Capítulo 8

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Aqueles olhos, apesar de frios, queimam algo dentro de mim. Como se ele pudesse ver através de meu ser. Como se eu estivesse nu na frente dele, incapaz de esconder qualquer coisa, pensamentos, emoções, a mim mesmo. Eu me vejo, refletido em seus olhos azuis, como se olhasse para um espelho.

Permanecemos parados por algum tempo (segundos? Minutos? Horas? Quem sabe?). Até que cometo o erro de quebrar o transe hipnótico de nosso silêncio.

- Professor? É você... não é?...

Como se minhas palavras finalmente o despertassem para a realidade, o enorme lobo branco rosnou e se jogou em minha direção. Paralisado de medo, apenas fecho os olhos e me mantenho imóvel, torcendo para que fosse rápido.

Pude ouvi-lo passar por mim, então o som da porta se abrindo. Quando finalmente tomo coragem para olhar, eu estou sozinho.

Levo alguns minutos para entender o que aconteceu. Meu professor (o homem que eu amo) se transformou em um lobo, bem na minha frente, e então saiu correndo. Eu poderia passar a noite ali, parado, só pensando sobre isso. Mas então um pensamento me ocorre.

Corro até as roupas rasgadas de Yuki, pego seu celular em um dos bolsos e disco para o primeiro contato de emergência que encontro. Alguém atende, posso ouvir uma música alta ao fundo.

- Você é um dos maridos de Yuki Yukimura? - falei primeiro

- ... Quem está falando?

- Meu nome é Kazumi Nakamura, você é ou não é um dos maridos do professor Yuki?

- Nakamura... AH! Aquele pirralho de quem o Yuu falou? Não acredito hahah... o que está fazendo com o celular dele? - A música parecia ficar cada vez mais alta, o ouço conversar com alguém - não não, isso ta errado! Você está colocando gelo demais, isso não é uma limonada droga...

- Vou considerar isso um sim - recobro sua atenção - você pode ir para algum lugar mais privado? É um assunto realmente importante.

- Hm... Se for me pedir para eu terminar com meu amado marido para que você tenha alguma chance com ele, pode ir tirando o cavalinho da chuva - ouço uma porta se fechar e o barulho da música parece mais distante - Pronto. Pode falar. É sobre o Yuu?

- Sim... ele... ele... como eu posso dizer? Você talvez me ache maluco mas, ele virou um lobo gigante bem na minha frente! Eu fiquei com medo, não pude fazer nada e ele... ele saiu correndo... e... eu não sei pra onde ele foi, se alguém vê-lo dessa forma... podem acabar machucando ele...

Assim que termino de falar, ele começa a gargalhar.

- hahahahahahahhaah não acredito nisso...

- Eu sei que parece mentira mas...

- Você... - ele me interrompe - Viu Yuki se transformar, e está com medo que ELE se machuque? Quem em sã consciência tem medo PELO monstro? Hahah... Você é realmente interessante, bem como ele contou...

- Você não está levando isso a sério... e se...

- Estou sim - o tom de voz dele muda abruptamente - Agora me diga, aonde isso aconteceu?

- No galpão, na parte de trás da faculdade.

- Chegamos em dois minutos. - e desligou.

Dois minutos? Não tem como ele chegar tão rápido! Pela música ele parecia estar em algum tipo de balada, e todas as boates ficam do outro lado da cidade. Decido que não posso esperar por ele, mas antes de sair a procura de Yuki, é melhor encontrar algo que ele possa vestir já que as roupas dele rasgaram quando se transformou. Reviro algumas caixas até achar um jaleco (melhor do que nada), então saio do Armazém.

Havia me afastado poucos metros do galpão quando ouço um barulho estranho atrás de mim, como se algo tivesse batido no chão.

- Já de saída? Eu disse que chegaria em dois minutos.

Me viro rapidamente, logo atrás de mim, aonde ainda agora não havia nada, estavam dois homens. O mais alto tinha cabelos e olhos pretos adornados por olheiras que deixavam seu olhar ainda mais profundo e complementavam seu semblante sombrio e sério. O outro (a pessoa com quem falei ao telefone) era ruivo, com olhos de um verde penetrante e um sorriso de canto que contrastava com a personalidade do homem a seu lado, mas ele logo parou de sorrir.

- Sabe pra onde ele correu? - ele perguntou

- Não... estávamos lá dentro quando aconteceu e eu só vi ele correndo para a porta...

- isso é uma perda de tempo. - o mais alto me interrompe - O garoto não sabe de nada, vamos nos separar e procurar. Eu vou para o norte, você vai para o sul e me avisa se encontrar algum rastro dele. - O ruivo concordou com a cabeça.

- Esperem! Em três cobriremos uma área maior, eu também quero ajudar.

- De jeito nenhum - cortou o mais alto

- Eu vou, quer vocês queiram ou não, então ao invés de ir contra mim, vamos trabalhar juntos. Lucien certo? E você deve ser o Akira - olhei para o ruivo

- Bingo - respondeu Akira - deixa ele ajudar Lu, mal não vai fazer, o que ele não podia ver ele já viu. Não tem como ele encontrar o Yuu antes mesmo.

- Que seja... SE encontrar algo que valha a pena relatar me ligue imediatamente, não vai ser problema já que você ainda está com o telefone dele certo?

- Ah... sim, quer dizer não... quer dizer... eu ligo se achar alguma coisa e... se vocês acharem ele, por favor me liguem...

- Vamos pensar no seu caso hahah - disse Akira - você procura ao leste daqui então, e Lu, é melhor chamar ELA para cuidar do Oeste.

- Sim...

Eu pisquei, e quando abri os olhos, estava sozinho novamente. Não deixei a estranheza do momento me afetar, eu tinha uma missão. Minha bicicleta estava ali perto, peguei ela e comecei a pedalar para o leste.

Não sei quanto tempo se passou, mas quando me dei conta estava na cerca que separava a cidade da reserva florestal que existe em volta dela. Pensei em dar meia volta, quando vi marcas estranhas no chão. As segui até uma parte da cerca que parecia estar amassada e inclinada, como de algo tivesse pulado por cima dela.

Peguei o celular de Yuki para ligar para os outros. Sem sinal. Eu vou me arrepender de fazer isso... mas vou fazer mesmo assim. Pulei a grade que me separava do vasto e frio desconhecido, que eu tentava inutilmente iluminar com a luz fraca do celular. Me puis a caminhar em meio a escuridão.

Depois de alguns minutos chego a uma clareira com um lago, vejo um animal beber água. Levo alguns minutos para assimilar a forma branca em minha frente com aquilo que vim buscar.

- Professor? - o lobo se assusta, mexendo as orelhas e virando o rosto em minha direção - Está tudo bem, eu vim ajudar. Não precisa ter medo.

Eu me abaixo com as mãos estendidas, tentando mostrar a ele que não sou uma ameaça enquanto me aproximo cautelosamente. Ele começa a rosnar ao notar minha aproximação.

- Eu não vou te fazer mal... não sei o que houve com você, mas vou ficar do seu lado até que você volte ao normal. Você vai se transformar de volta né? Quando amanhecer. É assim que funciona nos filmes. - estendo a mão em sua direção

Ele mostra os dentes por um momento, mas não tenta me morder nem fugir. Nos encaramos por algum tempo, a sensação do armazém se repete. Eu prendo a respiração, e sinto como se ele fizesse o mesmo, o olhar de um acalma e apavora o outro, ao mesmo tempo.

- Quem diria que ele realmente ia achar primeiro.

Ouço a voz de Akira. Antes que pudesse processar qualquer coisa, sinto uma pancada na cabeça, e perco a consciência.

Meu professor Lobisomem e seus dois maridos (+18)Where stories live. Discover now