O quão ridículo é o fato de usar um app de mensagem anônima como fuga?
Sim, eu reconheço que o bastante para não querer compartilhar o meu novo passa-tempo para driblar o tédio das incontáveis horas de vôo, estrada e estadias em hotéis.
Como defesa, cabe pontuar que as outras redes sociais não me permitem ser alguém além da própria Lauren. A possibilidade de falar o que quero, penso e sinto sem ser exposta, me dão a sensação de liberdade que há muito tempo não sinto.
E uma pessoa, em específico, é o motivo para que meus sorrisos mais sinceros sejam resultado, literalmente, da tela do meu celular.
Sai do banho e me apressei para jogar na cama e responder a garota que há mais de três mês venho conversando. Ela não sabe quem sou eu, eu não sei quem é ela de verdade... mas os nossos diálogos despertam sensações adormecidas em mim até então.
L9: espero que ainda esteja acordada, pelo menos assim meu dia terminaria um pouco melhor. - enviei, esperando ansiosamente para que ela respondesse e a mensagem anterior fosse automaticamente apagada.
Kitty: pra ser sincera... estava deitada esperando a sua mensagem (: aconteceu algo de ruim?
Sorri para a tela.
L9: de ruim não, cansaço e saudade de conversar com você. - me senti uma otaria enviando isso, ela sequer sabe o meu nome real.
Kitty: trabalhar viajando é muito ruim, entendo o cansaço porque vivo da mesma forma, como já te disse.
A mensagem dela chegou, mas as reticências indicavam que iria complementar a mensagem.
Kitty: quero te pedir uma coisa, mas tenho medo de você não aceitar e ficar estranha comigo.
Mil coisas passaram em minha cabeça, porém, nenhuma delas se sobrepôs a minha curiosidade.
L9: provavelmente será o mesmo que venho pensando nesses meses.
Cinco minutos sem uma resposta foram o suficiente para ativar a minha ansiedade. O suficiente para levantar da cama e ir acender um cigarro, claro, com o celular na mão.
Kitty: desculpa, minha mãe ligou preocupada, não dei notícias para ela hoje. 🙈
Sorri.
L9: você é tão fofa.
Kitty: aposto que lembrou daquela sua colega de trabalho, não foi?
Claro, ela não sabe o meu nome, não sabe a minha profissão, apenas que trabalho "viajando", mas o meu maior segredo, acabei contando em uma das madrugas de conversa. Burra.
L9: sabe, as vezes eu fico imaginando como você deve ser. - Enviei sem pensar. Mais uma vez.
Kitty: era sobre isso que eu queria falar... sabe, já tem uns 3 meses que estamos conversando.
Ela parou de digitar por alguns segundos.
Kitty: eu acho que o carinho que sinto por você tem passado um pouco do que seria saudável para um desconhecido.
Essa doeu.
L9: não sou um "desconhecido". - hipocrisia, na realidade eu era sim.
Kitty: eu gosto de uma pessoa, você também. Não estamos com elas, mas sinto algo diferente com você. É muita loucura?
Apaguei o cigarro, o assunto levou um rumo que eu não queria.
L9: Não, não é loucura. Acho que o que nós temos é uma conexão real. Nós não estamos mentindo, apenas omitindo algumas informações.
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