Capítulo 33. Mãos

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Quando abri devagar meus olhos, os seres rochosos estavam caídos... Aos meus pés.

Um líquido violeta penetrava pelas brechas de suas carapaças, paralisando seus músculos, contorcendo-os, sufocando-os... E a mesma cor manchava as minhas palmas com um brilho radioativo, tão mais poderosa do que meu corpo por inteiro jamais seria. Aquela era a cor de algo que não se encontrava na natureza, porque o universo nunca ousaria criar algo tão distorcido, a cor de algo que não se deve desafiar, de corrupção, de mistério, de ardil... Era a cor de poder.

Todos os olhares ao redor estavam em mim, tão assustados quanto os meus, até que a minha atenção caiu em Korrok, fumegante. Ele explodiu em um rugido e avançou na minha direção como a queda de um raio para a fragilidade do chão e eu senti em mim aquela energia queimando no âmago de que precisava para fugir. Corri e escorreguei pelo piso, desviando do seu ataque antes que suas garras rasgassem a minha garganta. Minha palma manchada conseguiu tocar uma das suas pernas e eu rolei pelo chão para longe, me encolhendo diante da fera. Korrok grunhiu para o membro pintado com aquele violeta sobrenatural e, quando tentou dar um passo novamente na minha direção, sua perna falhou, tão imobilizada quanto o que os seres rochosos; e então o vorrampe desabou ao chão.

Eu me ergui devagar, cercada por seres que se afastavam a cada movimento meu como se eu fosse um frasco de veneno prestes a transbordar.

Eles estavam com medo de mim...

Eles achavam que eu era uma criatura perigosa...

E talvez eu pudesse ser.

Feras podiam ter dentes, garras e músculos, mas, ainda assim, elas sucumbiam ao veneno de uma serpente.

Me voltei para Korrok e me aproximei com passos que não foram tão cautelosos quanto provavelmente deveriam ter sido. Me abaixei para ficar à sua altura, erguendo minhas asas de cera ao sol e desafiando o vermelho furioso em seus olhos que ansiava pelo meu sangue.

- Você deveria respeitar mais o metriona, Korrok. Ele tem a lealdade dos seus novos soldados, afinal... - Avisei com uma delicadeza que contrastava com o meu violeta gotejando e eu cerrei os punhos, tentando esconder os dedos trêmulos. - Ele me quer na revolução... Então eu não vou a lugar nenhum.

Korrok soltou uma risada amarga e eu jurei ver uma espécie de respeito nos seus olhos - mas eu não tinha certeza se saberia reconhecê-lo. Antes que eu abrisse o sorriso que ia, as garras do vorrampe agarraram o meu pescoço e ele me lançou de costas contra o chão em um baque sólido que fez todo o ar sair dos meus pulmões e tremeu o mundo inteiro ao redor. Korrok apertou a minha garganta com força, enquanto eu arfava e me debatia em uma tentativa inútil de me desvencilhar, apenas para me saborear perder. O vermelho dos seus olhos pintou a minha visão e eu senti as pontas afiadas de suas garras ameaçando atravessar a pele, enquanto meu corpo se esmagava sobre as asas derretidas que me um dia me levaram alto demais.

- Logo você vai aprender que essa não é a vitória, sapiens... - Ele rosnou, cuspindo as palavras ao meu rosto. E então finalmente soltou o meu pescoço. - Viu só, pombinha? - Korrok rugiu para Plumala, tão assustada na plateia quanto os demais seres. - Essa coisinha ataca como uma serpente. Estava só faltando o veneno para ser uma. - Ele soltou uma risada rasgada, assim como aquele seu terceiro olho que um dia eu tinha destruído. - Eu disse que os humanos eram os piores.

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Lentamente a força retornou ao meu corpo trêmulo, enquanto Korrok mandava os seres de Venerna de volta para as suas funções, porque o espetáculo tinha acabado. Me levantei devagar, limpando as palmas nas pedras.

Endossimbiose | Versão Em PortuguêsOù les histoires vivent. Découvrez maintenant