Ele entreabriu os lábios em espanto e acabou por assentir fazendo uma careta.

- Sei o que isso é. – Sorriu para mim. – Mas vai tudo ficar bem! E agora acho sinceramente que deverias ir lá dar pelo menos um "olá", ou "hey pai, estou em casa". É importante que não percas contacto com o teu pai, mesmo que te sintas magoada.

-Vem comigo, assim eu apresento-te a ele.

Harry assentiu, suspirei e levantei-me espreguiçando-me enquanto caminhava até ao escritório do meu pai no fundo do corredor com o ser dos cabelos encaracolados atrás de mim. A porta encontrava-se fechada e por essa razão batuquei com os nós dos dedos na madeira escura. Não ouvi a sua resposta, e acabei por abrir a porta pois não existia problema algum em fazê-lo já que ele não abria a porta.

- Pai, est-

Naquele momento, eu perdi completamente o rumo do meu pequeno barco já um tanto ou quanto desmontado. Fiquei estática enquanto sentia o meu coração a cair por terra e o mesmo se desfazia em cinzas. O meu pai estava ali sentado na sua cadeira negra, os seus olhos abertos enquanto o sangue se lhe esgueirava pela boca. No centro da sua camisa branca uma mancha avermelhada crescia, e crescia por culpa do metal que se encontrava escondido no seu interior. A secretária estava suja do seu sangue que se misturava com o pó esbranquiçado que se encontrava espalhado pela madeira.
Um grito escapuliu pelos meus lábios enquanto via o terror a passar-me pelos olhos. Ele estava morto.

O meu pai estava morto mesmo na minha frente, o meu pai estava morto. Ele estava morto. Morto. Não iria acordar novamente. Não ia ouvi-lo novamente. Não ia abraça-lo novamente. Não ia beijá-lo novamente. Ele estava morto.

- Harry... - Sussurrei enquanto as lágrimas caiam pelo rosto a uma velocidade imensa, os meus soluços eram incontroláveis e a minha respiração estava totalmente descompensada. – Harry ele...

Guiei-me até junto do homem que me deu vida, e agarrei as suas mãos geladas e ensanguentadas. Agarrei-as e abanei-o na ingénua esperança de ele ressuscitar.

- Pai, não. Vá lá, não. – Sussurrei agarrando na sua face.

Os seus olhos estavam abertos, encaravam-me num olhar morto, vazio. A sua boca expelia sangue, e eu não me importei de ficar completamente suja ou encostar a sua cabeça ao meu peito enquanto soluçava e tentava pedir-lhe perdão silenciosamente, demonstrando o amor que sentia por ele num último afecto. Afecto que ele já não podia sentir. Afecto que nunca mais lhe poderei dar. As minhas mãos ensanguentadas foram até á minha testa, a minha cabeça negava várias vezes enquanto me afastava dele e encarava o pó branco da secretária. Eu só queria que aquilo fosse açúcar ou farinha. Tudo menos droga. Eu não queria ter essa imagem dele, eu recusava-me a acreditar.

- Oh, pai. – Sussurrei.

As minhas pernas perderam todas as forças e deixei-me cair no chão de madeira magoando os meus joelhos descobertos. Um grito agudo escapuliu pela minha boca e vários se sucederam enquanto distribuía murros no chão gelado. Harry agarrou nos meus braços impedindo-me de ferir mais os meus punhos. No entanto, eu não conseguia parar, a dor acertava-me como se eu fosse um saco de box. Ela batia-me mais e mais forte. E eu só conseguia espernear enquanto me debatia contra o toque de Harry. Eu queria destruir tudo á minha volta pelo simples facto de me encontrar completamente destruída. Eu estava um caco.

- Ele está morto. – Sussurrei. – Ele está morto, Harry. O meu pai está morto.

Eu parei de lutar, eu deixei que o meu corpo fosse levantado do chão e acolhido num abraço apertado. Eu deixei que ele me reconfortasse, mesmo que não existisse reconforto possível. O meu pai estava morto mesmo na frente dos meus olhos. O meu pai tinha a porra de uma faca espetada no estômago. O meu tinha droga na secretária. O meu pai matou-se. Ele cometeu o suicídio, ele desistiu de viver.

Racism | njhWhere stories live. Discover now