Ep. 09 - Mágoa

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Glória estava em seu carro, em uma distância segura do que observava, usando óculos escuros e com o celular a postos.

Ela estava há alguns metros da casa de Matias, olhando atentamente cada movimento que pudesse acontecer. Até o momento, nada havia ocorrido; o máximo que percebera fora a chegada do advogado do pastor, que passara algumas horas dentro da casa e depois fora embora sem mais atividades. Já fazia isso tinha alguns dias; e ninguém visitava Matias. Nunca.

Apenas uma pessoa.

E lá estava ela novamente. Glória ajustou a postura e deixou o celular a postos. Entrando na propriedade do pastor, havia um homem de meia idade, de um corpanzil impressionante, careca e branco. Ela não conseguira registrar o rosto dele, mas tirou foto de suas costas adentrando o portão.

Quem era essa pessoa, e porque visitava tanto Matias, eram as questões agora.

-- # --

Paulo abriu a porta, agitado, correndo atrás dos filhos com uma bolsa na mão. Os alcançou ainda na calçada, caminhando juntos.

- Lila, minha filha. - Disse ele, esbaforido - Você esqueceu sua mochila.

- Isso era desculpa dela pra faltar aula hoje, certeza. - Provocou Rafael.

- Cala a boca. - Brigou Lila, pegando a mochila da mão de Paulo - Brigada, pai.

Enquanto a família se despedia, com instruções de última hora dadas por Paulo e Rafael e Lila retomando seu caminho até a escola de mãos dadas - o mais velho sempre andava agarrado a irmã mais nova quando na rua, por medo de ela acabar sofrendo algum acidente - nenhum deles chegou a notar a figura em cima de uma moto que os observava atentamente.

Muito menos as fotos que essa figura tirava, com os zooms das lentes da câmera especialmente focadas em Lila.

-- # --

Verônica se plantou no meio da sala, encarando o quadro de pistas que montara, quase que obsessivamente.

Já haviam se passado mais ou menos uma, duas horas desde que Anita explodira com as inquisições incessantes de Verônica sobre seu pai. A escrivã havia ido longe demais; ela sabia disso. Não tinha noção do quão delicado esse assunto seria para Anita - em parte porque ela nunca quis, de fato, entender a magnitude do prejuízo que as ações de seu pai poderiam acarretar para as pessoas a quem afetou. No fundo, era algo que ela queria mudar; queria ter essa noção. Por isso perguntara. Mas, mesmo sendo o valor que mais defendera a vida inteira, Verônica falhou em respeitar o "não" de outra mulher.

A escrivã ainda estava com os olhos cravados no quadro, distraída em seus próprios raciocínios, quando a delegada finalmente saiu do quarto - aonde se trancara após sair do banheiro - e adentrou a sala. Verônica não interrompeu o seu olhar fixo. Anita ergue uma sobrancelha.

- O que é que você tá pensando? - Perguntou a delegada.

- Ô, Anita. - Verônica umedeceu os lábios, levando um dedo a boca, pensativa - No orfanato...

O corpo da delegada se tencionou, e ela já deu um passo para trás, contorcendo o rosto para uma expressão de raiva incrédula.

- Verônica, pela última vez... - Interrompeu ela, a voz cheia de fúria - ...Eu não vou...

- Não, calma! - A escrivã finalmente tirou os olhos do quadro e se girou depressa para a delegada, erguendo os braços em sinal de rendição - Não vou perguntar nada demais e tô com uma coisa na cabeça, juro!

A expressão de Anita suavizou e seu corpo relaxou um pouco, ainda que permanecesse desconfiada.

- Eu sei que eles separam as crianças entre quem eles querem usar futuramente e quem eles querem vender. - Continuou Verônica - Quando isso acontece?

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