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"Tinham o amor nos olhos, todo o amor; entre eles, o grande drama humano desenvolvia-se como se ninguém na terra nunca houvesse amado."

Simone de Beauvoir

            Amorzinho

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Amorzinho. Amorzinho. Amorzinho. A palavra continuava a revirar minha cabeça.

Por que Igor me afetava tanto? Por que pensar nele só atraía mais pensamentos da mesma ordem?

A retrospectiva de momentos com o senhor Asimov rendeu-me uma série de arrepios e sorrisos fáceis. Surgiu uma miríade de ocasiões nas quais o tal do "amorzinho" apresentara-se.

Carícias pós-foda, o contraste entre a aridez do sexo e a suavidade de sua mão percorrendo meu corpo — muitas vezes sem intenção de cavar reprise dos atos libidinosos —, vinham à mente em junções sucessivas de memórias preciosas.

A percepção das dimensões de sua vaidade ao observar sua vergonha de apanhar os óculos (ele não conseguia utilizar as lentes por muito tempo, em especial quando se empenhava em atividades intensas) para ler meus livros em voz alta com o único propósito de me constranger.

As nuances de seu humor ao criar um timbre diferente para as falas de cada personagem enquanto se empenhava nas atuações mais insossas possíveis — potenciais candidatas à rejeição por parte do Framboesa de Ouro — à custa de sua variabilidade de expressões quase nula.

Diversas tentativas de produzir refeições decentes para me agradar, as quais se tornavam deglutíveis somente através do empenho em cozinhar com a melhor das intenções. O tempero, nesse caso, sempre era a fome (e a vontade de não rejeitar algo feito com um nível de consideração que não cessava de me impressionar).

Aquela pose de estátua de deus grego, após muito perambular nu pelo apartamento, enquanto dedicava-se a qualquer tarefa com a atitude de quem sabe quão impecável é a própria aparência. Uma simples escovação de dentes, com aqueles contornos de músculos firmes contrastados pela luz e sua postura de milhões dando-lhe um ar de realeza, já arrancava suspiros.

Igor era tudo isso e mais um pouco. Era perfeito inclusive nos inúmeros defeitos.

No seu jeito egoísta de ser, priorizando-se em detrimento de praticamente tudo, havia a exceção de ouro. A sua preocupação com minha satisfação punha-me em primeiro lugar (ao menos em determinados momentos).

Na cabeça dura, de quem não admitia os erros tão facilmente, havia certa graça. Depois de muito teimar, retratava-se com sinceridade. Em silêncio, promovia as próprias mudanças. Até começara a olhar duas vezes antes de atravessar um cruzamento! Pude testemunhar esse milagre quando nos encontramos numa situação semelhante à nossa primeira má experiência.

Na pouca vergonha, nos convites cada vez mais tentadores para entrar em seu covil, na constante oferta daquele bem delineado, antes tão asqueroso, agora tão desejável...

Não havia para onde correr.

O sr. Asimov tornara-se o dono da minha cabeça, sócio dos meus pensamentos, proprietário do meu prazer.

E eu? Eu arranjara uma sarna para me coçar. Um parasita com nome, sobrenome e endereço. Um bicho que andava quieto demais para o meu gosto.

Nos últimos dias, nenhuma movimentação suspeita rondava seu lar

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Nos últimos dias, nenhuma movimentação suspeita rondava seu lar. Nem uma mulher sequer perambulava pelos corredores para contar história.

Em compensação, uma máquina de sexo com o dobro da potência de antes me atropelava em todas as ocasiões nas quais nos encontrávamos. Apresentava-se mais compenetrado, enérgico (coisa que eu julgava impossível), dedicado, como se eu fosse a última mulher do mundo e não mais um de seus contatinhos.

Eu havia virado um "amorzinho" sem concorrência, ao que tudo indicava. Não pude deixar de saborear o gosto de vitória. Embora julgasse se tratar de algo transitório, consequência do meu deslize de demonstrar a extensão da insatisfação de me sentir uma qualquer, apreciava-o.

Apreciava mais ainda os benefícios da dedicação exclusiva. A inclusão de encontros mais diversificados muito me agradou. Jantares, eventos culturais, caminhadas no parque, passeios de moto e sessões de filmes (minhas favoritas).

Nesta noite, ele me convidara para ir ao cinema, assistir à reexibição de "O sol é para todos" — um dos inúmeros favoritos que tínhamos em comum — em alta definição.

Durante o filme, como quem não quer nada, ele passou a mão por cima do meu ombro em um meio abraço. Eu, em resposta, inclinei-me e apoiei a cabeça nele. Ele apertou-me em um gesto de acolhimento.

Naquela hora, fraquejei e, em vez de prestar atenção no filme, perdi-me num simples vislumbre da mandíbula do sr. Asimov à meia luz da tela de cinema. Diante daquela tentação, não resisti à vontade de beijá-la.

A pele macia, lisa, sempre de barba feita — para mostrar seus traços perfeitos —, convidativa, recebeu meu beijo e o encheu de contentamento. Pude sentir o canto de sua boca contraindo-se num daqueles sorrisos discretos que por tanto tempo odiei.

Acompanhando-o, também sorri. Pelo aconchego, pelo encontro, pela noite como um todo, sorri.

Entre tantos encontros, desencontros e reencontros, estávamos ali, mais uma vez agindo como um casal de longa data em um date programado.

Havia chegado ao fim de linha. Àquela altura do campeonato, compreendia o motivo pelo qual o bendito "amorzinho" me atormentara tanto. Agora as respostas para todas as minhas perguntas pareciam óbvias.

Por qual razão eu não queria ser só mais uma em sua lista?

Porque eu estava irrevogavelmente apaixonada pelo senhor Igor Asimov.

Porque eu estava irrevogavelmente apaixonada pelo senhor Igor Asimov

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Certas coisas é bom admitir pra si mesma, não é? 👀

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Beijos mil! ✨

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