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Se eu soubesse que escolher uma universidade longe de casa me traria tantos problemas assim, teria escolhido a da minha cidade, pelo menos todos que estudaram nela, tem um emprego de meio período.
Mas o que pesava em minha cabeça, não era necessariamente minha culpa, mas sim dos meus pais, que desde pequena colocaram na minha cabeça que quando eu crescesse eu cursaria comércio exterior fora do país, eu nem tinha certeza se queria cursar esse curso mesmo e ainda mais fora do país.
Mas acredito que.. eu não queria decepcionar eles, mas era exatamente o que eu estava fazendo, estava de mudança para Madrid, tão em cima da hora, e eu não tinha totalmente noção do que fazer, estava sendo jogada nesse mundo novo, e sem nenhuma instrução de como agir, ou do que fazer.
Mas agora não tinha mais volta, eu precisava mostrar ao meu pai que eu já tinha idade o suficiente para cuidar de mim mesma, e nada melhor do que em um país diferente.
Não queria ir após uma discussão e sem se despedir, mas seria o melhor a se fazer no momento, talvez quando eu chegasse lá em Madrid, eu pudesse fazer uma chamada vídeo e conversar melhor sobre o que estava de fato acontecendo.
Nesse exato momento, me encontrava colocando minhas malas no táxi que minha mãe havia pedido.
Enquanto isso, meu pai dormia em sua cama, após as vinte e cinco gotas de calmante que minha mãe havia colocado em sua água.
Segundo ela, dormir o faria bem. Embora eu não gostasse dela se arriscar deste jeito.
_ Eu vou sentir sua falta, mãe. - Falei indo até ela e dando um abraço bem apertado, típico de toda despedida.
Se tinha uma coisa que eu odiava era ter que me despedir, nunca soube como agir, ou o que falar, preferia mil vezes que as pessoas sumissem da minha vida e não falassem nada, talvez seja por isso que sempre tive dificuldade em manter uma amizade, porque quando eu enjoava, eu me afastava sem dar nenhum tipo de detalhe do porque eu estava me afastando.
Sei que não é o certo a se fazer, mas assim eu evitava que as pessoas me machucassem, ou que eu as machucasse.
_ Não tanto quanto sua mãe, meu amor. Quero que me prometa que vai se cuidar e que se precisar de dinheiro vai me mandar mensagem, eu vou dar um jeito de conseguir e de te enviar.
_ Não se preocupe mãe, eu vou me virar por lá. A primeira coisa que vou fazer, vai ser arrumar um lugar para ficar e um emprego para me manter por lá, não deve ser tão difícil.
_ Minha garotinha cresceu tanto, estou muito orgulhosa de você meu amor, você tem um futuro brilhante pela frente, não deixe ninguém te dizer o contrário.
_ Obrigada mãe, devo tudo isso a senhora, que sempre fez de tudo por mim. Eu sou eternamente grata, por ter me dado a melhor educação e por ter cuidado de mim, sempre.
_ Não precisa me agradecer, meu amor. Ter tido você foi o melhor presente que eu poderia ter ganhado. Você com certeza é a melhor coisa que me aconteceu.
_ Owen mãe, eu não posso chorar. - Era tarde demais para isso, ambas já estávamos debrulhadas em tantas lágrimas, mas como toda a despedida, chega a hora de ir embora.
_ Agora vai, porque se não você vai perder o seu voo. Tem certeza que pegou tudo? - Perguntou abrindo a porta do carro para mim.
_ Sim. - Respondi pegando meu celular que estava dentro da bolsa.
_ Pegou sua escova de dente? - Perguntou e assenti me lembrando de ter colocado na bolsa na noite anterior.
_ Confere. - Respondi fazendo um joinha com as mãos.
_ Pegou suas roupas, seus tênis que você não tira do pé e seus óculos de grau? - Eu odiava usar óculos, por isso estava sempre de lente de contato.
_ Confere, confere e confere.
_ Pegou papel higiênico? - Oxi, não é que mãe pensa em tudo mesmo.
_ Mãe, porque eu precisaria de papel higiênico? - Perguntei perplexa e fiquei até com vergonha do motorista que entrou no carro para fingir que não estava rindo da minha cara.
_ Para limpar a bunda, Isadora. Para o que mais seria? - Respondeu como se fosse óbvio, enquanto o motorista se matava de rir dentro do carro.
_ Peguei mãe, não se preocupe. Agora eu preciso mesmo ir, porque já estou atrasada. - Respondi dando mais um abraço nela. A verdade era que não tinha pegado papel higiênico nenhum, mas já estava atrasada para pegar, então ia sem mesmo.
_ Tabom meu amor, faça uma boa viagem e não se esqueça de me ligar quando chegar lá.
_ Pode deixar mãe, te amo. - Me despedi dando um beijo em seu rosto e entrando no carro.
_ Se cuida meu amor, também te amo. - Falou me jogando um beijo e joguei outro.
_ Tchau, mãe. - Falei antes do motorista sair com o carro.
Agora não tinha mais volta, eu estava mesmo fazendo aquilo, não sabia o que me esperava lá em Madrid, mas espero ter menos estresse do que no Brasil.
Encostei minhas costas no banco do passageiro atrás e observei pela última vez as ruas do meu bairro.
Eu não morava em um bairro de gente rica, mas também não éramos tão humildes assim, digamos que eu estava na meia fase, sempre tínhamos o que comer e era por isso que era grata todos os dias da minha vida.
Em pensar que havia pessoas que nem tinham isso, por soberba das outras pessoas, me causava um nó no estômago.
Por que existia tanta desigualdade, uns tinham muito e outros não tinham nada, isso sim era uma injustiça.
Talvez seja por isso que nunca me dei bem com pessoas ricas, sempre se achavam superiores do que as outras. Um exemplo claro foi o que me fez ser expulsa da escola aos treze anos, eu almoçava sozinha no refeitório da escola quando vi uma garota sofrendo bullying por comer uma maçã e não um lanche como as garotas que tinham dinheiro para comprar faziam.
Me lembro de ter levantado da cadeira em que estava sentada, ir até a garota que fazia bullying e de puxar seu cabelo como se aquilo dependesse para que eu vivesse, me lembro de ter batido sua cabeça na mesa e de ter escorrido sangue do nariz dela, também me recordo quando a diretora me segurou e me levou para a diretoria, acredito que a menina tenha precisado de reparos médicos, mas se de uma coisa eu tinha certeza, era que ela nunca mais faria bullying com ninguém.
Após esse pequeno ocorrido, fui transferida para outra instituição, desde então meu pai mudou comigo, ele já não era a mesma pessoa, e digamos que isso tenha me causado alguns traumas de infância.
Mas enfim.. agora eu não podia mais olhar para o que aconteceu no passado, afinal eu não podia mudar ele, só tinha que focar no meu presente e no meu futuro que ainda era incerto.
Resolvi deixar tudo de ruim para trás e focar no hoje, por isso fechei meus olhos para aquele lugar e visualizei como que seria minha vida daqui para frente, eu pelo menos esperava que fosse melhor.
Não demorou muito para o motorista chegar ao aeroporto, embora tivesse trânsito, o mesmo cortou pelo acostamento, não era muito fã de pessoas que iam contra a lei, mas se ele não o tivesse feito, talvez eu não chegaria no horário, então relevei naquele momento.
Após ter pago pela viagem, o motorista me ajudou a descer minhas malas do carro e agradeci de imediato.
_ Obrigada, senhor.
_ Imagina, tenha uma boa viagem senhorita e aproveite. - Falou e com um sorriso agradeci.
Pessoas simpáticas estavam em extinção nesse século.
Coloquei minha mochila nas costas e levei minhas duas malas, uma em cada mão, para distribuição do peso, quando entrei no aeroporto fiquei chocada de como tinha tantas pessoas esperando pelo seu voo.
Aonde que as pessoas arrumavam tanto dinheiro assim para viajar? Era a pergunta que rondava em minha mente.
Olhei para todos os lados e verifiquei em meu celular as informações sobre meu voo, tinha um número pequeno na minha passagem e não sabia para quê, que ele servia, então me aproximei de um segurança para tirar minhas dúvidas.
_ Boa madrugada moço, tudo bem? - Perguntei ao segurança, afinal eram seis da manhã.
_ Bom dia. - Respondeu sério e fingi que não tinha acabado de assassinar o português.
_ Então, é a minha primeira viagem de avião e não sei o que fazer ou para onde devo ir, o senhor poderia me passar alguma instrução do que fazer? - A vergonha estava nítida em meu rosto nunca me senti tão burra em toda a minha vida.
_ Você vai seguir essa linha vermelha no chão, no final dela vai ter um guichê, lá você vai fazer todos os procedimentos para seu embarque.
Olhei para o chão e de fato tinha uma lista vermelha, com meu olhar fui seguindo até o final e avistei ao longe o lugar que o segurança havia informado.
_ Eu agradeço. - Respondi saindo dali o mais rápido possível, quando estava chegando próximo da fila de apenas uma pessoa, vi que um casal estava indo na mesma direção e como eu queria chegar primeiro que eles, eu saí correndo com minhas malas para chegar primeiro que os dois, confesso que foi muito engraçado ter corrido para chegar no mesmo lugar, eu definitivamente precisava de maturidade, porque isso me faltava.
O casal ficou me olhando como se eu fosse uma doida e foi inevitável não dar risada, eu tinha mesmo feito aquilo dentro de um aeroporto, que sensação maravilhosa.
_ Próximo. - A moça me chamou e fui até ela, não disse nada, apenas entreguei meus documentos e ela achou meu nome que já tinha sido cadastrado. _ Você vai seguir essa linha verde e lá vai ter uns seguranças que iram despachar a sua mala, tenha uma ótima viagem senhorita, Isadora. - A moça disse e sorri toda boba por estar viajando de avião, era um dos meus sonhos.
_ Obrigada, moça. - Fiz como ela pediu, segui a linha verde e consegui despachar as minhas malas, ainda bem que não deu nada de errado, porque se eles abrissem a minha mala, certamente iriam ver as minhas peças íntimas, aí a humilhação seria garantida.
Não demorou muito para anunciar o meu vôo, e como havia pegado todas as instruções possíveis com os seguranças, fui até a parte de embarque e entreguei meus documentos e meu check in para poder embarcar.
Após toda a verificação necessária eu consegui entrar no tubo onde as pessoas passavam igual nos filmes, confesso que fiquei me sentindo a popstar passando com minha mochila da turma da Monica por ali, pensei em tirar uma foto então pedi para a pessoa que estava logo atrás de mim, já que queria uma que aparecesse o avião atrás.
Após minha sessão de fotos, entrei no avião e com as instruções da aeromoça fui até meu assento, para meu azar eu não tinha conseguido um lugar na janela já que comprei as passagens muito tarde, mas isso não seria um problema.
Vi que as pessoas colocavam suas coisas na parte de cima do avião e fiz o mesmo tentando colocar minha mochila naquele espaço pequeno, foi quando senti alguém me cutucar por detrás.
_ Com licença moça, você se importa em trocar de lugar com o meu esposo? queríamos viajar juntos já que ele tem medo de altura. - Uma senhora pediu com seu marido ao lado, ambos já avançados na idade.
_ Claro, sem problema. Qual seria o assento que o senhor estava? - Perguntei e ele apontou na direção ao lado de uma criança e assenti.
_ Muito obrigada, querida. - A senhora agradeceu.
_ Imagina, tenham uma boa viagem. - Desejei indo em direção ao assento que antes estava reservado para aquele senhor.
_ Olá, poderia me dar licença? - Pedi para o menininho que me ignorou totalmente. _ Tabom, então. - Coloquei minha mochila em cima e passei pelo menininho que não tinha tirado as pernas do meio do caminho.
Estava vendo que seria uma longa viagem..
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