Capítulo dezenove
Naomi
A minha costela ainda não está cem por cento, quer dizer, é óbvio que não está melhor. Quebrei ela ontem. Hershel disse que a única coisa que pode ser feita é tomar os analgésicos e ficar de repouso.
— Eu consigo levantar — reclamei.
Obviamente soou como a maior mentira do mundo porque Hershel apenas ergueu a sobrancelha e me segurou antes que eu tentasse levantar.
Respirar doía e a minha perna doía como um inferno. O corte foi bem fundo.
— Você não vai sair desse sofá. Levante e piore a situação — Hershel me olhou como um pai bravo — Seu tempo de recuperação vai ser maior se você continuar se esforçando — continuou, me fazendo revirar os olhos.
— Mas eu estou em perfeitas condições par...
— Para piorar e estragar o que eu estou tentando consertar. Você só vai sair daí para o seu quarto se você quiser. Carregada.
— Sim, pai.
Hershel me encarou.
— Hershel, você e as meninas estão bravos comigo? — perguntei.
O semblante de Hershel não revelava muita coisa.
— Ele matou Otis, tentou matar Maven duas vezes e feriu você. Não foi a melhor solução, mas aconteceu.
— Não foi, mas ele não ia parar. E eu avisei que isso iria acontecer, falta de aviso não foi.
— Mesmo assim, Naomi. Não estamos bravos. Só preferia que você não tivesse sangue em suas mãos.
O semblante do senhor revelou tristeza. Se Hershel soubesse o que eu já fiz dentro da gangue, o que eu já mandei fazer... Mesmo que seja indiretamente, já tenho sangue nas mãos também.
— É, mas os outros estão. Tenho certeza que a Lori iria me esganar se eu não tivesse quebrada.
— Minha filha, uma hora ela vai entender o porquê do que você fez. Mesmo que ainda sinta raiva. Precisamos de perdão nas nossas vidas.
— Acha que eles vão pegar muito pesado comigo no julgamento?
— Você matou alguém, Naomi. Não sei o que esperar disso tudo.
— Como Maven está agora?
— Descansando, mais tarde ele desce — Hershel pegou as gazes e saiu da sala, me deixando sozinha.
[...]
Como Hershel não me deixava levantar sem ser carregada, nem a dor, o julgamento ocorreria no meu quarto.
— Você está pronta? — Rick segurou a minha mão ao perguntar e me deu um sorriso vago.
Uma gota de suor escorria pelo seu rosto e ele parecia estar mais nervoso que eu.
Cometi um crime. Mais um. Os que eu cometi antes do fim do mundo começar não são nada comparados ao que fiz com Shane, mas vai ficar tudo bem.
Maven desceu as escadas havia um tempo e me encheu de abraços, carinho e agradecimentos.
"— Eu sabia que seus super sentidos da máfia iriam ajudar aqui.
— Maven, já te expliquei mil vezes que não somos bem uma máfia.
— Idai? Você é tipo que uma super heroína que usa meios ilegais para resolver as coisas.
Gargalhei.
— Obrigada, Mani — ele depositou um beijo na minha cabeça.
— Tudo pela minha família. "
Maven parecia sereno ao se encostar na parede, mas seus olhos o entregavam. Ele estava com medo do que iria me acontecer.
Dale, Maven, Rick, os Greene e alguns outros me defenderam durante o julgamento. Andrea sugeriu que eu fosse exilada da fazenda. Vaca.
— Gracinha, vou ter que te dizer que você só está com a sua bunda dentro dessa fazenda, se alimentando e sobrevivendo por que eu pedi para você ficar? — Se não fosse por mim todos eles já estariam fora daqui — Se você está respirando é porque eu te dou o ar que você precisa. Acho melhor você começar a agradecer se você não quiser ser exilada. Menos uma boca para eu alimentar — Andrea se calou e eu pude ouvir Daryl soltar uma quase gargalhada.
— Vai me matar também? — ela me provocou.
— Quer pagar para ver? — me sentei e automaticamente Andrea recuou um passo com medo.
— Isso é muito bom. Puxa o cabelo dela!!! — Maven riu.
T-Dog pigarreou chamando a atenção de todos e disse:
— Shane matou uma pessoa e tentou matar mais duas. Ela se defendeu e protegeu todos aqui. Quem sabe ele não atacasse alguém também?
— Eu já desconfiava dele há muito tempo — Dale disse — Desde que o Shane voltou da escola ele contava versões diferentes sobre o que aconteceu. Não perceberam? Vocês deveriam ter se questionado sobre isso também.
— Ela matou o Shane — Lori disse com desdém.
— E ele matou Otis — Beth respondeu de braços cruzados.
— E tentou me matar — Maven também se posicionou — Qual é a sua lógica? — meu melhor amigo também me defendeu.
— Ela não sai dessa fazenda. Se vocês não gostaram dessa decisão, que saiam vocês — Maggie praticamente rosnou.
— A garota teve culhões para fazer o que fez — Daryl me elogiou.
— Ela é uma assassina! — Lori apontou para mim.
— Então vá embora da porra da minha casa! — Maggie devolveu no mesmo tom.
— Não sei porque vocês estão tendo essa discussão se a fazenda é minha — Hershel falou — Vocês não tem poder de escolha nenhum aqui dentro.
— Isso é uma democracia — Andrea falou.
— Na minha casa não. Eu sou a autoridade aqui dentro.
Apesar da situação fiquei feliz em ver tanta gente me defendendo. Os Greene e Maven sempre foram como uma família para mim.
— Você só pode estar brincando — Lori resmungou.
— Shane ia matar duas pessoas, Lori — Rick falou.
— Ela matou ele!
Várias discussões paralelas começaram.
— Aí!! — gritei — Eu não me arrependo nenhum pouco — A sala ficou em silêncio — Eu mataria de novo e de novo e de novo. Não sinto tristeza pela morte dele. Não tenho um pingo de arrependimento.
— Está vendo? — Lori aponta para mim — Ela é uma assassina sádica!
— Sádica é o meu rabo — Maven murmurou.
— Que sirva de aviso para todos vocês — levantei com muita dificuldade e dor, recebendo um olhar de reprovação de Hershel — Eu avisei que iria matá-lo se ele encostasse um dedo no Maven. É o que acontece. O mesmo serve para vocês. Quem ousar machucar ou ameaçar a minha família e as pessoas que eu amo vai morrer. Não importa se vai ser de uma forma dolorosa ou misericordiosa. Vou caçar quem tentar fazer mal as pessoas que eu gosto. Estou dando um aviso prévio.
A sala inteira me olhava com os olhos arregalados. Pude escutar Maven sussurar "essa é a minha garota" e pude ver o pequeno sorriso se formar nos lábios do Dixon.
— Perder o acesso as armas — Glenn disse baixinho.
— O que? — Rebecca perguntou ao Glenn.
— Perder o acesso as armas por um tempo — ele disse mais alto.
— Traidor — Maggie resmungou e saiu da sala.
— Ficar sem sair também — Acrescentou Andrea. Essa vadia está querendo ir se juntar ao Shane.
— Perdão? — Maven perguntou.
— Você acha que pode colocar uma coleira no meu pescoço?
— Todos de acordo? — Rick perguntou.
Meu olhar caiu sobre o xerife. Não esperava que ele fosse concordar com isso.
A primeira pessoa a levantar a mão foi Lori. Ela me encarou como se a minha punição fosse muito pouca. Hershel tinha dito que a minha recuperação iria demorar alguns meses então tudo bem.
Quase todos da sala levantaram as mãos, menos os Greene, Daryl, Dale e Maven.
— Então é isso. Posso dormir agora ou vocês vão ficar aí me encarando? — pergunto impaciente.
Ninguém respondeu.
— Vou te levar para cima — Daryl me pegou no colo e me levou para cima.
[...]
— Ai meu deus Hershel! Já fazem quatro meses que você não me deixa nem descer as escadas! Eu amo você, mas eu preciso ir lá fora — depositei um beijo na testa do velho antes prender um coque despojado.
— Você vai ficar bem?
— Vou. Nada dói mais. Só não avisa a ninguém que eu vou sair. Eles vão querer ir comigo e eu prefiro ir sozinha.
— Não vou mentir.
— Ótimo, então só fale alguma coisa depois que eu sair — sorri feito uma criança levada.
No começo, Hershel disse que o tempo de recuperação eram apenas três meses, mas ele sendo um pai preocupado, me fez ficar quatro meses de repouso.
Eu estava quase bancando a princesa rapunzel e saindo pela janela.
Eu estou ótima, meu cabelo cresceu ainda mais e eu perdi o jeito. É isso. Eu perdi toda a malandragem de ir lá fora com os errantes e voltar em segurança.
Agora eu preciso começar a correr, sair várias vezes para conseguir voltar a "ficar em forma."
Nesse tempo que eu fiquei de repouso tive muitas visitas de Carl. Ele me perdoou pela morte do Shane, coisa que nem todos conseguiram fazer por aqui. Rick ainda não sabe que Carl já suspeita que exista algo entre o xerife e eu. Nem eu sei ao certo o que existe entre nós dois, não quando Rick não me apoiou no "julgamento", mas Carl é uma boa criança. É esperto.
Estava saindo da fazenda quando Daryl veio atrás de mim.
— Vou com você.
— Eu não estou saindo para nenhum lugar.
— Mentira.
— Você não precisa me acompanhar.
— Vou.
— Não, não vai — respondi.
— Vou mesmo assim — ele me ignorou e colocou a besta sobre seus ombros enquanto caminhava ao meu lado para fora da cerca.