Vinte

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"Eu prometo que um dia estarei do seu lado
Te protegerei, te manterei viva
No momento, está tudo muito louco
E eu não sei como parar ou ir mais devagar."

Never be alone – Shawn Mender

Olhei no relógio da sala, ao lado do vaso cheio de dentes de leão artificiais, os ponteiros beiravam as quatro horas da tarde. Já fazia meia hora que eu estava sentado no sofá olhando para o nada, tentando assimilar toda a bagunça em que a minha vida havia se tornado de repente.

— Você fez o que tinha que fazer, Cristiano repeti pela segunda vez em voz alta, na tentativa de me convencer de que eu havia feito o certo.

Meu coração estava sangrando e eu não sabia como estancá-lo.

— Só mais um dia e nada disso será lembrado mais falei, brincando com a minha aliança em meu dedo.

As lágrimas começaram a escorrer pelo o meu rosto e eu não me dei o trabalho de enxugá-las. Eu só queria que aquela dor que havia se instalado em meu peito desde o momento em que pedi a separação, passasse. Eu só queria não sentir mais nada.

Algum tempo depois, sem inspiração para continuar escrevendo a história da minha vida, enviei uma mensagem para o meu melhor amigo, informando a ele para aonde eu estava indo, troquei de roupa, coloquei algumas coisas em uma mochila e desci para o estacionamento onde a minha moto estava.

Olá, princesa. — falei para ela, como se ela fosse me responder. Passei a mão em seu tanque e a deslizei por toda a sua extensão. — Será que não vou mesmo mais me lembrar de você? – continuei a conversar com ela no silêncio da garagem no subsolo. — Quem será que serei após a cirurgia? Do que será que gostarei? Talvez de jogar tênis, o que acha?

Montei na moto e virei a chave no tanque.

O que farei com você depois que eu acordar? Eu sinto muito, eu não queria esquecer você. Eu não quero... — meu peito doía, como se houvesse uma bola sufocando-o e quando as primeiras lágrimas brotaram, me dei conta de que não era mais da moto que eu estava me referindo. Não era somente dela que eu não queria me esquecer, era da minha vida e principalmente, da minha esposa.

Mas eu iria.

*&*

Levei praticamente uma hora para estacionar a moto no estacionamento da praia de Pitangueiras, no Guarujá. Estava começando a escurecer, o manobrista me informou que fecharia às dezenove horas e, portanto, eu só tinha mais uma hora.

Eu havia saído de casa meio sem rumo, só queria pegar a estrada com a minha moto pela a última vez, sentir a sensação do vento sendo cortado por mim e por ela, deitar o meu corpo na curva e desafiar a lei da gravidade, acelerar como se fosse ser arremessado por um foguete em direção à Lua. Eu só queria uma última vez com ela...

Tranquei meus pertences na bolsa lateral da moto e atravessei a rua. O estacionamento era de frente para o mar. Embora estivesse começando a escurecer, a areia ainda estava bem movimenta, com pessoas passeando ao entardecer, outras jogando vôlei e outras apenas sentadas em suas cadeiras de praias coloridas.

Entrei no mar. Caminhei para o fundo e na primeira grande onda, mergulhei. Cinco. Dez. Quinze segundos depois, eu ainda estava debaixo d'água, sendo ora sugado e ora rejeitado pelo mar revolto. Quando já não aguentava mais ficar mergulhado, retornei para o raso, com a água na altura do meu peito e deixei que as lágrimas explodissem em meu rosto e misturassem com a água salgada do mar.

— Quanto tempo dura um amor? – lembrei-me da pergunta que Verônica me fez certa vez, os dois deitados em minha cama em meu quarto, quando ainda éramos namorados.

Todas as lembranças que não posso esquecerWhere stories live. Discover now