O poder das chamas

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Após o discurso da diretora, Flan e eu corremos para a fila do primeiro ano. Devíamos permanecer com o capuz no salão, só podíamos tirá-lo quando íamos para os corredores de velas e dizíamos os nossos nomes. Eram três meninas de cada vez, uma de cada ano.

Quando as primeiras da fila iniciaram a festa, ficava difícil de ver o que acontecia, até que, após dez segundos, velas foram acesas, duas no corredor do terceiro ano e uma em cada um dos outros dois anos e, aos poucos, o cômodo foi se iluminando, o que me deixava ainda mais nervosa.

- Droga, devíamos ter chegado mais cedo, somos as últimas da fila Flan!

- Ei, não faça essa voz, não fui só eu que nos atrasei, se você não ficasse sonhando acordada já estaríamos aqui há um bom tempo. Tente se acalmar, somos quase as últimas da fila, ainda vai demorar para ser a nossa vez.

Tentei me concentrar em outras coisas que não fosse o nervosismo e o fato de não conseguir produzir uma única chama há mais de dois meses, fato que escondi de minha mãe, ela não precisava de uma filha se transformando em humana, se no próximo ano não conseguisse soltar nenhuma faísca os professores iriam começar a desconfiar, uma subespécie sem magia dragoniana é considerada uma áurea fraca, como se sua metade dragão tivesse abandonando o corpo, poder é tudo para os clãs, inclusive na hora de selecionar bolsas para escolas tão exclusivas como a Lestyn.

Chacoalhei a cabeça observando as rosas vermelhas cuidadosamente dispostas em vasos de cristal, eram tão lindas e vistosas, ficariam assim por muitos dias, enquanto as velas mágicas estivessem acesas, o que geralmente duraria um mês, mas tão logo a mágica acabasse, a beleza delas murcharia, acho um pouco deprimente, sempre preferi rosas selvagens, dispostas em seu ambiente natural, com espinhos para protegê-las e a chuva para irriga-las.

Por um instante consegui sentir o cheiro do orvalho e tudo pareceu mais silencioso, as vozes e as luzes sumiram, como se o salão se esvaziasse, restando apenas eu e as rosas, senti uma paz que necessitava há muito tempo, podia ouvir a brisa leve entrando pelas frestas, levantando o cheiro das flores, novamente a eletricidade tomava conta de meu corpo, uma ânsia por escapar, ser livre como as rosas selvagens.

Senti um empurrão e todo aquele cenário se desfez, o salão estava novamente cheio, agora eu estava parada no meio do corredor de velas ouvindo a diretora me chamar.

- É a última vez que peço mocinha, retire o capuz e identifique-se.

Tirei o capuz gaguejando, ainda sentia a eletricidade circular pelas minhas pernas e braços.

- Desculpe senhora, me chamo Aimil Lace.

- Muito bem Aimil, assim como Kassadi do terceiro ano e Grada do segundo, posicione-se em seu lugar.

Olhei para o corredor do segundo ano, suspirei de alívio ao ver uma meio gigante, era realmente alta, mas geralmente a escala secundária só conseguia acender uma vela, provavelmente seria uma chama bem forte. Gigantes tem uma áurea direcionada, assim como sua força física, se eu não conseguisse acender a vela não me sentiria tão constrangida, mas a sensação de alívio passou ao olhar para o corredor do terceiro ano, lá estava a meio elfa mais esnobe da face da terra, Kassadi, era uma interesseira e despedaçou o coração de uma das pessoas que eu mais amava.

Kassadi deu um de seus sorrisos falsos de propaganda, ajeitou os cabelos loiros perfeitamente lisos e fechou os olhos, parecia concentrada, logo vi que uma vela acendeu em seu corredor. Ai minha nossa, as velas! Preciso tentar me concentrar, mas não consigo, olho para Grada e vejo que está concentrada em uma vela, sua chama está começando a se formar, nunca me senti tão humana e impotente em toda minha vida, parece que me falta ar nos pulmões, me sinto extremamente quente, necessito estar livre, de ar fresco. Quando noto uma corrente acariciar meus cabelos, a brisa passa pelo meu corpo e apaga a vela que Grada acabara de acender, a gigante resmunga chateada.

Imediatamente a diretora se levanta.

- Ora, mas o que é isto? Vento aqui dentro, não disse para fecharem todas as janelas! – Encarou as inspetoras. – Vamos, corram e fechem tudo para as próximas meninas. – Podem sair da fila garotas. – Olhou para nós. – E parabéns Kassadi, sua áurea é muito energética.

Olhei para o corredor do terceiro ano e a ninfa conseguira acender três velas em dez segundos e ainda teve a cara de pau de piscar para mim, para mim! Isso era demais para aguentar, me dirigi para o fundo da sala, Flan já estava lá.

- Você viu Aimi, consegui acender uma vela, achei que não conseguiria, mas no último segundo ela acendeu, estava tão nervosa...

- Vi, foi realmente genial. – Na verdade nem percebi que Flan passara na minha frente, mas ela estava tão radiante que eu não quis dizer que cai em outro transe, sem contar que ela ia pirar e querer me internar.

Flan percebeu minha expressão confusa.

- Não fique assim Aimi, no ano que vem você acende uma vela, até porque, com esse vento que entrou e você sendo uma meio humana, seria impossível acendê-la.

Sorri. Na verdade não podia achar uma melhor hora para uma corrente de ar, colocaram a culpa no vento e não em minha áurea, isso me dava mais tempo para descobrir o que estava acontecendo comigo.

Depois da fase de acender as chamas fomos procurar nossos nomes nas velas, rodei por meu corredor olhando todas as velas acesas, nenhuma tinha meu nome, triste peguei a primeira vela apagada que encontrei e lá estava: Aimil Lace.

Um desejo a menos, oras, quem liga pra essa tradição estúpida, se velas atendessem desejos todos tinham centenas delas em casa, não devia me preocupar com isso agora, acabara de me livrar de uma enrascada.

- Aimil. – Ouvi meu nome ser chamado no corredor do segundo ano, era Grada. – Você se chama Aimil não é mesmo?

- Sim, sou eu.

- Seu nome está escrito aqui. – Indicou uma das velas. – Devem ter colocado no corredor errado, venha queimar seu pedido.

- Ai? – Fiquei extasiada e ao mesmo tempo em choque.

- É. – Grada repetiu. – Aqui. Daqui a dois meses estará no segundo ano mesmo e duvido que queira perder a oportunidade de ter um desejo realizado.

Não pensei duas vezes corri para o corredor em busca de meu desejo.

Quando vamos escrever os desejos nos cartões as professoras pedem que façamos cinco pedidos diferentes, eles são fechados e selados na nossa frente, mas apenas três vão para o salão, está ai a graça de ver qual pedido se realizou. Quebrei o lacre, ansiosa e sorri ao ver o que tinha escrito:

"Que as chamas levem a minha dor e me tragam coragem."

Queimei o papel com muito cuidado, torcendo para que isso não fosse apenas uma tradição estúpida.


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A Era dos Dragões I: A Origem da Magia #degustaçãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora