Capítulo 41. Cicatrização

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Voltei cambaleando para o leito e encarei o cadáver daquele pione como se fosse o meu próprio...

Mas então ele abriu os olhos.

Tropecei para trás e caí no sangue acumulado ao chão da tenda, incapaz de acreditar na visão da criatura tentando mais uma vez se libertar das suas amarras.

O soldado tinha voltado à vida!

Mas... Algo estava diferente...

Me aproximei devagar, estudando-o. Seus olhos tinham se tornado desérticos, como se ninguém estivesse atrás deles... Ou como se quem controlasse seus movimentos não estivesse ali, mas escondido atrás de um vazio estrangeiro cheio de incontáveis anos luz de distância. Parecia que um ser tinha vestido a pele daquele soldado aprisionado e agora me observava com um olhar que não se encaixava em lugar nenhum dessa galáxia... Uma aberração, um monstro, um erro...

– Quem é você? – Sussurrei, sem forças.

E, quando a criatura abriu a boca, a voz que saiu não era sua:

– Eles me chamam de Rainha... – Eu a tinha encontrado... Não uma metáfora, não uma ilusão, mas uma entidade. – Mas meu reinado acaba onde as mentes se limitam... – Arrepios se espalharam por todo o meu corpo. – E, mesmo sem terras ou fortunas, eles me veem como aquela que veneram quando precisam de alguém para seguir... Mentes fracas as que tomei, pelo visto.

Engoli em seco, tentando encontrar em algum lugar a coragem para dizer:

– Mas você não tomou a mente desse soldado... Apenas o corpo. – Murmurei. – Não há nada que reste para chamá-la de Rainha... – Uma marionete perfeita, uma casca vazia, incapaz de venerar ou discordar... Assim como os soldados contaminados de Venerna que se vestiam de branco, perfeitamente eficientes em cada movimento que faziam e simplesmente incapazes de falhar.

Eles iam até a morte... E voltavam mais fortes.

Não... Eles não voltavam de verdade.

Porque suas mentes estavam mortas.

Tudo que retornava eram os movimentos dos seus corpos, decididos por um ser escondido nas profundezas desse universo para que fossem tão perfeitos quanto o metriona queria e precisava para vencer aquela guerra. Era tão claro agora...

Por isso eles marcavam os soldados mais fracos.

Por isso eles precisavam do meu sangue especificamente.

Por isso alguns dos seus soldados – aqueles que já não eram mais controlados pelos próprios desejos – eram tão brutais e eficientes.

Eu era a arma da rebelião também.

– Mas o que você quer? – Rosnei. Eu conseguia entender por que os rebeldes queriam o controle do Império, mas os motivos dos pacifistas continuavam um mistério para mim. Eles eram capazes de tomar mentes, exércitos e construir palácios de aurium puro... O que a Rainha por trás deles poderia querer mais? – O que você ganha com toda essa guerra e destruição?

– Eu sei que isso parece crueldade, mas eu estou apenas os poupando do que mais virá... – A criatura sibilou. – Como você mesma disse... Essa é apenas a face feia da misericórdia, minha querida, mas continua sendo a única salvação.

Ela estivera me assistindo... Cada palavra, cada passo, nada em mim para esconder... Uma criatura responsável por tudo de errado que caíra sobre esse Império; e que em cada carta minha mãe tinha me implorado para destruir.

No meio de todos aqueles pensamentos, eu acabei perdendo a minha cabeça. Me inclinei sobre a criatura, mais perto do que devia, e rosnei:

– Olhe bem, que esse rosto vai ser o último que você verá. – Tranquei a mandíbula. – Eu estou indo até você, minha Rainha... E eu não vou ter misericórdia.

Endossimbiose | Versão Em PortuguêsWhere stories live. Discover now