Capítulo 15

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    Após o bonde cruzar os Arcos da Lapa, ele iniciou a subida da ladeira em pedra do bairro de Santa Teresa. Casarões e mansões antigas, com muros altos de pedra, mostravam janelas, grades e portões trabalhados e pouco conservados. O bairro já não dispunha do mesmo brilho de muitos anos antes, ao menos em sua arquitetura. Todavia, sempre fora o local de residência de muitos intelectuais, artistas, acadêmicos, entre outros, que vivem ali para desfrutarem da história, cultura e qualidade de vida que o local proporciona.

    Por onde subiam, se olhassem para trás, poderiam ver, lá longe, o arranha-céu do Banco do Brasil, apontando para cima, com um dos lados marcado pelo símbolo da empresa.

    Hugo estava curioso sobre o ocorrido entre Daniel e os outros garotos. Sentado no banco detrás, ele curvou-se até o amigo a sua frente.

    — Ei, Dan. O que aconteceu entre você e o Roni?

    — Depois que você foi para a catedral eu despistei eles.

    — Não, cara. Estou falando do que aconteceu entre vocês no passado.

    — Nada.

    — Como nada. Aquele imbecil vive intimidando todos na escola. Eu mesmo, não aguento mais as aporrinhações dele. Todo mundo é vítima do Roni. Todo mundo. Exceto você – no banco da frente Daniel apenas olhou sobre os ombros. — É sério. Você sabe do que estou falando. Quantas vezes eu vi o Roni judiar de você. Roubar seu lanche. Bater em você. Humilhar você. Mas há dois anos eu não vejo mais ele fazer nada contigo. Desde aquela explosão no banheiro do colégio... Cara, quando estou perto de você é como se eu tivesse uma blindagem anti Roni – ele fez uma pausa. — Por acaso você descobriu um perfume repelente de Roni?

    Daniel sorriu constrangido.

    — Não há nada, Hugo. Isso é coisa da sua cabeça. Talvez ele tenha se esquecido de mim durante esse tempo.

    — É, mas agora tá lembrando bem – disse Hugo recostando-se em seu banco e deixando o amigo em paz.

    Por mais que Hugo fosse seu melhor amigo, haviam coisas que Daniel não queria lhe contar. Era pessoal demais. Não se sentia bem toda vez que lembrava do ocorrido no banheiro da escola. Talvez Roni estivesse certo e ele fosse uma aberração. Às vezes, era assim que Daniel se sentia. Aqueles fatos não lhe deixavam a mente.

                                                            ***

    Tudo aconteceu numa manhã comum. Dois anos antes. Quando fazia exatos sete anos da morte de Angelina, a mãe de Daniel.

    E como todas as manhãs comuns, Daniel levantou-se e foi para a escola na companhia de Elisa. Ao chegarem, Hugo já os esperava.

    Na sala de aula, a professora ensinava e os alunos permaneciam sentados em suas carteiras. Alguns participavam e discutiam a matéria, enquanto outros estavam pensando em algo não muito longe dali, como Hugo. As coisas ocorriam normalmente, até que Daniel convidou o amigo para ir, com ele e seu pai, no domingo seguinte, até uma pista de kart, onde se divertiriam. O amigo agradeceu, mas não podia aceitar o convite, seria o domingo do dia das mães, e ele já tinha compromisso com sua família. Daniel então, convidou Elisa. A amiga, de forma gentil, recusou o convite, dizendo-lhe que já havia programado um cinema com sua mãe. E tentou justificar a recusa, explicando que a mãe lhe dava todo o carinho que precisava, mas ela nem sempre retribuía a contento. Assim, pretendia tirar aquele dia para curtir a mãe, passeando em qualquer lugar em que ela quisesse.

    Naquela época, Daniel estava em plena adolescência. Um momento em que não se é nem criança e nem adulto. É apenas uma incógnita. Todo adulto que já passou por isso e todo adolescente que está nessa fase ou, felizmente, já a superou, sabe que a pessoa fica instável, podendo reagir das mais variadas formas. Com Daniel não foi diferente. Ele quis ter a chance de passar aquele dia com sua mãe também. Teve vontade de abraçá-la. Beijá-la. De poder dizer que a amava tanto, e que era muito difícil viver sem ela. Não tardou para uma força esmagadora tomar seu peito e fazer seu coração querer sair pela boca. Foi como se algo tentasse furar seu peito para chegar até suas entranhas.

O Explorador de Mundos - A Esfera de CristalOnde as histórias ganham vida. Descobre agora