Capítulo 20. Endorfina

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– Já o levando para aventuras espaciais? – A criatura perguntou com um sorriso torto, em uma língua que eu desconhecia na época. Suas palavras apareceram traduzidas para mim na tela de um aparelho que meu pai tinha me entregado antes e, apenas assim, consegui acompanhar a conversa.

– Se ele for esperto, vai seguir os passos da mãe e ficar na Terra. Mas, se ele for corajoso, vai seguir os meus.

Meu pai me encarou com uma espécie de orgulho que eu não merecia.

– E se ele for esperto e corajoso... – A criatura se abaixou, ficando à minha altura como se para me devorar; e em sua garganta eu caí muitas vezes nos meus piores pesadelos. – Talvez eu até o deixei trabalhar comigo em algum momento...

Com uma risada meu pai pousou a mão no ombro pontudo da criatura, um gesto que eu o vira fazer incontáveis vezes com seus amigos na Terra, mas que nunca antes parecera tão poderoso quanto naquele momento.

– Só os que perdem tudo se juntam à sua causa, Korrok... E, se depender de mim, ele nunca vai precisar de você. – Mas não dependia...

Doxy abriu a boca, mas, antes que pudesse falar algo, uma música distante alcançou nossos ouvidos, me salvando de revelar mais do que eu devia.

Rapidamente me levantei e ofereci a mão para ajudá-la a se levantar. Ela aceitou meus dedos e, com um sorriso animado, me puxou para a música.

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A música parecia ser feita de euforia pura, entrando por nossos poros com um calor convidativo. Ela nos atraiu para uma aglomeração ao redor de uma esfera quente de luz que flutuava a alguns centímetros do chão. Centenas de seres cobertos com a mesma areia reluzente a orbitavam, se movendo de formas que talvez pudéssemos chamar de dança, mas que eu não tinha tanta certeza.

O sorriso de Doxy brilhava mais do que a fogueira... E, quanto mais a música nos envolvia, mais ela se rendia, entregando seu corpo para algum deus da dança que a estivesse cobiçando dos céus naquele momento. Ela se movia como as marés diante das fazes da lua, as curvas do corpo ondulando como montanhas no horizonte que se erguiam e erodiam na superfície de um mundo com o passar eras. Gotas de suor brotavam da sua pele e escorriam pelos vales de seu corpo, enquanto as mãos penetravam pelas grossas camadas de seus cabelos e os jogavam para os lados em uma nuvem escura que me engolia. Seus olhos se fecharam para saborear um prazer que a visão não captaria... Enquanto eu mantive os meus bem abertos.

– Nós nascemos para morrer! – Doxy riu. – Então vamos nos divertir enquanto podemos! – Quando seus dedos me tocaram, eu escorreguei para a música.

Eu não sabia se era culpa da noite ou das estrelas acima, mas quando Doxy me puxou para perto, eu vi algo em seus olhos de que não consegui escapar. Seus movimentos me tocavam, vezes um lampejo de seus cabelos, vezes um braço, vezes o quadril, diante de mim, contra mim, atritando, me rasgando, tão próxima que eu conseguia sentir seu cheiro... E eu me perguntava se o gosto era o mesmo. Ela não estava dançando para mim, apenas um intruso no seu universo, mas seus movimentos prendiam meus olhos em uma mensagem que eu estava implorando, quase de joelhos, que não tivesse entendido errado. O mundo inteiro era o nosso palco, e não havia nada nele além da nossa euforia, destilada, inebriante, nos queimando de dentro para fora como se eu fosse o fósforo e ela a caixa, e a fricção em cada ponto que sua pele tocava a minha soltando a faísca.

Eu estava prestes a puxá-la para os meus braços, quando seus olhos se assustaram com algo que viu atrás de mim... E então o momento tinha escapado.

Me virei e vi o mesmo que ela: um ser de pele azul royal e um imenso ferrão às costas se divertindo ao longe. Era um pione; uma criatura perigosa que acumulavam veneno para torturar suas presas com mortes muito, muito lentas. Mas Doxy não tinha se assustado apenas porque ele era uma fera perigosa, mas porque aquele pione em particular tinha vestes negras enfeitadas com diversos broches e condecorações que apenas um dos Áulicos poderia ter.

– O que ele está fazendo aqui?

– Essa não é a pergunta, Kadi. – Doxy sussurrou, atraindo meu olhar. – A pergunta é: o que nós estamos fazendo aqui?

Infelizmente eu sabia a resposta para aquela pergunta.

Tirei do bolso um frasco cheio de pó branco que tinha encontrado no saco de pedras estelares que Korrok me entregou como pagamento. Quando estávamos na Hasta, eu o questionei sobre aquilo, ao que ele apenas respondeu:

– Você vai saber quando for a hora de usar. – E acho que era o momento.

A parada naquele mundo não tinha sido para nos "relaxar", mas para fazer mais um trabalho da rebelião. Quando os olhos de Doxy caíram no frasco, toda a alegria foi drenada de sua expressão petrificada em amargor.

– Você vai envenená-lo? – Ela perguntou. Eu não sabia se era isso que o pó faria, mas era uma hipótese possível.

– Eu não tenho escolha... – Sussurrei. – É uma missão da rebelião. Se eu não fizer, eles vão nos caçar até os confins do universo. – E eu não queria pensar no que aconteceria se eu não tivesse a ajuda deles...

Sem ouvir o que ela pudesse dizer para me convencer do contrário, virei as costas e caminhei para o Áulico. Ele parecia não ter nenhuma sombra de malícia e não pareceu fazer sentido arriscar o ódio de Doxy para destrui-lo... Mas então o brilho das suas medalhas me alcançou e eu percebi quantas guerras ele tinha vencido em nome do Império para tê-las, contra qualquer pequena insurreição que surgira pelos mundos de Ítopis sem a piedade de buscar entendê-las antes de esmagá-las.

Talvez ele apenas estivesse cumprindo a sua função...

Mas eu também estava.

Prendi a respiração e, me espreitando pela multidão, joguei o pó em uma nuvem pálida à frente de seu rosto, sem ficar para ver o resultado.

Endossimbiose | Versão Em PortuguêsTempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang