Capítulo 3

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Acabo de comprar um jogo novo para o meu smartphone.
Daqui a poucos minutos o meu melhor amigo, Igor, vem me buscar
para uma viagem curta à fazenda de seus pais numa cidadezinha a cento e vinte quilômetros daqui.
É o aniversário de casamento deles,
e não os conheço pessoalmente. A única coisa que sei é que não fazem o tipo "pessoas comuns". Sua mãe é escritora.
Não é estranho conhecer uma escritora? Quero dizer, escritores são pessoas que vivem por aí à paisana. Ficam famosos e ricos, mas não saem na Contigo, por exemplo.
E seu pai tem um negócio de touros reprodutores.
O fato é que Igor tem muita sorte de ter sido incentivado a ser arquiteto. Acredito que se ele quisesse ser vendedor de picolé, os pais iriam achar o máximo também. Não consigo imaginar minha mãe dizendo: "É isso aí, filha! Vai ser escritora!", por exemplo.
Quando eu quis ser cantora, ela disse que eu não iria sair por aí em um ônibus velho e cheio de hippies. Tentei explicar que eu seria
cantora pop e ela disse: "Hippies não são pop?".

- Ei, senhor fazendeiro! - digo, batendo no vidro do carro de Igor.

- Olá! - ele sai e vai até o outro lado abrir a porta para mim. Isso é uma coisa engraçada que ele sempre fez.

- Que tem nessa mochila? - ele diz. quando a segura para colocar na mala.

- Kit Selva! - respondo.

- Que é isso?

- Repelente em loção, repelente em spray, mosquiteiro, um aparelhinho que emite ondas sonoras e espanta pernilongos, meias e mais meias - digo, enquanto clico no meu novo joguinho do smartphone.

- Sinto dizer, mas não vamos acampar - ele ri.

- Gracinha...

- E essa coisa aí? - ele se refere ao meu smartphone.

-Ah, isso é um smartphone! - levanto o aparelho e o aproximo de seu rosto.

- Eu sei! Quero saber o que você está fazendo com ele.

- Um jogo novo! Pra me distrair na estrada - sorrio.

- Hum...- Igor detesta quando fico vidrada nos meus joguinhos. _Ele
acha que se eu não estiver olhando, é porque não estou escutando.
Mas eu sou mulher e consigo fazer mil coisas ao mesmo tempo.

- Cento e vinte quilômetros dão quantas horas? -pergunto.

- Uma hora e meia, por aí --responde.

- Então nós chegaremos dentro de umas três horas. Ele levanta as sobrancelhas.

- Lá vem você...

- Você está dirigindo como uma velhinha!

- Você sabia que um choque nessa velocidade projeta uma pessoa de sessenta quilos, como você, numa força de cerca de quatro toneladas?
- ele diz.

- Eu não tenho sessenta quilos! - digo, revoltada. - Tenho cinquenta e nove!

- Rá, rá... -Igor é cheio de explicações físico-químicas. Ele sabe de tudo um pouco e isso, às vezes, me deixa irritada.
Especialmente porque ele quase sempre utiliza argumentos que me deixam em desvantagem.

- Será que seus pais vão gostar de mim? - pergunto.

- Depende...

- De quê? - questiono, curiosa.

- Você é muito boba... - ele ri.
- É claro que eles vão adorar você. Quem não gosta de Sarah Albuquerque?

- Tá bom! - digo e empurro seu ombro.

Durmo um pouco durante a viagem e, quando acordo, já estamos chegando.

- Já se passaram quantas horas? - pergunto meio atordoada.

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