Capítulo 3 APRENDIZADO

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Tianjin - China
Ano 1520

As grades a impedem de avançar sobre o guarda que tenta se aproximar. O susto e o solavanco que dá pra trás demonstra claramente seu medo.
A notícia da sua captura e da sua vinda para esta casa logo se espalhou entre os empregados e guardas. Todos se perguntavam por quê o general Huang traria alguém ou algo travestida de criança para seu lar... A agressividade e selvageria dela fez jus aos relatos que contavam sobre como ela, sozinha, derrotou e matou dezenas de soldados e guerreiros... chineses e hunos.

Não havia dúvidas de que aquela menina não era normal. Muitos a chamavam de demônio, outros de animal e fera. E seu comportamento claramente contribuía para isso.

Assim que chegou na casa do general, amordaçada e amarrada nos pés e mãos, providenciaram uma jaula de ferro, usada geralmente para conter tigres, e a colocaram em um dos quartos no segundo andar da casa.

O general Huang teve que ir para o Palácio Imperial em Pequim, e mandou que a trouxessem e cuidassem da criança, alimentando-a. Mas esta tem sido uma tarefa difícil para os empregados. Já fazem dois dias que a menina se nega a comer... A madame Xiang procurou diversificar os tipos de alimentos na tentativa de ganha-la pelo sabor, mas não obteve nenhum sucesso. Um dos empregados chegou a sugerir que dessem a ela algum animal vivo, como coelho ou galinha, e foi prontamente repreendido por Xiang. Porém, os recursos e ideias da madame Xiang para cuidar da menina conforme seu patrão a ordenou, estavam se esgotando... os empregados se negavam a se quer se aproximar da jaula, com medo dos ataques ferozes da criança. Tal tarefa agora estava a cargo dos guardas que tentavam cumpri-la a contragosto.

Nessa última tentativa de entregar uma tigela de arroz, ela tentou agarrar um dos guardas entre as grades pra roubar as chaves que estavam penduradas em seu cinto. A madame Yui Xiang então chega e vê o guarda tentando afugenta-la com uma lança. Junto com ela, o general Fei Huang também aparece, recém chegado da viagem de volta de Pequim. Ao percebe-lo, o soldado se recompõe e se inclina num gesto de reverência.

O general Huang o dispensa e pede para que Yui Xiang providencie outra refeição para a criança. Imediatamente ela passa a ordem para os empregados e alguns minutos depois, um deles trás uma bandeja com outra tigela de arroz, um jarro de cerâmica com água e um copo.

Fei Huang pega a tigela e o copo com água e abre a porta da jaula. A madame Xiang tenta convencê-lo a não entrar temendo por sua segurança, mas ele a pede para se retirar e deixa-lo sozinho com ela.

Ao entrar, Fei Huang se senta sobre as pernas e coloca a tigela e o copo no chão. Ele os empurra por alguns centímetros na direção da menina, que está no outro lado da cela, encolhida no chão, abraçando as pernas próximo ao peito. Ela o encara com o rosto fechado e depois desvia o olhar para o vazio do quarto além das grades.  Seus cabelos estão soltos e espalhados sobre o rosto.  Suas roupas ainda são as mesmas que estava usando quando foi capturada, pois se recusa a usar qualquer outra.
Fei Huang repara que o corte da fratura no nariz  desapareceu.

Após alguns minutos de silêncio, o general Huang resolve falar.

— Imagino o quanto deve estar assustada com tudo isso... — ela rapidamente vira o rosto pra olhar o general com o semblante sério e sobrancelhas baixas, querendo demonstrar que está enganado. — ... mas garanto a você que não há motivos para sentir medo. Está segura aqui. Você não é uma prisioneira... e também não é uma convidada. Isto tudo lhe pertence. Está em casa.

Ela volta a olha-lo, ainda com a expressão fechada mas demonstrando estar confusa.

— Conheço você... sei o quanto odeia estar confinada em algum lugar... presa a um objetivo. 
Liberdade... É isso que você deseja, não é? Poder correr, ir aonde quiser... cavalgar em um cavalo a plena velocidade, sentindo o vento em seu rosto, soprando com força seus cabelos... gosta de nadar e admirar a vida, na plena variedade existente ao nosso redor... conhecer o mundo que sua mente e seus olhos ainda não tiveram a chance de contemplar.

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