Um milhão de sentimentos.

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Aquele tempo na fisioterapia nos aproximou de um jeito diferente.
Quando não nos víamos ele me enviava mensagens.
Sempre com a mesma desculpa...
Eu já não precisava mais de ajuda com as novas próteses, mas ele insistia de que eu precisava ir até a clínica e continuar com os exercícios para melhor adequação e fortalecimento.
As vezes ele aparecia sem avisar no meio da tarde na ONG e passava um tempo comigo e as crianças.
Ele era muito bom com elas.

Quando ele percebeu que já não conseguiria mais me prender em sua clínica por não haver motivo plausível.
Ele se voluntariou na ONG.
Passou a fazer de tudo um pouco.
Consertava uma torneira aqui.
Ajustava uma lâmpada ali...
As crianças o ensinaram a plantar.
E ele as ensinou a pintar... E juntos decoraram os muros da ONG.
As vezes eu me escondia na cozinha só para não ficar na cara que eu estava gostando de tê-lo por perto.
A senhora Nadine claro que percebeu...

- Ele parece gostar muito de você Alice. E me cutucou o braço enquanto cortavamos os legumes.
- Eu já reparei bem nele. Ele não tira os olhos de você quando estão juntos. Te admira.
Continuei em silêncio.
- Você sabe disso não sabe? Perguntou me olhando por baixo dos óculos de grau.
- Você até pode se esconder dele aqui ou ali, tanto faz. Mas não pode negar que seu coração está desabrochando.
Não impeça querida, deixe ele florir.
Me deu um beijo na testa e saiu.

...
Durante um dia específico da semana levávamos as crianças para uma diversão fora da ONG.
Fazíamos passeios comuns mas que para nós pareciam encontros.
Fomos ao zoológico com as crianças.
Ao teatro e museu também.
Seus olhinhos brilhavam.
Levamos elas ao cinema e ao circo.
Elas riram até fazer xixi nas calças.
Estávamos sempre em lados opostos mas nossos olhares tinham a mesma direção.
Toda sexta-feira era dia karaokê na ONG.
As crianças se divertiam muito e nós também.
Ter ingressado na ONG havia me transformado profundamente, era o único lugar onde eu me sentia verdadeiramente inteira.
Fazer a diferença na vida daquelas crianças mesmo com tão pouco era enriquecedor.
Eu havia perdido o contato com todos aqueles que fizeram parte do meu passado.
Para mim não fazia sentido alimentar uma condição que não me pertencia mais.
A dança ficara no passado assim como todos aqueles que nela estavam.
Agora meus esforços estavam voltados apenas para o futuro daquelas crianças.
E isso me preenchia.

Eu finalmente estava sorrindo de verdade. E me sentia feliz.
E então culpada.
Como eu poderia experimentar novas sensações se Tomáz havia partido.
Estava aos poucos saindo do meu casulo.
Às vezes isso me assustava.
Eu estava mesmo pronta para deixar o passado?

Precisava dar o primeiro passo.
Ainda que ele fosse pequeno.

Era sábado.
Estava terminando de arrumar as coisas para levar as crianças para o parque num dia de brincadeiras e piquenique.
O dia estava ensolarado.
A primavera é minha estação favorita do ano.
Quando tudo está florindo novamente, para me lembrar de que sempre haverá renovação. Tudo são fases.

Bibipi....
Toca a buzina.

Eduardo chegara com a van para buscarmos as crianças.
E havia trazido novos voluntários...
A equipe da clínica.

Partimos em duas vans e muito animados.
Cantávamos cantigas da infância e músicas atuais durante o trajeto.

Já no parque enquanto as crianças corriam de um lado para o outro...

- Você não vai se juntar a nós na cabra cega? Perguntou Eduardo.
Eu estava sentada numa toalha quadriculada estendida no gramado do parque.

- Eu acho que poderia perder a direção facilmente e cair no lago, rs.

- Isso jamais acontecerá com você se eu estiver ao seu lado.
-Venha.
Estendeu as mãos. E seguida me levantou.
- Vai ser divertido, eu prometo.

Nossos SonhosWhere stories live. Discover now