T w e n t y - T h r e e

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{ Sugestão musical; Ghosts dos Banners.}

T w e n t y – T h r e e

N I A L L

Despertei do meu sono profundo ao sentir Elaine a mexer-se por baixo de mim. Abri os meus olhos fechando-os logo a seguir ao sentir um clarão a ofuscar-me a visão. A janela havia ficado aberta e isso explicava a claridade que sobrevoava o quarto.

Olhei Laine e a mesma ronronava com uma das suas mãos enterradas no meu cabelo e a outra pousada no meu peito. Os seus olhos piscaram várias vezes até se acostumar á luz, e momentos depois encarou-me sorrindo levemente.

- Bom dia. – Sussurrou. – Estás melhor?

- Hum...Mais ou menos. – Remexi-me na cama virando-me de barriga para baixo enterrando assim a minha cabeça na curvatura do seu pescoço. Deslizei as minhas mãos até á sua cintura e ouvi o seu guinchinho quando nos virei ficando ela por cima de mim. Ela não disse nada mais e aconchegou-se a mim deixando-me sentir os pequenos caracóis soltos contra o meu rosto e pescoço.

Eu poderia, de maneira extremamente cliché e hiperbólica, dizer que a dor no meu peito simplesmente tinha desaparecido pela presença da rapariga de cachos saltitantes. No entanto, estaria a mentir. Com toda a certeza, eu poderia afirmar que ela era quase como uma pequena anestesia que me fazia esquecer da dor durante pequenos momentos, talvez seja pelo seu sorriso contagiante ou apenas pelo enorme carinho que nutria por ela. Todavia, e mesmo que a dor fosse amenizada por breves momentos, existia um martelo, que estava lá como um lembrete de dor, martelando a toda a hora na minha cabeça recordando-me que uma das pessoas mais importantes para mim, estava morta.

Eu lembro-me do dia da sua morte. Lembro-me de olhar para o céu acinzentado e perguntar-me para onde iria ela, agora que estava adormecida eternamente. Lembro-me de ter ficado á varanda até ao anoitecer e ao olhar as estrelas escolhi a mais brilhante ficando a observá-la até a mesma desaparecer, sendo levada pelos raios de sol que nasciam no horizonte. Lembro-me de ter bebido dez cafés numa noite, pois tinha medo de dormir e não acordar, como lhe havia acontecido. Lembro-me da túlipa branca que deixei sobre o caixão no dia do enterro, e lembro-me perfeitamente do terço acastanhado que estava enrolado nas suas mãos pálidas no dia em que abriram o caixão antes do último adeus. Lembro-me de olhar os seus olhos fechados e desejar fortemente ver uma última vez a cor esverdeada que se escondia atrás das pálpebras cozidas. Recordo-me de olhar os seus lábios roxos e desejar ver um último sorriso. Ouvir uma última vez a sua voz doce. Recordo-me de cair de joelhos no chão na terra batida do cemitério e gritar em plenos pulmões enquanto toda a minha frustração e tristeza transbordava pelos meus olhos. Lembro-me de me culpar por não lhe ter dito uma última vez, o quanto ela era importante para mim. Estava tudo presente na minha mente, como se tivesse sido ontem, quando na verdade já havia passado quatro anos.

- Niall, pelo amor de deus não chores. – Elaine sussurrou num fio de voz limpando a lágrima que me caia pelo canto do olho. – Eu tenho de ir andando para casa, a minha mãe deve se estar a perguntar porque é que a porta do quarto está trancada, ou porque raio ainda não estou a tomar o pequeno-almoço. Deve estar preocupada. – Ela murmurou olhando o relógio na mesinha de cabeceira que marcavam sete e meia da manhã.

Assenti mordendo o lábio e logo a vi a levantar abandonando a cama deixando-me um pouco mais frio. Observei-a enquanto ela calçava as sapatilhas e quando se colocou em frente do espelho da cómoda desmontando o rabo-de-cavalo feito anteriormente e fazendo um novo logo a seguir. As suas mãos agarraram um dos meus perfumes, e ao cheirar levemente o frasco, ela borrifou um pouco da fragância no seu pulso esfregando-o no outro.

Racism | njhOnde as histórias ganham vida. Descobre agora