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Noura Pierce

Perdoe-me. Perdoe-me. Perdoe-me

Uma hora após meu testemunho um líquido morno foi jogado em mim enquanto descia as escadarias do tribunal. O choque prende meu fôlego.

Largo minha pasta de arquivos no chão e limpo meu rosto, removendo a substância espessa. Minhas mãos estão cobertas de vermelho.

— Você libertou um assassino! — uma mulher grita. Ela joga um balde de metal em mim, já vazio. Seus traços envelhecidos são acentuados pela raiva. — Aquele demônio matou minha irmã. Ele a queimou viva! O sangue dela está em suas mãos, sua cretina!

Sangue. Isso mesmo, tem sangue em minhas mãos. No meu rosto. Na minha boca. E por todo o meu corpo.

Sangue de porco para ser mais específica. De acordo com um amigo patologista que teve a gentileza de testar uma amostra na delegacia, a irmã de Margo Reker me encharcou com sangue de porco.

Acho que ela pensa que sou tão porca quanto o animal. Isso, ou ela tem uma fazenda de porcos... ou acesso fácil a um açougue.

Duas horas no chuveiro e depois uma imersão na banheira, e um pouco mais de chuveiro, ainda sinto como se houvesse uma camada transparente de membranas de porco cobrindo minha pele. Principalmente meu couro cabeludo. Não adianta tentar salvar meu terno; ele está destruído, bem como minha dignidade.

Escolho um novo terno e vou para meu consultório. Meus saltos batem contra a superfície polida da madeira. As paredes do meu consultório são de um cinza calmante. A arte decorativa pende estrategicamente ao nível dos olhos para evitar que meus clientes altamente remunerados fiquem olhando para os criminosos algemados na sala de espera.

— Deus, você está bem? — Lacy pergunta em forma de saudação. Obviamente, a fofoca já se espalhou. — Estava no noticiário, — ela responde à minha pergunta silenciosa. — Sinto muito. Por que você não tirou o dia de folga?

Forço um sorriso para dizer que está tudo bem. Admito que um banho de sangue matinal é uma forma extrema de começar o dia, até mesmo para mim – mas eu já lidei com coisas piores. Já fui cuspida, estrangulada, praticamente defecada...então pelo menos desta vez não precisei de uma injeção de penicilina.

— Eu estou bem, obrigada. Nada que eu não possa controlar.

— Certo, Marks trouxe mais dois presidiários.

— O que? Mas eu disse que não pegaria mais nenhum...

— Eles estão aguardando ao lado da sua sala.

Mais um ano. Lembrei a mim mesma. Preciso aguentar mais um ano. Meu compromisso com o Centro Correcional será cumprido dentro desse prazo.

Embora meu trabalho com assassinos condenados seja o que lançou minha carreira na psicologia e psiquiatria - a fascinação mórbida do público em geral por assassinos em série foi um trampolim gigante - estou me afastando dessa área. Tenho a Marks e a outros como ele uma dívida de gratidão, pois minha pesquisa e métodos agora são ensinados em quase todas as academias de justiça criminal por todo o país, mas oficialmente acabei. Após sete anos de intenso estudo da mente dos criminosos insanos, cheguei a apenas uma conclusão: infratores em série não podem ser reabilitados.

The Huntsman | H.SWhere stories live. Discover now