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Na vila onde morei durante os meus dezessete anos de vida ouvi dezenas de vezes anúncios sobre pessoas que estavam morrendo de fome, mesmo com as ajudas que recebiam dos vizinhos, ainda não era o suficiente, afinal todos eram pobres demais e o úni...

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Na vila onde morei durante os meus dezessete anos de vida ouvi dezenas de vezes anúncios sobre pessoas que estavam morrendo de fome, mesmo com as ajudas que recebiam dos vizinhos, ainda não era o suficiente, afinal todos eram pobres demais e o únicos alimentos que possuíamos eram divididos entre a sobrevivência e o comércio.

Durante a minha infância eu percorria um longo caminho entre bosques e florestas em busca de frutas para levar até a vila, mas a pesca era a atividade que auxiliava mais em conter a fome.

As famílias que se alimentavam melhor eram as que tinham menos pessoas, como a minha, em que era composta apenas pelo meu tio Tyler e sua esposa, Rosalind, mas mesmo assim nós nunca esbanjamos comida. Não igual havia naquele baile ou seja lá como as pessoas chamavam.

Havia tanta comida sendo distribuída em uma noite que seria o suficiente para alimentar vilas durante meses.

Os pais e os estudantes que vi pareciam tão impressionados como eu, todos comeram e ainda guardaram em bolsas para levar para o resto do povo da vila. Eles se sentiam abençoados por aquela dádiva, nem ligavam para os uniformes que as filhas usavam, os pais de Sina pareciam satisfeitos pois dançavam animadamente junto com os demais. Ninguém ali se incomodou com o capuz que cobria o meu rosto, ninguém questionou o porquê de eu não comemorar como os outros, todos estavam distraídos demais com a comida e com a música. Sinceramente, acho que nem se importariam com a minha aparência, mas vi nobres circulando e eles com certeza me notariam.

Uma hora ou outra eu teria que mostrar o meu rosto, porém prefiro não fazer isso em meio a uma festa cheia de pessoas.

Fiquei no salão apenas o tempo suficiente para encher a barriga, afinal, a caminhada da vila até Eblenia tinha me deixado faminto. Em um certo momento da noite ouvi as pessoas falando sobre a chegada do rei e sobre o seu discurso que aconteceria em breve, então resolvi voltar para os meus aposentos através das portas do fundo, onde ninguém me veria. Mas os meus planos não funcionaram já que me deparei com uma garota.

Eu soube que ela não era uma plebeia pela sua postura e pela forma como olhou para mim, pela forma como eu não passei despercebido por ela. Seus olhos curiosos me inspecionavam enquanto ela caminhava na minha direção.

Não parecia uma menina da vila, não parecia uma garotinha que precisava de proteção, não parecia uma garota gentil que curava pessoas ou que fazia penteados nos cabelos de outras meninas. Ela era destemida, corajosa, vi isso em seus olhos castanhos antes mesmo dela abrir a boca e, mesmo sem ver o meu rosto, tive a impressão de que ela me lia muito bem.

Gravei cada traço do seu rosto em minha mente, a maneira como ela falava, como quem pudesse te queimar vivo a qualquer instante. Quando ela me olhava havia fogo em seus olhos, faíscas queimando em suas pupilas escuras e quando o vento batia em seu cabelo, em uma rajada leve, suas feições pareciam tranquilas e sutis. Porém a maneira como ela cruzava os braços sob o peito davam a ela um ar de autoridade. Aquela mulher era um misto de coisas em uma só.

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