Espadas Celestiais

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O paraíso estava em paz, mas a mente dos três irmãos não. Depois da revolta de Lúcifer e do motim que criou diante do trono junto a outros arcanjos por privilégios e poder, o clima não poderia estar pior, mas nenhum dos anjos comuns se importavam, não se lembravam, apenas carregavam o sentimento de culpa e a lição do que não deveriam fazer, mas as memórias dos motivos já não existiam em suas mentes, porém os três príncipes carregavam uma culpa que não lhes pertenciam, como motivo da revolta de tantos de seus irmãos.

Os três que nunca ousaram explorar o próprio poder, obedeciam ordens e realizavam missões como todos os outros seres celestiais ali, mas mesmo o poder inutilizado fora o estopim para o começo do motim, não porque queriam ser iguais, mas porque queriam ser mais, a ganância disfarçada de injustiça em cima daqueles que nada faziam. Agora nem mesmo no paraíso podiam ser eles mesmos, manipulando a névoa para se esconder daqueles que foram criados para serem seus iguais.

Por isso preferiam se esconder no Éden, apenas entre os três, sem a necessidade do peso da magia nos ombros, passaram a evitar o máximo possível os outros anjos, até mesmo Haniel e Galadriel que adoravam estar cercados, evitavam. Não entendiam o motivo do motim, sempre eram simpáticos e solícitos, aceitando fazerem missões que não lhes pertenciam em troca de nada se não gratidão, não entendiam como aqueles que lhes sorriam sempre, naquele dia estavam atrás de Lúcifer os encarando feio ou envergonhados quando adentraram a sala do trono tardiamente.

Algumas semanas já haviam se passado, tentavam esquecer e permanecer longe, aquele pequena melancolia com sabor de traição ainda lhes assolavam mas agora um pouco mais distantes. Haniel se levantou buscando o blazer jogado na grama ao seu lado. Galadriel tirou os olhos do livro que havia surrupiado em sua última missão no mundo humano, e observou os passos de seu irmão, Uriel permaneceu deitado na beirada da cachoeira, tocando a água com a ponta dos dedos apenas.

— Onde vai? — Perguntou o anjo da bondade.

— Buscar algumas frutas.

— Traz algumas maçãs e uvas para mim? — Galadriel pediu gentilmente.

— Vai querer algo também, Uri? — O anjo da luz rolou na grama encarando o irmão mais velho de forma preguiçosa.

— Uma melancia e algumas tangerinas.

— Uma melancia? Como eu vou trazer isso tudo?

— Você tem poderes. — Deu de ombros voltando a se virar e tocar a água.

Os próximos minutos até a volta de Haniel foram silenciosos, Galadriel estava vidrado nas palavras impressas no livro antigo, a capa de couro desgastada. Uriel apenas aproveitava o sol fazendo desenhos abstratos na superfície quase serena da água. Logo o anjo do amor voltou com o blazer branco em mãos, enrolado em uma cesta improvisada onde carregava todas as frutas.

Uriel se moveu de forma preguiçosa mais uma vez se aproximando de seus irmãos enquanto Haniel abria o blazer sobre a grama fazendo uma maçã rolar para longe. Galadriel fechou o livro deixando de lado se esticando até a fruta fujona.

— O que anda lendo? — Haniel perguntou enquanto mordia um jambo.

— Romeu e Julieta. — Galadriel tirou um canivete do bolso cortando a maçã em fatias conforme comia. Uriel empurrou a melancia grande para perto do anjo da bondade em um pedido silencioso que logo foi atendido.

— Ah já li, a uma centena, por que demorou tanto? — Haniel respondeu indignado.

— Eu estava adiando, sabia que era triste.

— Mas é romântico.

— Ah, não comecem vocês românticos incuráveis. — Uriel resmungou terminando de tirar a casca de uma tangerina.

Rising ❧ A ascensão antes da queda.Where stories live. Discover now