Prólogo

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Portland – 08 de Abril.


— Você sempre adorou contemplar as estrelas. — eu disse suavemente, aproximando-me dele e o abraçando pelas costas.

Era a última noite que nós estávamos juntos. Ele se preparava para uma longa viagem até a cidade de Washington.

Sendo mais especifica: para muito longe de mim.

Austin havia conseguido uma boa vaga de estágio na cidade. Era quase irrecusável, já que ele se preparou a vida toda para atuar como advogado. Como nossa pequena e humilde cidade não investia muito na nossa carreira, não tínhamos escolha a não ser migrar para outra cidade tentar conquistar nossos objetivos profissionais.

— Foi diante de um céu assim, que eu te conheci. A menina mais perfeita de Portland – ele me contou convencido.

Austin portava no semblante um olhar nostálgico.

— Éramos tão pequenos.

Minha mente vagou ao exato momento em que o vi pela primeira vez. Na mesma hora eu me encantei pelo rapaz de cabelo engraçado e uma certa estima por estrelas e constelações.

Talvez no princípio, minha afeição precoce fosse carência, já que eu não tinha uma família — não daquelas que todos têm, composta por um pai, mãe, irmãos e uma variedade finita de parentes. Sempre fui só eu e minha mãe. E quando encontrei o Austin no píer daquela praça de baixo de uma noite estrelada, eu senti que eu poderia compartilhar do amor que eu tinha com outro alguém.

— Não precisamos agir como se fosse uma despedida. Eu vou te ver logo, eu prometo. – ele sussurrou envolvendo meu rosto em suas mãos grandes e macias.

Naquele momento meu coração se roia por inteiro, mesmo que por fora eu parecesse intacta. Por mais que eu o conhecesse e soubesse que o amor era recíproco, não havia a possibilidade de eu confiar naquela promessa. Uma hora as ligações subtrairiam de tempo, pois os assuntos seriam vagos e talvez um dia a saudade não nos consumisse mais, tornando o contato sem graça e sem emoção. Toda aquela hipótese murchava minha barreira contra a aflição.

— Você confia em mim? — ele buscou minha atenção, como se pudesse ouvir meus pensamentos pessimistas.

Fui obrigada a encarar seus olhos verdes. Eu sorri com os músculos se contorcendo para chorar.

— Claro — meneei a cabeça incerta.

Segurei em sua nuca e o beijei. O misto de sentimentos tornava aquele beijo novo, o qual nunca havíamos experimentado; o sabor da despedida.

Seu celular se pôs a vibrar no bolso de sua calça jeans, cortando o nosso achego.

— É o meu pai – disse ele, antes de atender.

Enquanto Austin conversava com o pai eu aproveitei para espiar minha mãe pela janela de vidro embaçada. Ela estava deitada no sofá, com uma compressa improvisada de pano de prato na testa. Me doía ver que ela estava sofrendo e eu nada podia fazer para ajudá-la.

— Você já tem de ir? — eu perguntei, assim que o vi finalizando a chamada.

— Sim, meu amor. — bufou indignado — A previsão é de mais chuva amanhã, então quanto mais cedo eu pegar a estrada melhor.

Era uma ideia muito viável, visto que foram relatados ao menos três acidentes de veículos nas rodovias só na última semana. Resultado da chuva incessante que estava trazendo resultados caóticos as ruas e estradas.

Mas... antes quero te dar uma coisa.

— O que? – perguntei.

Ele sorriu, fazendo um típico suspense. O vi apalpando seus bolsos da calça, procurando algo. Um anel de material plástico laranja saiu envolvido em seus dedos. Era o mesmo que dei para ele quando era criança.

Rimos juntos da recordação. Eu mal me lembrava da existência daquele objeto tão barato e ao mesmo tempo de grande valor.

— Eu sei que, na verdade, foi você quem me deu esse presente. Quando você me pediu em namoro — nós rimos do fato. Sim, o pedido foi meu. – Mas, eu queria deixar isso com você. Esse anelzinho de plástico é o melhor presente que já ganhei. Tem um valor muito grande para mim... E eu quero deixar com você, com a promessa de que voltarei para buscar.

Ele colocou o anel na palma da minha mão. Sorri mais uma vez e me joguei no calor dos seus braços para senti-lo uma última vez.

— Eu vou guardar — prometi, sussurrando em seu ouvido.

Austin me deu um beijo melancólico na testa. Despedimo-nos, juramos amor um ao outro e, então, ele foi embora.

Foi embora para sempre.

Foi embora para sempre

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Pedaços De Nós (Entre Desejos & Segredos)Where stories live. Discover now