XXXIV - PESO MORTO

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Sônia engoliu em seco, mas sabia que não poderia ficar mais calada.

— Mas não é o meu sonho.

O imperador fechou o cenho, pronto para enraivecer novamente, mas Sônia continuou.

— Eu jamais abandonaria a nossa família e o meu povo. Eu jamais deixaria de ajudar caso necessitassem. Mas eu tenho sonhos e preciso vivê-los.

O homem ponderou por algum momento com o semblante fechado e carrancudo. Ele bufou, relaxando um pouco os ombros e suavizando as expressões duras que enrugavam a sua face.

— Se a sua mãe estivesse aqui ela certamente diria que você puxou a mim. Ela sempre disse que eu era teimoso e de fato... um tremendo sonhador. Mas sonhos morrem, Sônia. Sinto muito em lhe dizer isso. Você não pode mudar o mundo, você não pode mudar quem é.

O homem deu-lhe as costas e se encaminhou para o trono no altar.

— Agora dirija-se aos seus aposentos. Precisa se preparar para o seu casamento amanhã.

Sônia o olhou com sobressalto enquanto ele se sentava. Casamento? Realmente havia tomado aquela decisão sem o consentimento dela.

— Você não pode me obrigar a isso!

— Eu fui obrigado a me casar com a sua mãe, e veja só, eu tive você. Agora saia, ou chamarei a guarda! Talvez uma noite na masmorra fria faça bem a sua cútis.

Sônia grunhiu enraivada. Como o seu pai poderia estar pensando em casamento? Ele estava plantando uma discórdia contra a seita, e o pior, havia um demônio solto e todos corriam risco de vida. A jovem maga não conseguia elaborar direito as palavras, pois, ainda estava em choque diante daqueles fatos. A sua consciência não conseguia enxergar a verdade sobre Ako, mas de todo forma, ela tentava ser realista e precisava que o seu pai ao menos uma vez lhe ouvisse.

— Não temos tempo para pensar em casamento! Estamos correndo risco! Libere os bruxos, por favor! Evite um problema maior, tem um demônio...

— Cale-se! — Ele gritou, se pondo de pé — Retire-se imediatamente! Não ouse a me desobedecer!

Sônia cerrou os punhos. Olhou para aquele homem com desdém por alguns segundos. Ela lhe deu as costas e atravessou o salão vazio enquanto os seus passos ecoavam no ambiente, sentindo o vendo frio que adentrava pelas enormes janelas. Ela estava com raiva, sentia-se um tanto fracassada. Não conseguiu ajudar Náidius, muito menos Órion, aqueles bruxos iriam morrer, o seu pai iria desencadear uma guerra contra a seita e Ako... Ela caminhou até o seu quarto seguindo pela vastidão de corredores e escadas. Ela não poderia se casar e muito menos ficar presa naquele lugar gélido. Não sabia como, mas precisava fugir. Entretanto, não poderia sair e deixar aqueles bruxos definhado para a morte. Precisava escapar e levá-los consigo, mas ainda não sabe como faria isso.

...

Náidius apoiava as costas da amurada no final da popa do navio. Observava os rastros que a embarcação deixava na água enquanto seguia alguma direção que tampouco ele sabia se seria ao norte ou sul. A lua não estava cheia, embora apenas se apresentava metade crescente, ainda sim a sua luz iluminava as águas. Ele estava um pouco enjoado. Não se sentia bem com os pés fora da terra firme. O balançar não somente lhe causava náuseas como insegurança. Ele bem se lembra das histórias dos livros que contavam naufrágios violentos ao decorrer do tempo. A biblioteca de Sidelena era recheada de contos do tipo.

Do tombadilho ele conseguia visualizar bem a movimentação do navio. Estava uma calmaria com poucos marinheiros no convés. Estava muito frio, apesar do seu casaco ser um pouco suficiente para aquecer. Ele retirou do bolso o saquinho com tabaco. Preparava um cigarro e antes que pudesse acendê-lo com o seu isqueiro ouviu passos subir a escadaria do tombadilho. Júlia.

Legend - O Mago Infernal (Livro 3)Where stories live. Discover now