O Doce Cheiro do Desespero

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A semana se seguiu com intensos treinamentos, uma tentativa falha de tentar restaurar algumas estruturas e muitos tipos de interpretações para a profecia de Rachel. Sempre gostei de evitar pensar em coisas como aquilo, mas ignorar tantos alertas seria burrice da minha parte. Gabriela me ajudou na maior parte do tempo a aprender novas formas de batalha, já que graças a aquela maldita faca, minha perna ainda estava seriamente debilitada. A princípio era difícil, velha e rápida locomoção não existiam mais e a dor que subia era pior do que ser pisoteada por um bando de centauros furiosos. Deuses, aquilo era o pior pesadelo que eu podia ter em toda minha vida!

Comecei a andar pelos destroços do acampamento, com Athos ao lado para o caso de eu precisar do bom e velho apoio que meu cão infernal me concedia. Claudio começou a passar mais tempo que o normal ao meu lado, estudando técnicas de combate com sua foice ou simplesmente me contando mais sobre ele. Suas habilidades se equiparavam as minhas, porém eu era muito instintiva quando o assunto era lutar. James tinha sumido, com um grupo de batedores que foram designados a encontrar Christopher e Isabela a cada dia que passava parecia ficar ainda mais apreensiva. Por algum motivo ela quis que eu a ensinasse técnicas de arremesso de facas.

Olhei para o céu e um leve tremor percorreu meu corpo. Era fim da tarde. Amanhã estaríamos montando um cerco em Alcatraz, o lugar onde Christopher pretendia trazer Nyx para o nosso plano. Andei mais alguns metros até a construção decadente do chalé 3. Fer estava arrumando algumas coisas em uma mochila, mas parou o que fazia quando me avistou.

– Ei... - ele exibiu um fraco sorriso.

Um pequeno sorriso surgiu no canto da minha boca, mas não falei nada. Apenas sentei no chão de pedras enquanto Fer terminava de fazer seja lá o que ele estivesse fazendo. Toda aquela apreensão acabaria me enlouquecendo qualquer hora, a sensação de impotência me dominava completamente. Tantas coisas aconteceram em um tempo tão curto...

– É amanhã Fer... - passei a destra pelos cabelos, soltando um suspiro.

– Shh... Eu sei. Não precisamos falar sobre isso.

– Mas ainda assim. O que vai acontecer com a gente depois de tudo isso?

– Eu não sei. - entrelaçou seus dedos nos meus. - Mas prometo que vamos ficar bem, você vai ver.

Era uma mentira, dava pra ver nos olhos dele. Pequenas mentiras para reconfortar as pessoas, sabia bem como era aquilo. Mas nesse momento era a última coisa que eu precisava, palavras bonitas e carinho não ajudariam. Me coloquei de pé, fitando os olhos do garoto que eu amava. Promessas silenciosas deviam estar estampadas em meu rosto quando lhe entreguei meu anel. Era simples, um pequeno aro de prata com uma pedra negra encrustada.

E aquela era a primeira vez em anos que o retirei.

Fernando pareceu confuso quando me voltei para a colina meio-sangue a bandeira com Athos em meu encalço. Fixei o olhar no grande cão, ordenando para que o mesmo não me seguisse em hipótese alguma. Seria uma tentativa arriscada e provavelmente letal, mas eu precisava tentar. Uma única chance, era tudo o que eu precisava para que aquilo pudesse dar certo. Não liguei para aquele sentimento angustiado que atrapalhava minha respiração quando subi na moto, assim como os insistentes chamados de Thays e Isabela pareciam se afastar cada vez mais quando ganhei a estrada.

Apenas acelerei pelas ruas desertas com aquele plano suicida em mente...


*****


Malditos policiais e suas manias de bloquearem portas com fitas amarelas e tábuas de madeira. Se elas não existissem me pouparia todo aquele trabalho de subir até o telhado da construção. Meus dedos doíam apesar das luvas de couro e minha perna latejava pelo esforço. Sem equipamentos tudo aquilo foi mais difícil que o esperado, mas ainda assim consegui soltar um suspiro aliviado ao atingir meu objetivo.

Diário de Uma Filha de HadesWhere stories live. Discover now