março e formatura

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Eu estava tão feliz entre janeiro e o meio de março, quando eu tinha Marcus só pra mim e nada além dele, que eu deveria saber que alguém da minha família farejaria  minha felicidade como um tubarão.

Aconteceu com Bellatrix, uma das minhas primas. Bella havia me escolhido como alvo desde que Sirius tinha ido embora. Assim como aquelas abordagens "aleatórias" em aeroportos, ela me escolheu sem motivo nenhum. Eu era um black e estava ali.

Certa noite ela entrou no meu quarto durante uma reunião de família e me abordou, segurando um celular na frente do meu rosto.

-Eu sei qual é a sua, Reg- Bella disse, apontando para a foto na tela do celular.

Olhei de perto e, quando percebi o que era, tentei pegar o celular da mão dela, mas ela o afastou de mim.

Era uma foto de Marcus me beijando no carro dele.

- Você não vai querer que eu espalhe seu segredo de bicha para a família inteira né? - ela falou, se inclinando para chegar mais perto.

Aquelas palavras me acertaram com tanta força que mal consegui registrar o fato de que ela havia seguido Marcus e eu até o estacionamento onde a gente ficava quando nossos pais estavam em casa. Eu mal consegui olhar direito para a foto. É difícil ver uma imagem como aquela, o rosto do primeiro garoto que você beijou, sem imaginar o olhar bizarro da garota que pode te chantagear com o detalhe mais íntimo da sua vida.

- Mil dólares da fortuna que o Sirius te deixou e eu não mostro essa merda para os seus pais - Bella disse.

Ela não estava brincando.

Mas o fato era o seguinte: Sirius não havia me deixado nada. Mas quando meus pais tentaram bloquear a conta dele anos atrás, eu havia dito que os dados estavam comigo, que ele havia deixado pra mim. Quando na verdade, eu só queria que ele pudesse fugir em segurança.

Era muito mais fácil dizer "eu mudei todas as senhas" do que dizer  "por favor, não deixem meu irmão traidor morrer de fome."

Acontece que Sirius tinha muito dinheiro guardado durante os anos. Mas eu, eu não tinha o dinheiro que Bella queria. Tentei convencê-la a mudar de ideia mas a garota estava estranhamente insistente nessa coisa toda.

E quando me dei conta do que havia acontecido, não foi como uma explosão dentro de mim, e sim como um desabamento constante.

Toda a atenção meticulosa que eu havia dedicado a planejar como ia me assumir para meus pais, todos os anos que passei no armário sabendo que eu deveria me assumir do jeito certo: puf! Como poeira ao vento. Bellatrix foi muito clara: se eu não entregasse o dinheiro em um mês, estaria fodido.

Havia mais uma condição.

— Nada de ir contar para o seu namoradinho gay sobre o nosso acordo — ela acrescentou. — Se alguém ficar sabendo disso, essa merda vai direto para os seus pais.

E foi assim que Bellatrix Black demoliu a fortaleza que passei anos construindo para proteger meu segredo.

Quando se é gay, você cresce fazendo muita matemática mental. Seu cérebro é basicamente um grande placar de pontos nas cores do arco-íris, registrando cada coisinha que seus pais dizem – os comentários cotidianos, o jeito como reagem a dois homens de mãos dadas no shopping ou ao último comercial da Prada com um casal queer.

Você marca pontos para cada acontecimento. Positivos ou negativos. Chega uma hora em que você soma todos os pontos – e, acredite, nenhum é esquecido – e, com base na pontuação final, você decide como vai planejar sua saída do armário.

Para ser sincero, eu não conseguia visualizar um mundo em que minha saída do armário não fosse caótica. Queria poder dizer que eu era melhor do que isso, que eu ignorava o estereótipo. Mas, quando sua segurança depende de o estereótipo ser verdadeiro ou não, não dá para ser corajoso. Eu não ia apostar minha felicidade no fato de que minha mãe não atacava dois homens numa fila de supermercado.

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