levantou, ainda tremendo, sentindo a textura fria da maçaneta, que não se assemelhava com nenhuma das portas de sua casa.

Ao abri a porta, seus olhos foram invadidos pela luz branca e forte, o que a forçou tampar os olhos com o braço, usando o tato para se guiar. Quando a visão da garota se acostumou, pode ver que estava em um longo corredor de hospital, com macas por todos os lados, caídas e destruídas, com as luzes de emergências ligadas.

O curioso é que havia plantas crescendo por todo o lugar, vinham do teto e do solo, algumas até tampavam as entradas de algumas das portas. Era como se aquele lugar estivesse abandonado durante séculos.

--Mas que droga de lugar é este?—Se perguntava ela, enquanto olhava para todos os lado do corredor.

Então, um barulho de chiado surgiu de um alto-falante, tomando a atenção de Sidney, fazendo a garota encarar o aparelho preso no teto. Entre os sons de estática, uma voz passou a se sobressair aos poucos, até ficar nítida, de forma que a jovem pode escutar com clareza a voz masculina que surgiu, acompanhada por uma música lenta e medonha ao fundo:

" Sidney...Sidney...Parece que seus poderes desabrocharam, por fim."

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