Capítulo 4

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Sentada sobre o balcão da cozinha eu me deliciava com um pedaço de pizza quentinha. Minhas pernas balançavam como as de uma criança contente, enquanto eu olhava pro nada e apenas esperava.

Uma moça loira passa rapidamente pela porta, me olhando envergonhada e completamente corada. Ao ver ela lanço um sorriso simpático, tentando não transparecer meus reais pensamentos, para que a mulher não fique ainda mais constrangida.

A quase duas horas eu estava ouvindo aqueles ruídos vindo do quarto do Mylles. Cama batendo contra a parede e gemidos abafados. Confesso aqui, que sim, aquilo estava brincando com a minha imaginação, e eu não ia continuar me torturando daquela forma. Então tudo que eu fiz foi pedir uma pizza e colocar no canal adulto enquanto assistia alguns romances eróticos, tentando ignorar por completo o que estava acontecendo no andar de cima.

—  Não se preocupe, eu não ouvi nada. —   Digo tentando confortar a menina, e arregalo os olhos ao perceber que havia piorado bruscamente a situação. —  Quero dizer... quer pizza?

—  Melhor não... — Diz tímida. —  Matt odeia quando eu enrolo para ir embora.

—  E quem liga pro que o Mylles pensa? —  indago olhando a mulher que me lança um olhar vívido de "eu ligo"  —  Quer dizer, o que ele pode fazer se você se sentar e comer pizza comigo?

—  Me expulsar... ele já fez isso outras vezes. —  A garota diz depois de um longo suspiro.

—  Expulsar? Ele não tem esse direito. Ele não é babaca a esse ponto. —  Me nego a acreditar.

—  Na verdade, a culpa não é dele. Sempre deixa claro que é tudo uma transa e que eu sempre devo ir embora assim que acaba. Mas às vezes eu me iludo pensando que vai ser diferente. Isso irrita ele um pouco. — Responde rapidamente cabisbaixa. A mulher não estava nos seus melhores estados. Deduzo isso ao notar que ela estava se lamentando e desabafando com uma pessoa que acabara de conhecer.

—  "Irritado" —  Repito ríspida, descendo do balcão. —  Não deveria deixar ele te tratar dessa maneira. Não deveria deixar ninguém te tratar dessa maneira.

—  Eu sei... mas é inevitável —  Afirma a linda moça, me olhando daquela forma.

—  Gata, você precisa de uma terapia. —  Brinco, e a moça de põe a gargalhar. Mas a tensão se espalhou por todo o ambiente quando a silhueta de Mylles aparece como mágica pela porta. A mulher fica séria, quando repara o olhar quase que furioso dele sobre ela. O rapaz não diz nada, apenas vai até à geladeira e pega uma garrafa de água. Ela suspira, me olhando daquela maneira outra vez.

—  Acho melhor eu ir... —  Diz, desviando seu olhar para mim.

—  Tudo bem então... foi um prazer te conhecer! —  Afirmo dando tapinhas no ombro da garota que sorri gentil.

—  Tchau, Matt! — Ela diz, claramente buscando de forma exagerada uma aprovação do rapaz.

—  Tchau! — Responde seco, sem ao menos olhar para a mulher, que me fita pela última vez, se retirando ligeiramente do cômodo logo depois. Balanço a cabeça em negação por uns segundos.

—  Como pode ser tão cretino?  —  Indago, o olhando que se vira por um instante para me escarar. Seus cabelos bagunçados, seus olhos frios, seu peitoral tatuado desprovido de blusa.

—  Não se meta, Williams. Você não sabe de nada. — Rebate seco, ainda me olhando de longe.

—  Sei que você ta fudendo com o psicológico dessa pobre garota! —  Respondo rapidamente. O homem abre um sorriso sarcástico.

—  Você não me conhece, pequena... ainda não viu nada! —  Diz com fúria

—  Bom... depois das incríveis demonstrações anteriores, eu prefiro continuar não conhecendo. —  Resmungo, e o rosto dele se fecha, revelando uma carranca brutal.

— E você se acha tão superior a mim, com essa vidinha perfeita não é, Williams? Você não é melhor que eu apenas por ter uma moral mais assertiva! — Diz, aumentando o tom de voz e se aproximando.

—  Vida perfeita? Você não me conhece, Mylles. Acha que só você teve um passado cruel? — Rebato no mesmo tom. Sentindo o homem chegar cada vez mais perto de mim.

—  Mas continua me olhando dessa forma tão tosca... me julgando como todo mundo faz! Eu nunca menti pra nenhuma delas sobre minhas verdadeiras intenções! Eu prefiro mil vezes as deixar afastadas, do que correr o risco que elas conheçam meu lado violento.

—  Você não é o monstro que acredita ser, matt! —  O chamo pela primeira vez pelo primeiro nome. Fazendo o homem me encarar menos raivoso. —  Não acredite no que eles querem que você acredite. Você pode provar que não é como eles pensam.

—  Que idiotice! — Gargalha. — Aqui está você de novo fingindo se importar, quando apenas sob a superfície, está convencida de que é melhor que eu — Seus olhos me queimavam num olhar furioso e intenso, enquanto ele pronunciava as palavras baixo. Mais perto de mim do que deveria estar.

—  Ouve o que esta dizendo, Mylles... você acredita ser o vilão, mas eu sei que não é! Debaixo de toda essa angustia e raiva é um coração humano batendo. —  O sorriso do homem some por um instante. Ele me olha comovido, me olha como nunca me olhara antes. Mas seu sorriso petulante renasce de forma ainda mais brutal.

—  Oh meu deus! —  Ele gargalha —  Você se acha uma heroína. Acha que está me salvando? — Ainda gargalhava de forma sombria. — Você não liga para os monstros, pequena. Quer apenas inflar seu ego acreditando que está fazendo algo realmente bom.

—  Eu sei que está cheteado, eu sei que eles te fizeram mal... mas acredita em mim, isso não vai parar a dor por muito tempo! —  Balbuciei analisando seu rosto. Ele estava tão próximo, que podia sentir sua respiração eufórica tocar meu rosto. O homem fecha os olhos, e suspira por um instante. Assim que abre os abre, me encara fixamente, dessa vez com um semblante mais calmo. Ele da um passo a frente, com o intuito de se aproximar ainda mais de mim. Mas recua logo depois. Respirando fundo.

—  Às vezes as coisas não saem como planejado, Williams —  Diz baixo e rouco, ainda me penetrando com aquele olhar intenso. Antes de se virar e sair pela mesma porta que entrara anteriormente. Aquela última frase martelava minha mente, quase que me fazendo surtar. Eu não conseguia entender o que ele quis dizer com "Às vezes as coisas não saem como planejado" e muito menos conseguia assimilar aquilo a algo que algum de nós havíamos dito. Suspiro fundo, me dando por vencida e me obrigando a esquecer aquilo.

Matt Mylles, minha deplorável perdição (Concluído)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora