Inferno na terra

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-Bem vinda de volta, minha querida! Disse Samanta angustiada.
-Como está se sentindo?

Balbuciei tirando a máscara de oxigênio...
TOMÁZ!

- Minha querida não se esforce você precisa descansar.
Ela colocou novamente a máscara em meu rosto.
E adormeci

Mais tarde quando despertei novamente pela segunda vez me sentia muito fraca.
Minha boca estava seca.
Meus olhos pesavam, provavelmente pela medicação.
Toquei a campainha.
Dessa vez estava sozinha.
A enfermeira chegou, falou e falou mas eu não entendia nada, Alemão não era o meu forte.
Foi quando o médico chegou e com ele Samanta e Camila.
Samanta falava em inglês com o médico na porta do quarto e bem baixinho me olhando com o canto dos olhos.
Camila sentou se ao meu lado na cama segurando minha mão.

- Querida como você está se sentindo, consegue me compreender?
Perguntou Samanta apreensiva.

Fiz um gesto com o cabeça.
Retirei a máscara e pedi por Tomáz.

- Onde está Tomáz quero vê-lo.
Ele está bem?
Elas olharam entre si.

- Minha querida o que vou lhe dizer é muito difícil. Eu queria poder não ter que lhe dar essa notícia.
Lembre-se...
Disse segurando minha mão firme.
- Estamos aqui por você!

O que você lembra do acidente?

Minha cabeça estava confusa.
Fecha os olhos e muitos flashes apareciam...

- Eu não sei ao certo...
Estávamos na estrada e não faltava muito para chegarmos.
Chovia bastante.
Eu lembro de sentir os cacos de vidro cortando o meu rosto e então o carro não parava de girar...

- Tomáz, onde está Tomáz?
Samanta me diga!
Comecei a ficar mais desperta e agitada no leito.
Estava tão preocupada com Tomáz que não percebi que não sentia minhas pernas.

- Querida olhe para mim, respire fundo ok?
Vamos lá, tente se acalmar.
Olhando em seus olhos eu inspirava e expirava ...
- O acidente de vocês foi muito sério, houveram muitas complicações.
O carro de vocês despencou da ponte e caiu no rio.
As equipes de resgate levaram 25 minutos até chegar em vocês.
E mais 1h se passou com vocês presos as ferragens.
Ele fizeram tudo que podiam naquele momento para salva-la durante o resgate.
Suas pernas ficaram presas e você está perdendo muito sangue...

Eu ouvia atentamente cada palavra que saia de sua boca até...

- Mas o Tomáz.

Congelei.
Nesse momento eu não ouvia mais nada, estava com os olhos vidrados e meu coração disparado uma crise de pânico se instaurou em mim comecei a gritar.

- Não, não, não... Tomáz!!!
Eu quero vê-lo. Tomáz!!!

Elas me abraçavam. Tentando me controlar.
Eu queria descer da cama e ir ao seu encontro.
Mas não conseguia me mexer...
Gritos e mais gritos dilacerados eram ouvidos por todos os corredores do hospital.
A enfermeira entrou e aplicou um calmante intravenoso.
Apaguei.

Quando voltei a recobrar a consciência senti um vazio na alma.
Meu coração estava quebrado.
Sentia falta de ar.
Queria morrer.
Não imaginara a vida sem Tomáz.

Porque Deus, porque tirasse ele de mim?
Tínhamos tanto para viver ainda.
Estávamos apenas começando...

Meu telefone tocou.
Tocou, tocou... Até desligar.
Não queria ver ninguém, falar com ninguém.
Meu luto seria eterno!

Mas essa dor ainda era só uma parte da minha perda.
Eu não tinha perdido apenas Tomáz.
Eu havia perdido também a dança!

O médico entrou em meu quarto.
Havia um tradutor com ele.
Enquanto ele falava em alemão seu idioma nativo.
Um universitário brasileiro que fazia intercâmbio na Alemanha e trabalhava de voluntário no hospital fazia as traduções.

- "Senhorita Alice, que bom que está conosco. Meu nome é Dr. Hermann e sou o médico que fez sua cirurgia, gostaria de saber como está se sentindo?"

Eu olhava para ele com os olhos inchados de tanto chorar e pensava que cirurgia?

- "Mais tarde um fisioterapeuta irá conversar com você sobre as possibilidades de sua nova mobilidade, quais os tratamentos etc..."

- "Você também precisará fazer acompanhamento terapêutico nessa fase. Isso é muito importante para que você possa compreender a sua perda e assim ter uma nova perspectiva."

Nova mobilidade? Nova perspectiva?

Do que ele estava falando?

Tomáz não estava mais aqui e não era sobre ele que falava.

O tradutor percebeu minha confusão e então conversou com o médico.

- "Senhorita Alice, sinto informá-la mas as condições do seu acidente deixarão sequelas em seu corpo.
Fizemos o que foi possível mas precisávamos fazer uma uma escolha e naquele momento decidimos por sua vida.
Infelizmente foi preciso amputar suas pernas devido a gravidade das lesões.
Você ficou muito tempo presa as ferragens e isso impactou na coagulação dos membros inferiores.
Eles foram severamente afetados.
Você sofreu uma grave hemorragia.
Sinto muito por isso."

Eu entrei em choque.

Aquele pesadelo não acabara mais...
Eu já não tinha mais forças e agora eu havia desistido de mim.

Tirei o lençol que cobria meu corpo e então pude ver as ataduras que cobriam meus joelhos. Eles estavam muito inchados e enfaixados.
Olhava sem acreditar no que via.
Eu havia morrido e estava no inferno.

Fiquei ali observando minha nova condição incrédula de como tudo foi de cem a zero num piscar de olhos.

Chorei compulsivamente...

Haviam se passado onze dias desde o acidente.
Fiquei nove deles em coma.

Eu queria ver Tomáz mas não pude.

O corpo dele havia sido levado para Buenos Aires dias depois do ocorrido.
Eu estava presa naquela cama de hospital sozinha, perdida e devastada.

O festival havia sido cancelado em luto pelo Tomáz.
Estávamos na capa de revistas e jornais intercionais.

- "Jovens bailarinos sofrem grave acidente na cidade de Hamburgo.
O casal que havia ficado noivo recentemente dirigia em direção a Dinamarca para o festival de dança que estava acontecendo e também participando.
Os bailarinos das companhias Tango e Samba foram atingidos por um caminhão que deslizou na pista devido a chuva naquela ocasião.
Infelizmente o bailarino argentino Tomáz Bragança não sobreviveu.
Nossas sinceras condolências a família e amigos de Tomáz.
Alice Guedes sua noiva encontra-se estável no hospital geral de Hamburgo. Ela passou por uma cirurgia e deve voltar para o Brasil em breve.
Desejamos a ela uma rápida recuperação e também nossas condolências por sua grande perda."

Nossas vidas haviam acabado!
Nossos sonhos haviam morrido!

Nossas vidas haviam acabado!Nossos sonhos haviam morrido!

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