Tudo é um milagre

52 5 4
                                    

Existem dois tipos de pessoas: aquelas que não acreditam em milagres e aquelas que acreditam que todas as coisas são um milagre.

(Albert Einstein)

A chuva de verão não demorou muito a passar e quando foi possível, nós partimos.

Voar daquele jeito se misturou ao turbilhão de emoções em mim.

Eu o vi.

Foi um choque.

Doloroso.

Não é fácil ver um amigo depois de tanto tempo adormecido como só acontece nos contos de fadas, agora pálido e preso por tubos a uma cama.

Não chorei por que todo o choro que poderia se desenrolar ali estava preso na minha garganta.

Me deixaram ficar com ele um pouco ali naquele quarto muito limpo e quieto com alguns bips pontilhando o silêncio.

Brielle me deu um beijo e desejou sorte. Mesmo depois que ela saiu fiquei um bom tempo com a sensação dos lábios dela nos meus e do cheiro da sua pele.

Anotei mentalmente para pensar depois detalhadamente sobre o que eu estava sentindo por aquela garota.

Olhei para ele. Os cabelos ruivos ainda estavam ali, mais penteados do que eu me lembrava que ele gostaria de usar.

A respiração lenta, quase extinta.

Senti a vontade bizarra de levantar uma de suas pálpebras e enxergar uma vez mais seus olhos. Como se de repente ele fosse erguer o corpo e rir de toda aquela piada de mal gosto que durara tanto tempo.

Toquei sua mão. Fria. Como de um cadáver.

Balancei a cabeça para espantar o pensamento e pensei em Brielle lá fora, sentada na sala de espera, os cabelos presos em um rabo de cavalo, conversando com algum desconhecido com quem ela simpatizara.

Sentei ao lado da cama e tentei conversar.

- Ei... hum - pigarreei - Cara, você tá aí?!

Silêncio.

- Graham.

Tentei de novo.

- Graham, - e dessa vez me senti bem em falar seu nome em voz alta - eu estou aqui. O Cory... Faz tempo não faz? Pois é, eu sinto muito por isso. Eu fui um tolo que se afastou...

Suspiro.

- Doeu, cara. Como nada havia doído antes. Eu não conseguia suportar, eu achei que a melhor idéia era fugir e me manter a salvo da dor e me fechar... Que egoísmo!

O som forte da minha respiração.

- Eu conheci uma garota. Lembra quando nós saíamos atrás de garotas? - ri com as lembranças - Você era realmente terrível, não era?... Céus como eu queria viver coisas assim novamente. Aquela garota lá fora meio que me viu como um pássaro que não sabia que era triste viver em uma gaiola e me puxou pra fora. Ela me ensinou a voar junto dela e não me deixou voltar para a gaiola, ela me fez procurar um ninho...

Alguns bipes. Som da minha respiração.

- Acho que você significa isso, sabe? Você é o meu ninho. Voei até você e, cara, eu realmente queria que você dissesse algo agora e interrompesse esse momento meloso...

Bipes. Silêncio. Minba respiração forte.

As lágrimas se desprenderam e deslizaram pelo meu rosto.

Parei um instante e apoiei minha cabeça na cama, ao lado de Graham e acabei cochilando por alguns minutos e ao acordar encontrei um papel dobrado ao lado do meu rosto, apanhei ele.

- Cara, eu não sei mais o que dizer. Você disse que voltaria quando eu estivesse perdido e chamasse por você. Eu enganei a mim mesmo me fazendo achar que não estava perdido, essa garota por quem eu estou apaixonado me fez ver que eu estava imensamente perdido e me ajudou mas a outra metade diz respeito a você. Metade de mim ainda está esperando que você me encontre...

Algumas vezes a vida segue um marasmo irritante. Uma lentidão tediosa que nos faz questionar o por quê de as coisas não acontecerem.

Mas, às vezes, o universo faz tudo acontecer de uma vez. E foi essa sensação que eu tive quando abri a mão onde havia o quadrado de papel amassado.

Meu nome escrito com a letra bonita de Brielle.

O barulho de um helicóptero voando para longe.

O som de uma respiração um pouco mais forte que não era a minha.

A Tempestade Da Cor Dos Teus OlhosWhere stories live. Discover now