Capítulo 13. Hemorragia

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Corri aos tropeços pela escuridão em direção a uma luz distante, a única coisa que me dava a esperança de uma saída.

Então o piso desapareceu abaixo dos meus pés e eu escorreguei em uma rampa para um vazio negro abaixo, até que percebi que ele estava tomado por um ligo grosso, se aproximando conforme a gravidade me puxava para ele. E, quando despenquei, mergulhei no rio escarlate em um batismo violento.

Bem-vinda ao Império.

Fui envolvida pelo abraço da escuridão, minhas pupilas se afogando no rubi. Tentei nadar de volta para a superfície, mas eu não sabia onde ela estava. Dor explodia no meu tornozelo a cada movimento, minha pele impregnada com a essência da morte estava cada vez mais pesada e meus pulmões começaram a queimar até que não consegui mais soltar o ar e deixei bolhas vermelhas escaparem de mim em uma trilha para a superfície. Avancei para cima, grunhindo e tentando não deixar entrar aquele sangue alheio em mim, ao ponto de que achei que fosse impossível sobreviver àquela distância... Mas então quebrei a camada rubra, arfando enquanto trilhas gosmentas me escorriam às frente dos olhos.

Me lembrei então que, agora que eu estava na superfície, estava à mostra. Olhei de volta para o topo da rampa de onde eu tinha caído, mas não havia vorrampes lá como eu tinha imaginado. Talvez eles tivessem achado que eu tinha me afogado... Já tinham esperado menos de mim.

Nadei para uma margem e cravei as unhas nela, me arrastando para fora do rio. Deitei-me, sem fôlego, e me entreguei à dor pulsante no meu tornozelo, contaminado com sangue de outras espécies. Eu precisava cuidar dele imediatamente, ou sabe lá que infecção interestelar eu pegaria.

Na parede do galpão uma comprida escada vertical levava para uma porta rodeada por luz. Cambaleei para ela e, como uma mariposa atraída pela luz, subi pelas barras metálicas com dor a cada toque da perna ferida e os braços queimando, até alcançá-la e desabar no chão do lado de fora abaixo de um oceano de luz solar.

Quando me ergui, pingando vermelho destilado em um beco entre os galpões do complexo rebelde, meus olhos se depararam com os de Arkadi, voltando com uma motocicleta estranha, a mão envolvendo o abdome e o rosto se contorcendo a cada passo.

Ele me encarou, uma criatura rubra demais para passar despercebida e cambaleou na minha direção.

– Como... – Ele murmurou.

– Estou aprendendo a improvisar... – Dei de ombros e cambaleei na direção dele. – Vamos sair daqui.

– A motocicleta está descarregada... – Korrok provavelmente a tinha carregado apenas o suficiente para o que ele queria que Arkadi fizesse. – E, se formos andando de volta para a nave, eles vão sentir nosso cheiro... – Então percebi a mancha rubra em seu abdome, parcialmente escondida atrás do braço como se ele estivesse segurando o mundo dentro de si, um deslize antes de despejar todos os seus erros pelo chão.

Coloquei a mão no bolso e ergui para os seus olhos um dos cartuchos que eu tinha conseguido roubar, abrindo um sorriso em nossos rostos.

– Gosto mais de você improvisando.

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– O que você fez pelos rebeldes? – Indaguei para Arkadi, tropeçando enquanto ele corria até o painel de controle da nave para nos tirar dali.

Das alturas, as construções daquele centro urbano pareciam cubinhos brancos, como dados que caiam sempre no azar. Eles rodeavam a imponência sólida e inconfundível do palácio, com suas torres rubis refletindo a luz solar como joias incrustradas no solo... O único local desse mundo onde ainda restava fartura.

– Eu envenenei o reservatório de sangue do palácio... – Ele sussurrou, sem me encarar.

Voltei meus olhos para onde os seus estavam, além da janela, onde a maior torre do palácio se estendia ao brilho do sol com aquele segredo.

E então a torre explodiu em um milhão de pedaços de pedra.

Os destroços voaram e colapsaram a muralha que protegia o palácio, transbordando o sangue armazenado pelas ruas da cidade em um caos rubro.

O Império estava sangrando.

Os soldados da rebelião surgiram das sombras e avançaram para o rasgo na muralha do palácio, destruindo a tudo que viam relacionado ao Aulicado. O brilho das suas lâminas e projéteis alcançaram de longe os nossos olhos, em um exército tão gigantesco que se estendia quase além dos limites da cidade, marchando sobre os escombros sangrentos do poder que um dia governara aquele mundo...

Mas não mais.

Aquele ataque tinha sido planejado... Desde Arkadi.

– Não era veneno... – Ele rosnou. – Era uma bomba.

Arkadi se voltou para mim, as chamas do caos abaixo brilhando em seus olhos; traídos, confusos, furiosos, e eu me perguntava qual batalha era pior: aquela na superfície do Distrito de Sangue ou nas profundezas da sua mente.

– Você quer consertar isso, não quer?! A guerra?! – Ele rugiu. – Por isso quer ir para o núcleo da galáxia?!

– Sim...

Sua cabeça confirmou com um peso maior do que tinha e então os lábios, secos e determinados, se contorceram nas palavras:

– Você não é mais a única.

Endossimbiose | Versão Em PortuguêsWhere stories live. Discover now