-Cara, e se esse plano maluco dela não funcionar? O que nós vamos fazer?
-Nós enfrentamos eles, João. Não temos nada a perder.
-Sem chance! Você viu o que eles fizeram com o porto de Arcádia? Não temos chance contra eles.
João estava preocupado com o que poderia acontecer caso o plano de Melissa desse errado. Apesar de ser um rapaz forte e corajoso, não conseguia esconder sua preocupação. Estava surpreso com a atitude de Raymond. Ele era sempre considerado o medroso do grupo, mas agora demonstrava uma coragem nunca vista antes. Parecia estar disposto a lutar a qualquer custo. Zack entrou na conversa dos dois:
-Raymond, você está agindo por impulso. Temos que agir com cautela. Avançar para cima deles não vai adiantar em nada. Temos que torcer para que o plano da guardiã funcione. Fiquem calmos. Ela já deve estar voltando.
-Eu estou cansado disso! Por que eles nos querem tanto? Arcádia não representa qualquer perigo para o Império Vermelho.
-Nós não, Raymond. Na verdade, eles querem só você e o Peter. Eles se prestaram a mobilizar tropas para adentrar na Floresta Amazônica por vocês dois.
-E o que você quer que nós façamos, Spike? Que a gente se entregue? Que nós deixemos eles fazerem o que bem entenderem com nós dois?
Spike percebe que devia ter medido melhor suas palavras. Raymond estava se culpando pela morte de todos os seus amigos. E ter falado isso, só estava piorando as coisas.
-Não...Eu não quis dizer isso. É só que eu...
-Você estava falando o que você realmente pensa. Você gostaria que nós nos entregássemos. Era isso que você queria dizer.
Raymond estava profundamente irritado. O rapaz apontava o dedo na cara de Spike. Se Spike revidasse, poderia ocorrer uma briga entre os dois. Mas ele respondeu com calma, não estava a fim de causar uma confusão.
-Não! Que isso cara! Eu jamais diria isso. Vocês são meus amigos. Se tivermos que lutar nós vamos lutar até o fim. Nós não vamos abandoná-los. Nada de desistir, certo?
-Claro! Nós não vamos desistir. Lutamos juntos, morremos juntos. - falou Zack
-É isso mesmo! Um por todos e todos por um. É esse o código. - falou João
Peter hesitava em se pronunciar. Nunca acreditou no código de guerra Arcadiano, assim como Raymond. Mas antes que chegasse a sua vez de apoiar a causa, Raymond interrompeu os amigos.
-Um código criado por um traidor. Ele deve ter dito isso só pra facilitar o trabalho dele. Morreríamos pelo código.
-Raymond! Não é porque o tutor James nos traiu que o código perdeu a validade. Ele foi criado pelo General Hermes e seus companheiros de guerra antes mesmo da fundação de Arcádia. Não lembra? Você mesmo nos disse isso.
-Sim! É verdade. O código foi criado na guerra contra as forças armadas colombianas. A união das tropas fluminenses foi responsável pela vitória. O exército era incorruptível e eles nunca deixavam um soldado morrer em vão. Até hoje se acreditava que Arcádia tinha herdado essa honestidade. Que a nossa sociedade não era corrupta. Hoje está bem claro que isso não passa de um mito. Será que vocês não enten...dem?
Raymond começou a sentir uma tontura, caiu de joelhos com as mãos no chão. Será que seria mais um ataque epiléptico do amigo? O rapaz possuía uma doença grave chamada epilepsia. O seu cérebro possuía uma pequena deficiência que provocava tontura, desmaios e espasmos ocasionalmente. O grande problema é que não podia se prever. Existia pouca informação disponível sobre essa doença em Arcádia. Porém, isso não abalava Raymond. Ele conseguia ter uma vida normal apesar de tudo.
Peter chegou bem perto dele para ver o que estava acontecendo. Não ousou tentar levantá-lo, já que não sabia o que estava ocorrendo.
- Será que ele vai ter mais um daqueles ataques? Hoje de madrugada ele teve um. O nariz dele sangrou. Lembra, Spike?
-Não acho que seja um ataque epiléptico Peter. Deve ser mal estar. As convulsões já teriam começado.
Spike estava certo. Isso não era um ataque epiléptico. Raymond estava sentindo uma tontura. Mas não era uma tontura qualquer. Ele estava sentindo a mesma dor que sentiu quando teve sua mente invadida pela vidente, mas em uma escala menor.
Ele olhava para o chão. Quando levantou sua cabeça não via mais seus amigos. Ele via...Truman! A vidente estava ao seu lado. Ela tinha uma cara de apreensão e parecia que estava gastando muita energia ao invadir a sua mente. Ele continuava a ver a floresta a seu redor. A única diferença é que os dois estavam à sua frente. Conseguiu levantar com dificuldade. LOgo em seguida começou a encarar Truman.
-Olá rapaz! Você não deve me conhecer. Meu nome é...
-Truman! Eu sei muito bem quem você é. O que você quer comigo? Quer que eu seja seu novo vidente?
-Fantástico! Valeu mesmo a pena ter perdido todo esse tempo vindo até esse fim de mundo. Os meus planos para você vão muito além disso. Eu sou sócio de uma empresa que atua num ramo muito lucrativo: A guerra. Essa empresa produz muito mais do que armas. Um dos nossos projetos é produzir soldados como você ou até melhores.
-Como assim? Produzir soldados? Soldados não se produzem. Soldados se treinam.
-Você em breve vai saber. James já lhe fez uma proposta. Eu farei de novo e pela última vez. Se entregue e o que restou dos seus amigos sobreviverá. O que você me diz?
-Raymond! Não se entregue a ele. Se ele conseguir o que quer ninguém mais poderá pará-lo. -Falou Emma, a vidente.
-E por que você não resiste? Por que deixa ele fazer o que bem quer com você? Você é capaz de matar uma pessoa, mas não é capaz de resistir às vontades dele. Me diga... Por que você não resiste?
A mulher ficou sem reação. Não sabia o que dizer. Mas Truman foi categórico ao responder.
-Porque não há saída, rapaz. Mesmo com seus poderes, vocês não são páreos para mim. Garoto, se entregue. Se entregue e mais nenhum de seus amigos morrerá. Traga seu amigo junto também.
-Não! Meus amigos não morreram para eu simplesmente me entregar. Eu devo isso a eles.
Agora, saia da minha mente! Saia da minha mente agora!
Truman e a Vidente desapareceram. Ele voltou a enxergar a realidade de novo. Peter olhava para ele com preocupação.
-Cara, o que foi isso? Você meio que entrou em transe. Falou sozinho. Nós começamos a ficar preocupados.
-Truman! É ele quem está por trás disso tudo. Foi com ele que James fez um acordo secreto. Algo me diz que ele vem planejando invadir Arcádia há um tempo.
-Truman? Como você conhece esse cara? Como você falou com ele?- perguntou Zack
-Tem uma mulher. Ela é uma vidente, ela tem o poder de entrar na mente das pessoas. Peter, se lembra quando estávamos na tenda e vocês acharam que eu estava tendo um ataque epiléptico? Eu não quis falar porque achei que era loucura. Achei que ninguém acreditaria em mim. A vidente apareceu na minha mente. Ela tentou me matar.
-Ok! Vamos parar por aqui, né? Eu acho que você está precisando conversar com um psicólogo.- falou Spike.
-Mas o que esse cara quer?- perguntou João
-Ele quer que eu e Peter nos entreguemos. Segundo ele, se nos entregarmos ele vai poupar a vida de quem sobreviveu.
-Sem chance Raymond! Não podemos confiar num cara desses. Ainda mais sendo um Yankee. Você sabe muito bem que eles não são confiáveis, não é?
-Mas se você soubesse que ele cumpriria a sua palavra, você se entregaria?
Peter engoliu em seco. Ele ficou olhando para o amigo atônito. Ele se entregaria? O que aquele cara faria com ele? A verdade é que Peter não sabia o que responder. Ele nunca foi um cara altruísta. Que pensava em ajudar os outros sem receber nada em troca. Era difícil para uma pessoa como ele pensar em fazer algo assim.
-Ninguém aqui vai se entregar!
Era a guardiã e.. uma onça-pintada. Peter ficou atônito olhando para aquele felino. Parecia que era uma fêmea. Nunca tinha visto um de tão perto. O corpo do animal era simplesmente lindo. Sua pele de cor dourada com manchas pretas. Seu olhar desafiador. Era um predador nato.
-Conheçam Bastet. Minha parceira. E não se preocupem, ela não vai comer vocês.
-Você deu um nome para ela? Que bizarro!
A imagem da guardiã fazendo carinho naquela onça-pintada passou pela cabeça de Zack. Era algo bem bizarro de se imaginar.
-Ela acabou de enviar uma carta para o general Hermes. Nós vamos atacar com força total. E vocês vão atravessar o rio enquanto isso.
-Você está louca? Esse é seu plano? Que a gente atravesse no meio do fogo cruzado? - falou Raymond
-Isso literalmente não é um plano. Qualquer um poderia pensar nisso.- retrucou Peter
-Eles querem você e Raymond vivos. Acredite em mim, eles não vão atirar. Zack, João e Spike, fiquem bem perto dos dois para que eles não atirem em vocês.
-Tá certo então! Fazer o quê, né?- falou João
Os outros não responderam. Não concordavam com a ideia.
Ao longe, eles começaram a escutar tiros e mais tiros. Tinha começado o conflito.
-É hora de correr! Temos pouco tempo.
A onça-pintada foi na frente com a guardiã. Os outros ficaram impressionados com o fato de a guardiã estar conseguindo quase que acompanhar a velocidade da onça.
"Vamos lá então! É tudo ou nada. Que se dane o Truman e aquela Vidente. Nós vamos atravessar."
Eles começaram a correr e em pouco tempo chegaram na margem. Vários navios estavam atirando balas de canhão contra os poucos tanques que Arcádia possuía. O que era incrível era que parecia que a batalha estava equilibrada. Porém, eles sabiam que seria muito difícil resistir por tanto tempo ao ataque de uma esquadra com navios de alta tecnologia. A esquadra Yankee talvez só perdesse para a esquadra Britânica. "A rainha dos mares".
Vários jovens mais experientes estavam lutando na frente de batalha. O rio não era largo como o Maracanã, o que obrigou a esquadra Yankee a colocar seus navios em uma fila indiana. Talvez isso estivesse ajudando o lado de Arcádia.
Onde estaria o tal Truman? Raymond viu um homem sair do primeiro navio da fila. Saiu da cabine de comando.
Ele era louco? Podiam muito bem atirar nele. Não havia qualquer proteção.
O homem possuía uma flauta em sua mão. Mas não era uma flauta qualquer. Era o famoso "aboporu". Era impossível que Truman soubesse manuseá-lo. Só James dominava o instrumento. Seria preciso muitas horas de prática.
Assim que ele saiu, a esquadra parou de atacar. Talvez a munição tivesse acabado e eles quisessem se render. Raymond queria muito que isso fosse verdade, mas ao perceber o olhar malicioso de Truman, soube que o general tinha algo em mente.
-Ei! Aquilo ali é o "aboporu"? Não pode ser! Ele não sabe usar né?- falou Peter
-Eu nem me atrevo a adivinhar.- falou Spike
Truman estava confiante, pegou o "aboporu" e se preparou para tocar. Era necessário saber a frequência correta para causar atordoamento e provocar desmaio.
Ele assoprou. Um som agudo tomou conta do ambiente. Raymond começou a sentir tonteira. Olhou para seus amigos. Eles não estavam nem um pouco melhores.
"MALDITO! COMO ELE APRENDEU A USAR ESSA ARMA? JAMES...ELE CONDENOU A VIDA DE TODOS AO ENSINAR O SEU MANEJO. MAS PARA QUÊ?"
Agora não adiantava mais resistir. Raymond e Peter seriam capturados. Eles estavam sem saída.
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Capítulo revisado em 6/2.