Capítulo 43. Ruminação

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Ergui uma sobrancelha.

– Mas os culpados não foram os Áulicos?

– Eu não tenho mais certeza... Existem tantos segredos e mentiras...

– Por isso que você achou que eu a tinha assassinado? – Ela confirmou com a cabeça devagar.

– E ainda não sabemos se isso é verdade mesmo ou não...

Encarei-a nas profundezas dos olhos.

– Quer descobrir?

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Naquela noite caminhamos por Venerna com a missão de descobrir o verdadeiro responsável pela morte da mãe de Doxy; e quem estivera na outra ponta do meu disparo. Fomos até um dos cômodos escavados da pedra, um tipo de armazenamento para tralhas que a rebelião não julgava importante, e encontramos a máquina que estávamos procurando: aquela que se conectava a cérebros com fios e agulhas para ler suas mais secretas memórias. Nos armamos até os dentes e adentramos silenciosos na escuridão do quarto daquele ser que procurávamos...

Mas a sua cama estava vazia.

– Eu consigo sentir o cheiro de sangue humano e armas a quilômetros... Vocês não acharam mesmo que me pegariam desprevenido, não é? – Korrok sibilou, emergindo da escuridão do ambiente com o poder da sua estatura.

– Não viemos machucá-lo. – Avisei.

– Fale por você. – Mas Doxy rosnou, os olhos cravados no vorrampe e sua arma apontada para a cabeça dele. Como eu iria impedir que eles se matassem? Aquilo estava começando a parecer uma péssima ideia... – Eu quero respostas. E não me importo de usar força para consegui-las.

– E não teremos de usá-la se você responder as nossas perguntas, Korrok. – Falei para as presas no rosto do vorrampe, me segurando para não ter de levantar a minha arma.

Ele se sentou em uma cadeira e sibilou, abrindo um sorriso que me confirmava o quanto aquilo era uma péssima ideia:

– Perguntem então... Não guardo segredos dos meus amigos.

– Eu me certificarei disso. – Doxy ergueu o leitor de memórias, ruindo o sorriso de Korrok. Qualquer mentira que ele estava planejando nos contar, sabia que já não podia mais. Seu corpo se contorceu desconfortável na cadeira quando Doxy se aproximou, e eu segurei minha arma com mais força, caso ele tentasse algo contra ela. – Você mandou que matassem a minha mãe?!

– Não.

– Se estiver mentindo, nós vamos descobrir. – Relembrei-o. – E então eu não vou conseguir impedi-la de matá-lo.

– Gaxy era útil. – Korrok continuou, ênfase em cada palavra. – Eu sugeri ao metriona que a contaminasse, que a desse a sugestão de se unir a nós, mas ele tinha outros planos...

– Então o metriona a matou?

– Eu nunca vi o corpo, mas ele disse que Gaxy estava morta; e ela desapareceu do Império... Então é nisso que eu acredito.

Tinha sido metriona... Não Korrok... Não eu...

Mas não mudava o que eu tinha feito.

– Quem eu matei então, Korrok? – Perguntei, odiando toda a dor que saiu na minha voz. Korrok me enviou um olhar que me feria por ser muito mais compreensivo do que eu esperava; e merecia.

– O secretário de Gaxy. Para enviá-la uma mensagem.

Uma mensagem...

Suspirei. Nenhum peso tinha sido arrancado dos meus ombros, nenhum perdão para ser encontrado a quilômetros, nada que justificasse as minhas ações e redimisse meus erros... Saber ou não saber aquela resposta não tivera nenhuma influência no meu passado; e nem em como eu me sentia diante dele.

Uma mensagem...

A pior escolha que eu tinha tomado na minha vida, uma culpa eterna, o maior de todos aqueles pesos que curvavam os meus ombros... Apenas para que fosse enviada a mensagem de que coisas piores estavam por vir.

Eu captei bem aquela mensagem.

– Ele era inocente? – Sussurrei, caindo os olhos naquelas malditas mãos que eu carregava. Korrok me estudou, provavelmente sentindo aquele cheiro de tragédia que sempre indicava que eu tinha chegado no ambiente; eu era uma lembrança de que a morte estava perto e de que ela era fácil demais de alcançar, de todas as vezes em passou por mim e se impregnou na minha pele.

– Ninguém é em tempos de guerra.

Doxy perfurou a nuca do vorrampe com a agulha da máquina e se preparou para ligar-se à outra ponta. Mas então Korrok agarrou seu braço com força, e eu o coloquei na mira da minha arma.

– Arranque de mim a memória dessa conversa, se não quiser que o metriona a descubra depois. Porque se ele souber, vai nos mostrar que existem coisas muito piores do que a morte.

Doxy confirmou com a cabeça devagar e calou Korrok ao voar para dentro da sua mente, se contorcendo cada vez mais que se deparava com aquelas lembranças do vorrampe. Assim que pode, Doxy se desprendeu dele e escondeu o leitor no bolso.

– Era tudo verdade. – Ela sussurrou para mim com os olhos cheios de lágrimas.

Doxy então correu e desapareceu pela cidade subterrânea, me abandonando com um vorrampe confuso e irritado e os pesos amarrados nos meus tornozelos que me puxavam cada vez mais para as profundezas dentro de mim...

Eu estava me afogando...

Eu estivera sempre me afogando.

Endossimbiose | Versão Em PortuguêsWhere stories live. Discover now