Capítulo 33. Mãos

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- Você não queria recrutar a Terra de verdade, não é? - Murmurei para Korrok, cambaleando dolorida na sua direção.

Ele me observou de canto de olho.

- Para serem bons soldados nessa guerra, os humanos precisam de muitos aprimoramentos. - Ele alfinetou os meus; incluindo aquele novo que tinha me salvado dos seres de rocha. - E, no momento, nós precisamos de soldados prontos...

- E também não queriam que os Áulicos os tivessem.

Ele fez uma careta que confessava que eu estava certa, mas Korrok nunca me daria a satisfação de dizer aquilo em voz alta. E eu abri meu sorriso pendente.

Conquistar a Terra não fazia sentido para a rebelião - já que era um mundo novo demais para se envolver em uma guerra como aquela -, mas o Aulicado, que começava a perder planetas inteiros para a rebelião, precisava conquistar qualquer mundo que pudesse; e eu atrasei seu progresso.

- Você poderia ter me matado lá. - Resmunguei, assumindo que aquela não tinha sido a sua intenção.

- Eu sei que vocês são frágeis, sapiens. Vocês que parecem se esquecer disso às vezes.

Ergui as mãos em rendição. Eu precisava ser mais cuidadosa, realmente; principalmente com aquelas criaturas que precisavam parecer poderosas diante das demais para girar as engrenagens da rebelião.

- Você está na revolução agora, Donecea Gaxy. - Korrok rosnou, despertando calafrios no meu corpo. - Cuidado com as suas escolhas.

- Nós queremos o mesmo fim.

Ele abriu um sorriso torto, cheio daqueles seus dentes afiados.

- Mas eu duvido dos meios... E um deles pode te matar.

Assim, o vorrampe se virou, me deixando sozinha com a minha garganta seca e a certeza de eu estava me tornando muito boa em fazer escolhas ruins.

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Quando caminhei de volta para o aposento das columbas minhas pernas estavam fracas. Eu avancei devagar, me encostando às paredes, até que senti uma ânsia se revirar do meu âmago à garganta. Toda aquela adrenalina tinha sido demais para o meu sistema. E, sem que eu tivesse forças para escapar, fui puxada para um corredor escuro na pedra.

Pisquei, ajustando minha visão ao escuro e, com as costas na parede, senti o ardor do líquido violeta começar a migrar pelos meus antebraços... Prestes a paralisar os músculos daquele que me tinha me puxado com as mãos para a escuridão. Mas então parei. Porque eram mãos como as minhas, o toque suave me arranhando com os calos, quente como os sóis apenas podiam sonhar ser, e onde eu me sentia tão assustadoramente protegida.

O violeta se dissolveu dentro de mim e eu me dissolvi nos braços de Kadi.

- Você fugiu com todo mundo no final? - Brinquei.

- Depois do quão irritado você deixou Korrok, era o mais sábio a se fazer. - Ele riu, deslizando as mãos pela minha cintura e os lábios soprando as palavras ao meu ouvido, tão perto que eu quase sentia a língua raspar o arco da minha orelha: - Você foi simplesmente incrível... Mas como fez aquilo? - Kadi se afastou, me mostrando aquele sorriso que brilhava no escuro, enquanto ele se deliciava com o desafio que eu era. - Eu não a vi pegar um dos aprimoramentos do anfitrião.

- Eu não queria que eles vissem também.

Antes de queimar os aprimoramentos na fornalha de um sol eu me deparei com uma marca vermelha no meu braço, delimitando os dedos do homem que me segurou enquanto seus guardas agrediam Kadi... E eu nunca me senti tão fraca. Por mais que aqueles aprimoramentos não mudassem o que eu era aos olhos do Império, neles havia uma migalha de poder que eu podia conquistar: a capacidade de tirar a força daqueles que a usavam contra mim. Então, antes de poupar a Terra daquela guerra, eu deixei aqueles finos fios brancos se ancorarem entre meus músculos e me tornei um soldado dela.

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