Capítulo 1 - Laços Desajustados

253 10 11
                                    


— Você precisa se apressar.

— Eu sei. Espera um segundo.

Eren se apoiou no batente, observando a irmã caçula resmungar ao tentar fechar a própria mala. Estava em um dos beliches de cima, fazendo mais esforço do que seria necessário para alguém que não tinha tantos pertences. O restante do dormitório se encontrava vazio naquela parte da tarde, considerando que a maioria dos jovens ficavam no pátio no período da tarde, estudando ou ajudando nas tarefas domesticas.

— O que você colocou aí? — perguntou ele em tom de suspeita, franzido a testa.

Gabi parou de se mover com a pergunta. Ela não o encarou.

— O quê?

Sua risada soaria normal aos ouvidos de qualquer outra pessoa, mas Eren sabia melhor.

— O que você colocou aí? — repetiu ele.

— Nada.

Acontece que os irmãos Yeager não tinham pertences o suficiente para encher uma mala. Não mais; não depois do que aconteceu.

O mais velho se aproximou do beliche, erguendo o braço o suficiente para alcançar a mala e enfiar a mão dentro da mesma. Em meio ao que ele presumiu ser uns dois tênis e algumas roupas, era inconfundível a protuberância diferente e macia.

— Ei!

O garoto puxou o objeto de pano, ignorando os protestos. Ele encarou o que encontrou por tempo indeterminado, talvez tenha ficado mais tempo calado do que pretendia, porque a menor ficou incrivelmente quieta, coisa que era impossível para uma menina agitada como Gabi.

Era uma boneca de pano, com roupas azuis e cabelos claros. Eren percebeu a semelhança rapidamente: a boneca era praticamente indentica a uma antiga que Gabi possuia, se fosse desconsiderar a cor dos cabelos e roupas, dada por sua mãe em seu aniversário de sete anos. Sua irmã costumava correr pela casa com o brinquedo e não se desgrudava daquilo nem mesmo para dormir.

Ele hesitou antes de dizer, sentindo o estômago afundar:

— Você não pode levá-la.

Eren sabia que Gabi tinha total consciência do quão errado era pegar coisas que não lhe pertenciam, sempre fora uma garota inteligente. Ela assentiu e murmurou baixinho, como se estivesse apenas esperando que alguém a trouxesse de volta a realidade:

— É, eu sei.

O jovem queria ser capaz de dizer algo reconfortante, queria ser capaz de ser um irmão melhor naquele momento. Queria desesperadamente. Mas as palavras encorajadoras acabaram há meses e ele suspeitava que a caçula não acreditaria em mais nenhuma bobagem.

Ele fechou a mala dela, observando-a pular do beliche para o chão, então deixou a boneca perto da porta enquanto saíam, onde alguém certamente a encontraria.

Ambos seguiram pela escadaria que levava a sala e o mais velho pegou a propria mala, avistando uma das coordenadoras do abrigo parada perto da grande porta de madeira já aberta.

— O carro já chegou — avisou ela. — Espero que estejam cientes de que, apesar dessa situação ser incomum, as regras ainda devem ser seguidas ao pé da letra e qualquer detalhe prejudicial será escrito no relatório. Não se esqueçam que isso não é uma adoção formal. Vocês sabem do resto, certo?

Yeager se obrigou a não revirar os olhos com tais palavras. Tudo aquilo estava claro para eles, mas a mulher fazia sempre questão de lembra-los. Se fosse quaisquer outros órfãs buscando por aprovação e família, seus comentários certamente fariam um estrago emocional.

o paraíso dos quebrados | eremikaWhere stories live. Discover now