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      Any Gabrielly Soares🌹

Não preguei os olhos durante a noite e, pela manhã, quando o sol nasceu, fiquei observando enquanto ele subia no céu, segurando uma xícara de café nas mãos. Eu estava na varanda dos fundos sentindo o calor do sol na minha pele. Estava impressionada com a sensação de vazio que sentia por dentro, enquanto observava a luz da manhã iluminar o céu. Meu pai costumava dizer para mim e para minha irmã que os raios do Sol matinal eram um beijo de Jesus em nossa pele.
     Quando eu era mais nova, nunca mencionei as verdades científicas que aprende na escola sobre o nascer e o pôr do sol porque esse não era o meu papel. Às vezes precisava acreditar em certas coisas para passar por cada dia.

    Naquela manhã, eu precisava acreditar nos beijos de Jesus.

   —você acordou cedo demais. -Nour bocejou e saiu da casa, ainda de pijama.

   —eu queria sentir os beijos de Jesus. -brinquei, respirando fundo o ar fresco da manhã.

   Ela se aproximou de mim, pegou minha xícara e tomou um gole.
   
   —dormiu bem?
 
   —não preguei os olhos.

   —faz sentido. Eu também não consegui dormir. Eu me esforcei muito para não ir até seu quarto ver como você estava. Estou muito preocupada com você.

    —vou ficar bem. -respondi, mesmo sem ter certeza se isso era verdade, mas eu tinha fé. Pelo menos o suficiente para cada respiração. —tudo sempre se resolve, não é? Não se preocupe comigo.

    —você é minha irmã, meu coração, Any. Eu sempre vou me preocupar com você.

    Eu acreditei nela. A mesma preocupação que Nour tinha comigo, eu tinha com ela.

    —só gostaria de poder fazer alguma coisa por você. Gostaria de poder acabar com toda a sua dor. Eu sinto muito, muito mesmo. -disse ela, sendo bem sincera. —sinto muito por tudo que eles fizeram com você.

    Ficamos paradas ali, olhando para aquela manhã e, quando apoiei a mão no parapeito, minha irmã colocou a dela sobre a minha. Não sei porquê, mas o toque carinhoso fez meus olhos se encherem de lágrimas enquanto assistiamos ao nascer do sol. Por um breve instante eu me senti menos sozinha. Talvez fosse para isso que a família servia—para fazer com que a gente se sinta menos sozinha. Às vezes, a família não entendi a isso; às vezes, diziam as coisas erradas e faziam as coisas erradas, porque, afinal de contas, eram apenas seres humanos. Mesmo assim, havia aqueles momentos em que eles chegavam bem na hora certa com sua centelhas de amor. Estar em casa cura.

    —você trouxe roupas para a missa? -perguntou Nour, bocejando de novo. —ou quer pegar uma das minhas emprestadas?

    —acho que não vou. Não estou preparada para ir à missa de domingo de uma cidade pequena hoje.

    Nour riu, jogando a cabeça para trás e, quando parou de rir, olhou para mim e ficou boquiaberta.

    —espere um pouco, você está falando sério?

    —estou, sim.

    —Any, Você é filha do pastor, e acabou de voltar para Chester. Todo mundo já sabe da sua volta. Você sabe o que sua ausência faria com a mamãe, não sabe? Ela vai acabar tendo um infarto.

    —ela vai ficar bem. -menti. Eu sabia que não.

     Nour arqueou uma das sobrancelhas.
     —já consigo ouvir a Srt. Grove enchendo a mamãe te perguntas sobre o motivo de você não estar na missa o que vai fazer a mamãe encher você de perguntas. Você realmente quer lidar com isso?

    Suspirei. Eu não queria mas não sabia se estava pronta para falar com alguém. Eu não tinha conseguido ainda me olhar no espelho sem chorar. Além disso, já havia recebido algumas mensagens de texto de moradores da cidade que me viram no fundo do poço ao lado de Josh na noite anterior. Eles ficavam perguntando se eu estava bem, e aquilo era demais para mim. A ideia de encarar toda a congregação parece ser extremamente aterrorizante.

    Nour deve ter notado minha hesitação, porque apertou minha mão.
   
   —não se preocupe. Mamãe pode ficar um pouco irritada no início, mas isso não é novidade. As coisa mais importante agora é tomarmos conta de você e de seu coração está bem? Pode deixar que eu vou dar uma desculpa e dizer que você está passando mal.

    Eu ri.
    —você é capaz de mentir dentro da igreja por mim?

    —eu faço qualquer coisa por você, Any. Qualquer coisa.

    —até mesmo me ajudar a me livrar de um cadáver? -Brinquei.

   —só se for o de Noah Jacob Urrea. -retrucou ela.

    Isso trouxe um sorriso aos meus lábios, mas logo fui tomada pela culpa só de pensar em Noah morto.

    Às vezes era difícil ser uma seguidores de Deus, quando os sussurros do demônio pareciam bem mais satisfatórios.

    Voltamos a observar o horizonte e, de vez em quando, eu respirava bem devagar.

Shame -BEAUANY (Adaptação)Where stories live. Discover now