Capítulo 03

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Aperto Estela contra mim outra vez, correndo os olhos pela sala, procurando, inutilmente, um rosto conhecido. Sei que não há ninguém aqui que eu conheça, porque as últimas duas pessoas que eu realmente poderia dizer que conhecia não estavam mais aqui.

E nunca mais estariam.

Mas rostos familiares, daqueles que às vezes visitavam os Argent ou que vieram para ver Estela quando ela nasceu, aparecem dentre rostos de desconhecidos, familiares distantes e velhos amigos daqueles cujo mundo tinham deixado. Estela fica calma contra mim, os olhos bem abertos, analisando a multidão assim como eu. Me pergunto se ela está assustada por estar cercada de pessoas ou se está simplesmente quieta porque imagina que uma hora seus pais virão atrás dela.

Esse pensamento me parte o coração outra vez e acabo por aumentar ainda mais o aperto contra ela.

— Com licença — pede uma mulher, chamando minha atenção. Ela é loira e tem os olhos vermelhos de tanto chorar que me olham educadamente mas que logo se fixam em Estela — Essa é... a filha da Cami, certo? Estela?

Me impeço de me empurrar para trás. Não estou pronta para soltar Estela, mas sei que outras pessoas querem vê-la. Querem senti-la. Querem ter certeza de que, embora Cami e Paul tinham ido embora para nunca mais voltar, eles deixaram uma coisa de extremo valor para o mundo.

— Sim, essa é Estela.

A mulher assente, mas não faz um gesto para pegar a bebê de mim. Ela simplesmente a olha, com admiração e tristeza, por uns segundos e então olha para mim.

— Você, então, deve ser a Lola, certo?

Me assusto com a pergunta. Analiso o rosto da mulher loira outra vez, me perguntando se alguma vez eu já a vira naquela residência e tinha esquecido, mas aquele rosto não me era familiar. Então como é que ela sabia meu nome?

— Cami me falou de você uma vez — a mulher explicou, como se estivesse vendo a confusão em meus olhos — Fico feliz que Estela ao menos tem você de agora em diante.

E ela parte ao dizer isso, indo para o outro lado da sala, para chorar ou acalmar outras pessoas, eu não sei. Só sei que meu coração bate rápido e que lágrimas estão tentando sair de mim. Mas não agora, não outra vez. Não posso chorar, pois sei que assim que o fizer, Estela repetirá meus atos. Mas quero chorar quando penso em Cami e Paul. Quero me desfazer em lágrimas quando penso em Estela, que agora é órfã. Quero chorar, principalmente, quando penso em quem será o responsável por Estela e se ela será devidamente amada e, por fim, se ele irá responder aos meus apelos e me deixará seguir como a babá de Estela.

Porque, e se ele não quiser que eu continue a cuidar dela? Ele sequer permitiria que eu a visitasse?

A resposta era clara e me apertava a garganta.

Claro que não permitiria. Eu não estava de forma alguma ligada à ela ou aos pais dela, pelos olhares dos outros. Eu era simplesmente a empregada desafortunada da família. Uma ninguém, com direito nenhum.

Luto contra as lágrimas mais uma vez, balançando Estela como se estivesse a pondo para dormir. Talvez seja isso que eu quisesse. Quisesse que nós duas dormirssemos e então acordássemos desse pesadelo. Mas Estela pega uma mecha do meu cabelo e me olha com seus olhos infantis e eu sei que não posso me permitir ser mais fraca do que já fui. Tenho Estela agora, nesse mesmo segundo, e isso é tudo o que importa.

Passo os minutos seguintes acenando para outros rostos familiares e trocando poucas palavras com pessoas que vieram até mim para ver Estela, que em momento algum se deixou ser levada para longe dos meus braços. Algumas pessoas me olham, confusas, irritadas ou mais tranquilas, e então seguem sua caminhada. Sarah e Drake, um casal amigo de Paul e Cami, me saúdam e conversam levemente comigo, dando um sorriso triste para Estela enquanto ela ri brincando com meu cabelo. Sarah pergunta se vou ficar aqui, na parte mais distante do velório, e eu digo que é o melhor, mesmo depois que ela se ofereceu para esperar com Estela. Quando eu disse que não queria ver os caixões, mas também não queria Estela lá, que até agora não quis ir para o colo de nenhuma outra pessoa a não ser o meu.

LolaWhere stories live. Discover now