Capítulo 12

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Capítulo 12 — Luara

Minha coxa tá pegando fogo de tanto que eu dancei hoje e, mesmo vindo de tenis, meus pezinhos estão pedindo arrego. Foi muita dancinha e álcool pra dentro.

Dez minutos que saímos pra dar uma volta, TH achou a gente e continuamos nos divertindo tanto. O JP é a pessoa mais animada do mundo quando o assunto é baile e eu me sinto tão bem perto da Luiza, mesmo que a gente não seja tão próximas assim.

TH: Vou deixar vocês em casa, po — trocou a chave de mão e desbloqueou o celular.

João: Não precisa, macho — se apoia no muro de chapisco de uma casa, logo depois da saída do baile — Aqui do lado, deixo a luarinha e depois vou na minha casa.

Luiza: Para de teimar, porra — bateu no braço dele e eu rio.

Luara: Vamo todo mundo junto então — me coloco no meio deles e viro pro TH — Mas tu não tá de moto?

TH: Picolé tá trazendo o carro aí pra mim, só marcar um dez — diz, passando o braço no pescoço da Luiza.

Luiza: Dá tempo de comprar um espetinho? — ela dá um beijinho no queixo dele.

Porra, eles são muito fofinhos... Não acho que eu vou ter uma relação com alguém assim um dia. Não só porque o Universo me sacaneia muito, mas porque vai ser difícil alguém aturar meu gênio.

As únicas duas pessoas que me aguentaram foi minha mãe, porque me pariu, e João Pedro, mas ele sobrevive no deboche. Ou seja, vai ser difícil um homem me querer.

TH: Vou lá comprar pra tu — coloca o cabelo dela trás da orelha. MUITO FOFOS.

Luiza: Eu não sei o que quero, vou lá olhar, fica aqui — ela pega o dinheiro na parte de trás da capinha e vira pra mim e pro João — Alguém quer?

João: Vou lá contigo, será que tem salsichão? — pergunta, andando com ela, na direção do churrasquinho.

TH apoia um pé e as costas na parede ao meu lado e presta atenção em cada passo da Luiza nos quinze metros até a barraca.

TH: Queria te perguntar um bagulho — olho pra ele sem entender — Com todo respeito, mas eu não tô entendendo porra nenhuma.

Luara: Tá falando do que? — cruzo os braços e franzo a testa.

TH: Tu tá ficando com o Digão? — me olhar de lado, dividindo a atenção entre eu e a Luiza.

Luara: Tá maluco? — coloco as mãos na cintura — Da onde tu tirou isso?

TH: Sei lá, porra, pra mim tu era a mina do colégio, maneira, mas com todo respeito, ninguém te conhece aqui — fala comigo totalmente sério — E do nada tu tá me pedindo pra entrar na sala do chefe do complexo, ele indo na tua casa, sabendo quem tu é, fechando acordo contigo... Tu nem sai de casa direito, porra.

Luara: Eu não saio, mas teve um dia que eu precisei sair — os flashes daquele dia tomam a minha cabeça automaticamente — e depois desse dia, tudo mudou, de uma maneira muito estranha — passo a mão no rosto.

TH: Não te julgo, se tu tiver ficado com ele, Luara. O cara é pinta, fortalece quem merece, sabe trocar uma ideia e tá pousado na sua.

Luara: Como assim?

TH: Eu não sei, caralho. Só sei que ele sabe muito bem quem é você e tu tá sendo avistada, Digão tá prestando atenção nos seus passos e até Ney perguntou quem era tu pra mim — aponta o indicador pro meu rosto — To tendo esse papo contigo porque tu é minha parceira e, no papo dez, eu não to entendendo porra nenhuma.

Luara: O que tu sabe? — pergunto, pra saber até onde eu posso ir com essa conversa.

TH: Tô ligado que tu tá ajudando ele no corre, mas tudo no sigilo, fora vocês dois, só eu e Picolé sabe da missão que ele te deu — olha pra Luiza, de longe — Nem Claudinho sabe dessa porra.

Luara: Eu conheci ele— bufo e passo a mão na sobrancelha — no dia que ele foi baleado, eu passei na hora...

TH: Tu desrespeitou o toque de recolher? — me olha de novo.

Luara: Eu precisava ir trabalhar — TH nega com a cabeça, me recriminando — Enfim... As coisas se desenrolaram e eu acabei dando de cara com ele naquele dia, ajudei ele com o ferimento...

TH: Eu ouvi um papo de que tinha uma mina com ele, mas tá geral pensando que era a dona da casa.

Luara: Era eu — respiro fundo — Eu tava numa situação financeira complicada, tu melhor do que ninguém sabe o que é isso... Eu tava ralando muito atrás de um emprego, porque perdi o que eu tinha arrumado na pista e, naquele dia, quando eu te vi fazendo ronda, eu pensei que talvez ele fosse a pessoa que pudesse me ajudar. Foi só isso, não fiquei com ele não.

TH: Luara... Porra, crime não é brincadeira.

Luara: Eu tô ligada, TH, mas assim como pra você, esse foi meu último recurso, não quero viver nisso pra sempre não e ele tá tentando arrumar alguma coisa fixa pra mim... É temporário só, porque eu tava bem ruim de grana mesmo — ele olha pra mim, respira fundo, concorda e volta a prestar atenção na Luiza.

(...)

É impossível não fazer careta com o gosto de guarda-chuva molhado que tá na minha boca quando acordo de manhã. Eu nem bebi tanto, mas como eu já disse, queimei a largada aos 15 e, agora, com 18 tô uma jovem senhora desacostumada com furdunço.

Foi uma carreira de putaria curta, porém intensa. Fiz tudo o que devia e não devia dos quinzes aos dezesseis, mas quando eu tava no auge, minha mãe ficou doente e eu passei um ano me dedicando exclusivamente à ela. E agradeço todos os dias por isso, porque agora fica uma saudade, mas zero culpa.

Eu fiz tudo o que eu pude. Estive com ela realizando os últimos sonhos e nos momentos de dor. Em casa vendo um filmezinho e no hospital, sendo a maior fortaleza quando ela precisou passar por tratamentos intensos.

Ouço, pela primeira vez no dia, meu celular apitar em cima do sofá e tomo mais um gole do meu café, antes de ir lá ver quem tá querendo falar comigo.

Mensagem de +55219(...): Tá viva ou a ressaca tá forte? — leio, abro o ícone do perfil e vejo uma foto de uma vista aqui da favela.

Mensagem de Luara: quem é?

Mensagem de +55219(...): sou eu, preta
Mensagem de +55219(...): fica perguntando identidade de vagabundo ñ

Na hora que eu leio o apelido, solto o celular em cima da mesinha de centro, porque já sei exatamente quem tá falando comigo, só que depois da minha conversa de ontem com o TH, tô mais pilhada que o normal.

"Só sei que ele sabe muito bem quem é você e tu tá sendo avistada, Digão tá prestando atenção nos seus passos"

Mensagem de Luara: oxi, vc que me mandou a mensagem, tem que dizer quem é

Mensagem de +55219(...): sou o único que te chama de preta

Mensagem de Luara: várias pessoas me chamam assim.

Mensagem de +55219(...): quem? — posso imaginar a cara de arrogante dele me fazendo essa pergunta. O maxilar marcado, a sobrancelha erguida e o ar de riso. Tá tudo na minha cabeça certinho do jeito que ele é.

Mensagem de Luara: Fala logo o que tu quer.

Mensagem de +55219(...): sobrou dinheiro aí do teu pagamento?

Mensagem de Luara: Uhum

Mensagem de +55219(...): vai lá na boca perto do campinho e compra um prensado de 10
Mensagem de +55219(...): presta atenção em como tá as coisas lá e me passa a visão depois

Ligações de Alma [M]Where stories live. Discover now