Capítulo 10

134 5 8
                                    

Não avaliamos a vida pelos anos vividos mas sim pelas pessoas que tocamos a nossa volta.
Em Chamas

Estamos todos reunidos em frente à plataforma de trem do Distrito 12: eu, Peeta, Willow e Rye, minha mãe, Gale e Cressida. É o começo de uma tarde quente e abafada e o calor do sol começa a fazer a pele do meu rosto e ombros arder.

Vejo o trem se aproximando e reduzindo a velocidade até parar completamente a nossa frente. Logo, Effie e Haymitch surgem através de um dos vagões, exalando uma alegria contagiante. Eles mal se aproximam de mim e eu os envolvo em um abraço apertado.

— Bem-vindos de volta! Espero que tenham feito uma viagem maravilhosa.
— Foi perfeita! O Distrito 4 é incrivelmente belo. E a companhia do meu amor só deixou tudo ainda mais incrível — Effie diz, acariciando o resto de Haymitch.
— Eu adorei cada segundo — ele responde, dando-lhe um selinho.

Seguimos todos juntos até a casa de Gale, onde Hazelle está preparando um almoço de boas-vindas. No caminho, muitas pessoas nos reconhecem e acenam para nós, afinal, fomos os rostos da revolução, e você não esquece o rosto da pessoa que representou sua última esperança, a frase vem novamente aos meus pensamentos. E, de certa forma, fomos a última esperança deles. Mesmo inconscientemente, despertamos Panem confrontando as regras dos Jogos Vorazes com as amoras-cadeado, eu paralisei uma nação inteira atirando a flecha eletrocutada e destruindo a arena, inspiramos os rebeldes a se unirem e lutarem contra Snow e seu regime, lutamos avidamente na guerra e no fim, ainda me lembrei de quem era o verdadeiro inimigo. Obrigada, Haymitch.

Mas além de nós, que obviamente ficamos marcados nas lembranças das pessoas por nosso famoso esquadrão 451, quem merece de verdade o reconhecimento são todos os rebeldes que lutaram bravamente na guerra. E tudo isso movido por uma única palavra, mas com um poder imbatível: Esperança. Seja a lembrança dos rebeldes fazendo o sinal do meu distrito, assobiando as quatros notas do Tordo, ou até mesmo cantando árvore-forca, marchando em direção à Capital, tudo isso me emociona.

Então olho para o memorial da revolução, situado onde antes fora o Edifício da Justiça e lembro-me de quando o nome de Prim foi chamado na colheita e eu me ofereci como Tributo, quando a população do Distrito 12 participou da forma mais ousada de protesto que conseguiam – ou que eu achei que era a mais ousada – o silêncio. Mas que logo depois fui surpreendida por eles levando os três dedos médios de suas mãos esquerdas aos lábios e mantendo lá em tributo à mim. E depois, no ano seguinte, o gesto sendo repetido. Mas daquela vez havia muito mais por trás, com o espírito de revolta já se espalhando entre a multidão. Nem em meus sonhos – ou pesadelos – eu poderia imaginar o turbilhão de coisas que me aconteceram. Mas de qualquer forma, eu estou aqui hoje, viva e mais feliz do que nunca.

— Ei, Catnip. Você lembra que eu tinha dito que precisava da sua ajuda? Antes do acontecimento na padaria?
— Oh, é mesmo! Pode falar — Gale me causa um sobressalto e tira-me de meus pensamentos.

Ele me faz reduzir os passos até que os outros estejam a uma distância considerável de nós. O que será que ele precisa me contar que é tão sigiloso?

— Cressida está grávida.

Abro a boca para expressar a minha alegria e surpresa, mas ele me interrompe.

— Mas ainda é um segredo. E eu estava pensando... talvez devemos nos casar. O que você acha?
— Você a ama?
— Muito. Você sabe que eu nutria sentimentos por você e foi muito difícil superar a sua decisão de ter ficado com Peeta. Só ela foi capaz de me fazer seguir em frente, Cressida me faz incrivelmente feliz.
— Isso é maravilhoso, Gale. Fico muito feliz por você.
— Já faz algum tempo que eu pensava em pedi-la em casamento, e essa gravidez só me fez ter a certeza de que eu quero viver o resto da minha vida com ela.
— Então se é assim, definitivamente você deve pedi-la em casamento. Vocês serão muito felizes, eu tenho certeza.
— Obrigado, Catnip. Acho que irei fazer o pedido hoje mesmo. Não quero prolongar essa decisão por nem mais um dia.
— É isso aí. Se precisar de algo, estou aqui.

O almoço na casa de Gale revela-se muito agradável, divertido e prazeroso. São esses momentos, esses pequenos e simples momentos compartilhados em família e amigos, que me fazem ser grata todos os dias pela minha vida. São eles que me fazem seguir em frente, apesar de todas as marcas escuras do meu passado.

O tempo passa rápido e logo já é fim de tarde e Rye cai no sono. Levo ele até o quarto de Hazelle. Minha mãe vem atrás de mim.

— Katniss, você tem um minuto? Preciso conversar com você.
— Claro, mãe — digo, enquanto coloco Rye delicamente na cama. Sento-me ao lado de minha mãe em uma das poltronas no quarto.
— Eu... conheci uma pessoa. E acho que estou perdidamente apaixonada — vejo o rubor aparecer em suas bochechas. Sorrio diante de sua reação.
— Isso é ótimo, mãe!

Aparentemente, muitos casais estão se revelando hoje.

— Mas tem um problema. Você sabe que eu amei muito seu pai enquanto ele era vivo. Quando ele se foi, foi como se a vida acabasse para mim e acho que você sabe disso melhor do que ninguém. Mesmo com a morte dele eu continuei o amando. Me lembrava de seu sorriso, de sua voz... Me lembrava de como ele era carinhoso e bondoso, de como me sentia a pessoa mais feliz do mundo com ele. Sinto sua falta até hoje. Quando ele se foi, jurei para mim mesma que continuaria sendo fiel à ele não amando mais nenhum outro homem, afinal seu pai foi o homem da minha vida. Então eu não sei se estou fazendo a coisa certa...
— Mãe, se tem uma coisa que meu pai queria era que você fosse feliz. E se isso envolve outro homem, então que assim seja.
— Está tudo bem pra você?
— Mas é claro que sim. Inclusive, gostaria muito de conhecê-lo. De onde ele é, Distrito 8?
— Na verdade, ele é daqui do 12 mesmo. Médico-chefe do hospital. O nome dele é Arno.
— Será um prazer conhecê-lo.

Ela me abraça. Fico realmente muito feliz em saber que minha mãe finalmente conseguiu seguir em frente e encontrou uma pessoa para amar, e para cuidar dela da mesma forma que ela cuida de todos.

Retornamos juntas até a sala de estar. Gale me lança um olhar cúmplice e sei que chegou o momento. Discretamente, peço que Peeta registre o momento que está por vir com sua câmera fotográfica. Ele fica confuso, mas prepara o objeto em suas mãos. Meu amigo começa a sussurrar algo no ouvido de Cressida e logo em seguida tira uma caixinha do bolso, chamando a atenção de todos.

— Cressida... eu quero passar todo o resto da minha vida com você. E por isso... você aceita se casar comigo?

Ela não precisa de nem mesmo um segundo para responder. Seus olhos brilham de felicidade.

— Sim! — Cressida exclama, puxando Gale para si e beijando-o intensamente.

Estamos todos reunidos na campina. Caminhamos devagar para acompanhar os passos de Cressida, que se cansa facilmente devido ao bebê que carrega em sua barriga. Em poucos meses, o pequeno Liam estará conosco.

Minha mãe emana alegria junto a Arno, que é extremamente simpático e encontrou em minha mãe um consolo após ter perdido a mulher amada durante a revolução. Suas feições indicam que ele encontrou um novo amor, assim como minha mãe. Willow e Rye correm pela campina atrás de coelhos, como sempre. Effie e Haymitch estão sentados na grama, enroscados um no outro, como um casal apaixonado. E quanto a mim e Peeta, bem... eu tento ensinar ele a usar um arco e flecha. Não é uma tarefa fácil e exige muita paciência da minha parte.

— Pela milésima vez, querido, você tem que manter o braço parado quando libera a flecha Desse jeito — digo, tentando esconder o meu descontentamento. Pego o arco de sua mão e lanço a flecha em um alvo improvisado localizado há aproximadamente uns 10 metros de distância. Acerto em cheio o centro do alvo.
— Eu desisto, Katniss. Deixa isso pra lá e vem aqui — ele diz, puxando-me para perto de si e colocando o arco cuidadosamente no chão, como se fosse uma bomba prestes a explodir. Ele sabe o quanto a arma é valiosa para mim. — Já falei o quanto você fica atraente quando atira assim?

Ele afasta uma mecha de cabelo do meu rosto, me beija suavemente e o calor do momento toma conta de nós. Envolvo meus braços em volta dele, sentindo a ternura e a paixão que sempre compartilhamos. O meu garoto com o pão, o meu dente de leão na primavera, que estará sempre comigo. Com a campina como nosso cenário, sabemos que este é o nosso verdadeiro lar, onde encontramos paz, amor e felicidade. A vida pode ter sido difícil, mas juntos fomos capazes de renascer das cinzas, e momentos como este fazem cada desafio enfrentado no passado valer a pena. Com Peeta a meu lado, sei que o futuro será repleto de ainda mais amor, esperança e alegria.

𝑹𝒆𝒏𝒂𝒔𝒄𝒆𝒏𝒅𝒐 𝒅𝒂𝒔 𝑪𝒊𝒏𝒛𝒂𝒔Where stories live. Discover now