Chuva

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Doze

As gotas que batiam contra a janela resultavam em um barulho aconchegante. Influenciavam no sentimento de preguiça e no de ficar debaixo das cobertas o dia todo. Normalmente, o clima frio e úmido traz essa energia mais lenta a qual o corpo está usando todas as suas forças para te manter aquecido e menos desconfortável.

Era final de tarde, fazia meia hora que Lance havia chegado na casa de Keith, e os dois se encontravam no porão, um espaço que ambos decoraram e encheram de coisas como se fosse um esconderijo secreto que compartilhavam. Não era grande mas também não era pequeno, em melhores palavras, era uma espaço ideal para que dois puffes, uma TV e uma estante com jogos de tabuleiros, coubesse perfeitamente sem parecer amontoado. No teto, luzes de natal estavam penduradas desajeitadamente e espalhadas, brilhavam fracamente denunciando que as pilhas que alimentam a energia estavam em seus últimos suspiros.

Os garotos tinham juntado os puffes mais perto um do outro, de maneira que quando sentados, suas panturrilhas se encostavam. Cada um tinha seu próprio cobertor e dividiam entre si um balde de pipoca. Lance havia trago consigo um filme antigo, roubado de seu irmão mais velho, e clamou que os dois deveriam tomar cuidado porque com apenas um arranhão poderiam ser considerados mortos. Keith achava divertido as situações em que o outro os colocavam. Ele sabia que nenhum dos dois teria cuidado suficiente e que no final sempre escutavam os gritos da família do Lance.

Havia uma locadora de filmes perto da escola deles, a coisa mais fácil que poderiam fazer era alugar lá e evitar os gritos, broncas e castigos.

Porém Lance não era alguém que escolhia, com força de vontade, o caminho mais fácil.

E realmente, sua teimosia e dramaticidade eram a prova disso e às vezes poderia ser até irritante, mas eram essas características que faziam de Lance, Lance.

E por Keith, se isso significava ter sua amizade, estava tudo bem.

Os últimos meses não haviam sido os melhores, porém se Lance estivesse ao seu lado, ele sentia que poderia esquecer um pouco o que estava acontecendo. Seus pais andavam discutindo muito. Ele não entendia muito bem os motivos, no entanto tinha um ideia de qual seria o resultado final.

Ele deixou-se questionar o que era realmente o amor. Se esse talvez, fosse um sentimento eterno ou com data de validade. Qual seria então o valor do casamento? Afinal, o que o casamento é de verdade? Já não basta estar com a pessoa que você gosta? Por que declarar e prometer a eternidade sendo que possivelmente, aquelas seriam promessas que possuíam sombras de dúvidas já que não é possível saber o que está por vir pela frente? Você promete assistência, apoio, companhia e carinho, mas com o passar do tempo percebe que talvez esses não eram fatores alcançáveis e fáceis de oferecer. Logo, vem a cobrança, o desgaste e as discussões e o que antes parecia inquebrável começa a mostrar sua fragilidade.

Talvez, o casamento ou o que quer que seja, sejam para poucos. Talvez, essa promessa seja feita e mantida apenas por alguns. Mas mesmo assim, se tantas pessoas sabem desses fatores, por que insistem em casamento?

Porque pessoas apaixonadas acreditam que seu amor é inquebrável e duradouro. Porque as pessoas apaixonadas acreditam que tudo é fácil. Mas a realidade é que a vida na verdade não oferece somente pontos altos. E que cabe a como cada um de nós reagir às dificuldades que aparecem espalhadas por nossas linhas do tempo.

Os pais de Keith possuíam um problema, mas ambos não sabiam como lidar e o garoto não podia deixar de sentir-se impotente.

Lance não sabia de toda história. Sabia que os pais de Keith estavam com algum problema porque havia escutado seus pais comentarem sobre isso enquanto lavavam a louça quando achavam que estavam sozinhos. Seu amigo não havia lhe dito nada, e convenceu a si mesmo de que o problema não era consigo. Sabia que Keith confiava todas as coisas a ele.

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⏰ Last updated: Nov 19, 2021 ⏰

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