Capítulo 04

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GISELLY

Mais uma inclemente noite em claro. Eu me encontrava assolada, sendo escoltada apenas pela minha profunda dor que jamais se medicava.

Permaneci mais umas horas na cama, incapaz de exercer qualquer atividade. Assombrada pelo medo de vedar os olhos e vê-lo em meus sonhos, me relembrando o quanto nós éramos felizes e o quanto tínhamos a oferecer. Mas era ali que o meu pesadelo começava: quando eu abria os olhos.

Ouvi batidas na porta. Respirei fundo enchendo os pulmões com todo ar que eu pude. Limpei a garganta, pronta para enganar minha mãe.

— Oi. — ela adentrou o quarto com um semblante que exalava cansaço, sinal de que também passou a noite em claro, preocupada com minha reabilitação. — Dormiu bem?

— Oi... sim — menti.

— Que bom. — ela suspirou aparentemente aliviada. — Eu fiz umas panquecas de banana que eu sei que você adora.

O cheiro que se estendia pela casa indicava que estavam deliciosos, embora a ânsia tomasse conta do meu estomago. Há dias o meu apetite não se manifestava, e por esse mesmo motivo perdi vários quilos drasticamente.

— Desculpa, mas eu não estou com fome mãe. — minha voz saiu rouca e alheia, denunciando resquícios de choro.

Um suspiro prolongado escapou de seus lábios carnudos.

— Tem alguma coisa em que eu possa te ajudar? — ofereceu melancólica.

— Não... — eu a encarei, com o coração martelando contra o peito e a dor que me possuía. Um soluço subiu a minha garganta e antes que as lágrimas pudessem ter o poder de me ameaçar, eu prossegui. — Eu só não sei como fazer isso. — desabafei, engolindo seco. Minha mãe se posicionou ao meu lado na cama, envolvendo-me em seu abraço. — Como você fez?

Aquele era um assunto delicado para minha mãe. Ela contava muito pouco sobre sua família e como ela os perdeu. Talvez a dor fosse tão profunda que mencionar a respeito fosse uma tortura. Então até o presente momento eu nunca insisti.

Minha mãe aparentou navegar em suas nostalgias enquanto limpava a garganta totalmente despreparada para se aprofundar no assunto.

— Eu confesso que até hoje não é fácil falar deles. — começou com o olhar distante. — A menção deles traz um carrossel de nostalgias e memórias vivas que... eu... enfim, eu superei acreditando que a despedida é um adeus temporário, que eles iriam querer que eu ficasse bem. E de alguma forma eu busquei força para prosseguir por eles... — ela despejou envolvida pelo momento.

Esperei que ela continuasse, mas tudo que fez foi cerrar os olhos e fechar a página. Não quis insistir então me contentei com aquele avanço.

Por mais que não demonstrasse, a perda de Austin também a afligiu. Ela o tinha como filho então o ocorrido a lavou a memórias passadas, reabrindo feridas das quais ela pensou ter se livrado para sempre.

— Giselly! — buscou minha atenção ao se ajeitar na cama. — Eu sei que estamos em um momento delicados de nossas vidas, mas temos a oportunidade de recomeçar de novo... em outro lugar... em Washington. — clamou perseverante.

A derrota apossava-se lentamente do meu espírito. Escolher entre o bom e o ruim era inválido para mim. Aquele pavor que eu houvera sentido com a ideia fútil se dissipou como cinzas ao vento. Eu havia perdido tudo, então nada mais importava.

Mesmo que a intenção de minha mãe fosse suja, eu me contentei com a ideia de que ela teria tudo àquilo que sempre sonhou: luxo, acima de qualquer coisa.

— Faz o que achar melhor. — falei seca, desprovida de qualquer animo.

As sobrancelhas de minha mãe se uniram, mas nenhuma palavra escapou dos seus lábios.

As sobrancelhas de minha mãe se uniram, mas nenhuma palavra escapou dos seus lábios

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