Capítulo 1

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A voz suave do David Bowie soava por todos os cantos daquele quarto. Aquela linda canção fazia todo meu corpo amolecer sempre que a música deslumbrativa e magnifica tocavam meus ouvidos.

Eu cantarolava suavemente a canção, enquanto pincelava com toda delicadeza que eu conseguia aquele quadro que, a essa altura, já não se encontrava mais branco.

Três fracas batidas na porta me tiram imediatamente do transe que eu me encontrava anteriormente. Olho em direção a porta murmurando um "pode entrar" e então, ela se abre.

- Oi! - Derick diz, ao aparecer na porta. - ocupada?

- Não... - Digo molhando o pincel numa água escura que se encontrava num copo em cima da bancada - Quer algo?

- Ele está chegando, o Irmão do Henry. Lembra do que me prometeu, não é? - Diz entrando e parando atrás de mim, analisando meu quadro inacabado.

- Eu não sei do que você pensa que eu sou capaz. Acha que eu vou atacar o rapaz com uma faca assim que ele passar por aquela porta? - Indago irônica.

- Não... Mas você sabe que tem o estranho costume de ser sincera até demais. Às vezes fala coisas sem pensar, isso pode ofender as pessoas... - Ele diz ainda calmo. Suspiro me virando e olhando pro homem

- Eu vou me comportar, eu prometo! - Digo o fitando calmamente, que concorda gentilmente com a cabeça.

- Eu vou descer. Quando ele chegar eu te chamo. - Diz, se dirigindo até a porta rapidamente.

- Fecha a porta! - Resmungo inutilmente. Já que ele havia sumido dentre as paredes sem ao menos me ouvir. Suspiro olhando pro meu quadro e analisando o desenho que eu havia feito.

A rua mal iluminada e velha, com os prédios destruídos e pessoas exorbitantemente esguias, pálidas e exóticas andando na rua esburacada. Melancólico no ponto certo, e enigmático no ponto certo. Dou um pequeno sorriso de satisfação, por ter feito tão bom aproveito das duas últimas horas que eu havia passado sentada nesse banco duro.

- Luna! - Ouço Henry gritar do andar de baixo. - Meu irmão chegou, vem conhecer ele!

- Não é como se ele fosse uma realeza ou algo assim... Não sei pra que tanta paparicação - Resmungo entediada, enquanto inutilmente tentava limpar os rastros de tintas da minha mão com um pano velho. Suspiro me dando por vencida e me levantando. Me olho de longe do espelho e noto meu estado deplorável. Roupas largas e manchadas, cabelos desgrenhados e amarrados num coque de mais ou menos uma semana, e mãos completamente sujas. "Eu não deveria me vestir assim pra conhecer a realeza... Primeira impressão estragada com sucesso" penso irônica, enquanto me dirigia pra fora do quarto.

- Esse é o Matthew! - Henry diz apontando pra uma pessoa num canto da parede. Dou alguns passos até ter a visão clara de quem estava ali. Então paraliso. Minha respiração falha e meus olhos se arregalam. Eu não poderia acreditar no que eu estava vendo. O sorrido nojento cresce no rosto do homem assim que ele me vê, dando alguns passos em minha direção.

- Mylles...-Eu resmungo assim que ele se aproxima de mim

- Luna! - Rebate logo depois, com um puta sorriso irônico, me olhando de cima com aspereza.

- Então vocês já se conhecem? - Henry pergunta, nos encarando sorridente.

- Sim, estudamos juntos... É bom te ver, Mylles! - Afirmo com um sorriso forçado, tentando não transparecer para o outro a tensão que não só eu, como Mylles também estava sentido.

- É mesmo? - Ele indaga com uma sobrancelha erguida.

- Sim, é sim! - Continuava com aquele sorriso forçado estampado na minha cara. O homem parecia se divertir de uma forma exuberante.

- Então é recíproco - Ele diz estendendo a mão. Fito ela, e tinha quase certeza que tinha uma veia saltando na minha testa. Mas agarro sua mão, o cumprimentando.

- Luna, poderia levar o Matthew até seu quarto? Eu vou ajudar seu irmão a acabar de fazer a janta, e ele quer tomar um banho. - Henry diz, me olhando pedinte.

- Janta? Vamos ter janta?- Indago confusa, e o homem confirma com a cabeça.

- Hoje é um dia especial! - Ele diz abrindo um sorriso radiantemente maroto, e anda até a cozinha sumindo pela porta. Assim que o Henry desaparece meu sorriso some, eu encaro o homem com desdém.

- Tão fingida! - Ele afirma debochado, ainda me encarando daquela maneira.

- Cala a boca. E vem logo! - Eu digo, olhando pro rapaz e sumindo rapidamente pelas escadas. O ouvindo andando atrás de mim logo depois. Paro em frente a porta do quarto, que curiosamente se encontrava bem em frente ao meu. O homem da alguns passos, olhando pela frecha da porta dos meus aposentos e fazendo uma careta

- Que lixeiro! - Ele resmunga, e então me olha - Suponho que esse seja seu quarto

- Esse é o seu! - Digo abrindo a porta do quarto que agora, já podemos considerar ser propriedade de Mylles.

- Sabe, luna... O hoje foi cheio de surpresas, mas a melhor parte foi te ouvir dizendo que é bom me ver! - Diz, com um sorriso arrogante, se encostando no batente na porta e cruzando os braços assim que larga sua mala no chão.

- Escuta aqui, Mylles. Essa merda é importante pra caralho pro teu irmão, se é importante pra ele é importante pro meu irmão, e se é importante pro meu irmão é importante pra mim... Então eu acho melhor você colaborar, pois, eu não tenho muita paciência. Principalmente se tratando de você! - Digo dando uma última olhada pro homem e andando em direção a meu quarto.

- Isso vai ser divertido! - foi a última coisa que eu ouvi antes de fechar a porta com toda força que eu conseguia.

- Não pode ser, não pode ser, puta merda! - Eu resmungava enquanto passava as mãos por meus cabelos.

Eu poderia ter imaginado mil e uma pessoas que poderiam hipoteticamente ser o irmão de Henry, a cidade é pequena, eu sem dúvidas já poderia ter visto, ou ao menos ouvido falar. Mas jamais pensaria que essa pessoa fosse o Mylles. Não com a história de vida que eu ouvira dele. Suspiro, me jogando na cama completamente aberta. Eu mal consigo passar uma hora na aula sem sentir vontade de matar Mylles com minhas próprias mãos. E agora o desgraçado estava aqui, morando sob o mesmo teto que eu.

                             ¥¥¥¥

Com o rosto apoiado em minha mão eu olhava atentamente pro meu prato, enquanto brincava com a comida usando um garfo. Suspiro, me forçando a voltar pra realidade olhando em volta. Os irmãos conversavam sobre algo da infância, enquanto Derick ria euforicamente. Respiro fundo, percebendo que Mylles ainda me olhava daquela maneira. Um tom completamente irônico e arrogante em seu sorriso, seus olhos simetricamente cerrados enquanto o homem ao menos tentava disfarçar que me analisava provocante e atentamente.

- Está tudo bem, Luna? - Ele indaga, me olhando enquanto tentava disfarçar aquele sorriso tosco.

- Sim, tudo ótimo! - Digo, abrindo mais um de meus sorrisos forçados. A essa hora eu já era capaz até de fazer uma coleção.

- Você parece tão... Distante - Rebate, se inclinando um pouco e se acomodando de maneira confortável em sua cadeira.

- Só um pouco cansada!

- Compreendo perfeitamente - Disse ele cruzando os braços - Fico feliz que vamos morar tão perto um do outro agora. Vocês sabiam que éramos grandes amigos no colegial? Éramos tipo tico e teco - Mente descaradamente, me olhando de cima com um sorriso perverso nos lábios.

- É verdade... Eram realmente íntimos! - Confirmo para os rapazes, enquanto me perguntava internamente o que diabos ele estava tentando fazer.

- Vai ser bem mais fácil me adaptar assim... Se depender de mim, vamos nos dar muito bem! - Ele diz se esquivando e apoiando os braços na mesa - Aliás, eu já estou cheio de planos. Podemos fazer muitas coisas juntos, eu estou fazendo em minha cabeça diversas programações. Isso vai ser divertido!

- É... - Engulo em seco - Eu estou realmente animada com essa possibilidade!

Matt Mylles, minha deplorável perdição (Concluído)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora