Capítulo 38

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Tommy chegou em casa completamente moído da tarde no hospital, e isso porque não havia acontecido nada de grave. Ele frequentemente pensava sobre os laços emocionais das famílias de um modo geral e da sua em particular, que deixavam a todos completamente histéricos ao menor sinal de desequilíbrio. Tudo bem que a notícia inicial era de que seu pai estava infartando, mas no final deviam ter umas quarenta pessoas naquela recepção, metade delas sem qualquer laço sanguíneo. Eram amizades muito importantes as que haviam se formado ao longo dos anos e que a sua geração herdara. O dia que tivesse um faniquito por tomar Viagra, queria uma confusão daquelas na recepção do hospital.

O estudante coreano estava assistindo à televisão e ele disse um "ei", não chegava nem a ser um "oi", enquanto passava para seu quarto queen size. Tirou os sapatos nos pouco centímetros disponíveis entre a entrada e a cama, fechou a porta e pescou o celular do bolso.

"O que você está fazendo?", pensou, encarando a tela agora vazia. O grupo da família, sempre silenciado, continuava na maior agitação, mas nada da sua paquera anônima. Ficou olhando o celular com tanta concentração que quase berrou quando ele tocou.

-Alô?

Um miado longo.

-O que aconteceu? A Millie está bem?

-T...tá.

-O que foi que aconteceu, loira?

-Vem pra cá - Agora ela uivou. Era o reino animal inteiro contido nos raros choros da sua melhor amiga.

Tommy calçou os sapatos correndo e disparou escada abaixo, ventando pelo estudante coreano sem lhe dar qualquer satisfação. Ia pedir um carro de aplicativo, mas concluiu que era mais rápido pegar um táxi e desembestou para Shoreditch. Quando chegou ao apartamento da Baby, ela chorava, rosto molhado, segurando um lenço, ao lado da Millie, também de rosto molhado, mas o nariz escorrendo.

-O que aconteceu? - Tommy pegou a menina no colo, preocupado. - Cadê o dodói, Millie?

-Não... não tem dodói. Ela está chorando por... porque eu tô chorando e ela é solidária.

-Então por que vocês estão chorando, caralho? - Tommy, inconscientemente, começou a embalar a Millie como se ela tivesse dois meses, e não dois anos, e a menina ficou mais histérica ainda.

-Ele alugou o apartamento! - Agora Baby ganiu.

-Quem alugou que apartamento?

-O Zach, seu burro! Hoje chegou um casal para morar no apartamento dele! Me cumprimentou todo feliz, como se cumprimenta... como se cumprimenta a vizinha novaaaa!

-Ai, merda. Vamos resolver seu problema, Millie? - Ele perguntou para o bebê, querendo resolver uma questão de cada vez. - Vamos fazer que nem a dinda dá solução para tudo desde sempre e resolver seu problema com comida? Vamos ver se tem biscoito na cozinha.

Ele a levou para lá e abriram armários, o que já foi bastante calmante, já que agora a menina não estava mais sozinha com uma adulta histérica. Tommy encontrou uns biscoitos de chocolate recheados e colocou leite no copinho da Millie. Eles levaram o lanche para a sala e Baby, sentada na poltrona, olhou a cena, enxugando os olhos com o lenço:

-Eu sou a pior mãe do mundo.

-É meio descompensada, mas tem umas mães muito mais merdas.

Tommy sentou-se no chão, as pernas cruzadas como chinês, e Millie se sentou sobre elas, segurando um biscoito de chocolate.

-Agora me conte – Ele disse: - Que viagem é essa?

O queixo da Baby tremeu, mas ela engoliu o choro e continuou, com a voz mais firme:

Quando a Vida AconteceWhere stories live. Discover now