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 2 de Março

               Depois de cinco dias atribulados, encontrava-me mais forte, mais capaz de enfrentar os duros dias que tinha pela frente. Já não me sentia tão cansada e agora, todas as manhãs, um sorriso estava presente nos meus lábios. Desde que conversara com Luke acerca das emoções que me perturbavam e daquela tarde, onde acabei a chorar num corredor, sentia que a nossa relação estava mais forte. Podíamos confiar um no outro e agíamos com mais naturalidade, apesar de haver sempre uma distância entre nós. Luke continuava a ser um rapaz reservado, porém, ele abrira-se de uma forma encantadora, contando-me alguns detalhes da sua vida pessoal. Durante este pequeno período de tempo descobrira que a sua mãe é professora de matemática, daí a paixão do loiro por números, que já pareciam fazer parte da sua vida; também ficara a saber que Luke adora crianças. Um dia, depois da escola, quando íamos a caminho de sua casa, uma senhora passou por nós, a conduzir um carrinho de bebé. Vi a admiração nos olhos de Luke e, surpreendentemente, ele aproximou-se da pequena criança, debruçando-se sobre esta e mostrando vários sorrisos, tentando adocicá-la com mimos. Foi a primeira vez que vi o rapaz afefóbico tão feliz próximo de alguém.

               – As crianças são o ser mais puro que existe. – afirmara ele, num tom nostálgico. Fiquei intrigada com o que dissera e devo admitir que não esqueci aqueles vocábulos.

               Mas no entanto, apesar de estes cinco dias terem passado a correr, a minha vida pareceu estagnar. Nada de novo acontecia, para além das tardes passadas em casa de Luke. Michael e Lillian continuavam felizes, no seu ninho do amor, e, às vezes, saíamos para conversar. Gostava de desabafar com Michael acerca das minhas conversas com Luke; gostava de compreender todos os significados das suas palavras e tinha a ajuda do meu melhor amigo para entender essa intrigante língua que os rapazes falam. Apesar de os dois não serem propriamente amigos, sinto que existe uma conexão entre eles. A maneira como Michael se preocupa com Luke e a forma como Luke quer saber detalhes acerca de Michael, revela que os dois são mais parecidos do que aparentam ser. Ambos intrigantes, belos, únicos e talentosos.

               Respirei fundo ao lembrar-me de tudo isto. Os acontecimentos surgiram na minha mente como imagens de um filme e pude vê-los, mesmo à frente dos meus olhos. Sorri com o pensamento, alegre com o facto de estar finalmente a fazer progressos na vida de alguém. Quando tive esta repentina ideia de ajudar Luke, nunca pensei que pudesse dar tantos frutos. No fim de contas, ganhei mais um amigo. E o mesmo se podia dizer do rapaz de olhos azuis, que agora me tinha a mim, como sua principal confidente. Tínhamo-nos um ao outro e isso era o mais importante.

               – Ouviste as novidades? – Michael apareceu inesperadamente a meu lado, e eu assustei-me com o tom da sua voz. Respirei fundo e fitei-o, procurando dentro da minha mala a chave do cacifo. Ele encostou-se à parede, ficando à espera que eu lhe desse atenção.

               – Que novidades? – indaguei, mais concentrada na tarefa que tinha entre mãos. Quando achei o pequeno pedaço de metal, destranquei o cadeado e abri a porta do cacifo, preparando-me para depositar lá os meus livros.

               – Tu e o Luke. – o meu melhor amigo afirmou convictamente, cruzando os braços sobre o peito. Fitei-o de sobrancelhas cerradas, receosa do que poderia eventualmente andar a correr pelo liceu. Respirei fundo. – Têm-vos visto juntos ultimamente... a ir para casa dele.

               Pressionei as têmporas com as pontas dos dedos, tentando manter-me calma face ao que Michael estava prestes a dizer. Todavia, impedi-o de continuar a falar, abanando negativamente a cabeça. Ele suspirou, retirando do meu cacifo um papel dobrado em que eu não tinha reparado.

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