Capítulo vinte e três

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- Você sempre espera o pior das pessoas. É injusto supor esses absurdos! Provavelmente ele está a caminho.

- Zahara, eu liguei para ele, e ele me disse o que acabei de dizer a você – Conrado suspira, impaciente. – Você mentiu para ele, e agora ele ferrou com você. E ferrou comigo também. Então muito obrigado por destruir todo o trabalho que eu tive em um semestre.

Eu fecho os olhos com força. Preciso me controlar, porque meus punhos já estavam querendo acertar seu nariz.

- Você é inacreditável – eu digo, e não consigo segurar a risada amargurada e triste que escapa por minha garganta. Algumas lágrimas se formam em meus olhos. – Isso não é culpa minha, Conrado.

- Eu disse para você ficar longe dele, não falei? Por que você nunca escuta o que eu digo?

Eu balanço a cabeça, em negativa.

- Quer que eu te escute para que você continue a dizer, em todas as oportunidades que tiver, que não gosta de mim e que minha presença te incomoda? Não, obrigada – eu falo, me afastando dele. Mas Conrado não permite que eu me afaste, porque está segurando meu braço com força.

- Não vamos mais falar sobre isso.

- Não, não vamos mais falar sobre isso e nem sobre nada. Eu nunca mais pretendo dizer qualquer coisa a você – falo, com tanta raiva que as lágrimas em meus olhos nem se atrevem a cair. – Adeus, Conrado.

- Aonde você pensa que vai? – ele pergunta, ainda me segurando. Há um pouco de desespero em sua voz.

- Eu vou embora – respondo. – Vou pegar minhas coisas e dar o fora dessa droga de cidade.

- A apresentação ainda vai acontecer – ele me diz.

- Dionísio não vai vir, esqueceu? Ou você está apenas aproveitando para jogar mais uma vez na minha cara que eu destruí seu trabalho?

- Eu vou ser Romeu, Zahara – Conrado explica e então começa a se afastar. – Encontro você no palco em trinta minutos.

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Inspirar e expirar nunca pareceu tão difícil em toda a minha vida. Parece que, de repente, eu esqueci como é que se respira. É provável que eu já tenha tomado quase dois litros de água, em uma tentativa frustrante de me acalmar, e é mais provável ainda que eu já tenha ido ao banheiro três vezes em vinte minutos. Eu estou, oficialmente, indubitavelmente, certeiramente, nervosa. O motivo disso? É o mesmo motivo de todos os meus problemas nos últimos meses: Conrado.

Conrado e eu entraremos no palco em cinco minutos para interpretar cenas românticas. Isso teria me deixado feliz, há um mês, mas agora está me deixando louca. Motivo número 1: nós dois brigamos. A última coisa que eu quero é ficar perto dele. Motivo número 2: não consigo nem imaginar como é que faremos para que nossa raiva não transborde e afogue os personagens, exibindo Zahara e Conrado ao invés de Romeu e Julieta. Motivo número 3: TEM UMA CENA DE BEIJO!

Eu preciso ser forte, e é por essa razão que me permito entrar em pânico total por dez segundos (com direito a náusea e tudo o mais), e então eu respirei o mais profundamente que podia e prendi a respiração pelo tempo que consegui. Quando expirei todo o ar, me obriguei a ficar focada, concentrada e calma. Nada disso iria me abalar. Vou fazer meu trabalho, da melhor forma que puder, e depois irei embora.

Mesmo com toda minha calma, quando Conrado entrou no palco, vestido de príncipe, todo o meu controle desapareceu. Eu estava à mercê de meus inconstantes sentimentos e isso provavelmente não era algo bom. Toda vez que ele se aproximava de mim, em cada cena da releitura tão bem feita que ele e seu pai haviam escrito, minhas mãos começavam a tremer. Vê-lo sorrir e fazer juras de amor para mim fez minha raiva se abrandar, mesmo que tudo fosse de mentira; mesmo que, assim que acabasse a peça, cada um iria para um lado e então não conversaríamos mais – apenas indiretamente através de nosso advogado.

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