Never Stay

By EAIsASecret

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"Nunca amar alguém é o caminho mais fácil para não partir seu coração, mas se isso também significar que você... More

Nota da Autora
Dedicatória
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Um bilhete
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48
Capítulo 49
Capítulo 50
Capítulo 51
Capítulo 52
Capítulo 53
Capítulo 54
Capítulo 55
Capítulo 56
Capítulo 57
Capítulo 58
Capítulo 59
Capítulo 60
Capítulo 61
Capítulo 62
Capítulo 63
Capítulo 64
Capítulo 65
Capítulo 66
Capítulo 67
Capítulo 68
Capítulo 69
Capítulo 70
Capítulo 71
Capítulo 73
Capítulo 74
Capítulo 75
Capítulo 76
Capítulo 77
Capítulo 78
Para Sam
Capítulo 79
Capítulo 80
Capítulo 81
Epílogo
Para o time
Livro novo e 8 mil leituras
10 mil leituras e publicação do livro novo

Capítulo 72

59 11 32
By EAIsASecret

Oi, time :)

Enquanto eu escrevia estes próximos capítulos, escutava a música "Make You Feel My Love", da Adele, e sentia que tinha uma experiência mais completa, então, caso vocês queiram ouvir enquanto leem também, vou deixar um lembrete aqui em cima pelas próximas vezes. 

Boa leitura, é hora de dizer adeus a nossa Jane e de homenageá-la como ela merece <3 

*     *     *

O dia em que Livia passou mal em um baile de escola e a série de eventos fizeram com que Sam soubesse da gravidez. Estranhamente, pareceu que foi ali que ela descobriu que estava, de fato, grávida, porque, antes daquilo, ela não havia falado com ninguém sobre isso e não parecia real.

"-Livia... É... Caso você queira saber... Seu bebê está bem.

Ela parou de tricotar subitamente, virou-se para Sam sem que sua expressão dissesse nada específico por meros segundos. Seus olhos encheram-se de lágrimas e a primeira escorreu pelo seu rosto. Ela não fez questão nenhuma de esconder daquela vez.

-Que bom.- largou uma das agulhas e tentou enxugar o rosto com a mão."

A noite em que ela tricotou sapatinhos de bebê para um que não achavam que iria nascer.

"-O que é que você tricotou hoje?

-Sapatinhos de bebê.- Livia ergueu os dois objetos feitos com lã branca, em um orgulho mórbido- Irônico, né? Talvez o bebê venha buscar para não entrar descalço no paraíso."

Quando Sam lhe deu mais uma opção em relação ao bebê, e ela pôde tomar uma decisão sobre si mesma pela primeira vez na vida.

"-Vamos falar com seus pais."

A madrugada em que tivera uma crise de pânico na casa de Sam, quando os dois estavam presos lá por causa da nevasca que tomou conta de Stratford, e ela achou que tivesse machucado o bebê.

"-Livia, bebe só um pouquinho da água.- Sam pediu ao ver o conteúdo do copo intacto nas mãos dela e sorriu quando ela começou a beber devagar- Se você sentir dor, por mais leve que seja, precisa me dizer, tudo bem? Precisa me dizer rápido.

-Acha que eu machuquei o bebê?- perguntou, sendo a primeira coisa que disse desde que ele a acalmara."

A primeira vez que teve o instinto de proteger o bebê, ainda durante a nevasca, enquanto olhava uma foto da irmãzinha de Sam.

"Enquanto olhava o retrato pendurado na parede, Livia quase que podia ver o momento acontecer, ouvir a risada dela e entender o que aquela família sentiu quando a perdeu. Apenas pelo fato de ter tentado imaginar como foi para eles saber que aquela garotinha da foto havia partido, ela sentiu uma angústia consumi-la e, quando viu, estava com as mãos firmes na própria barriga pela primeira vez desde que descobrira a gravidez."

Quando viu o bebê na primeira ultrassonografia que fez.

"Ainda que visse a emoção das pessoas presentes, ela não sentia nada, nem bom, nem ruim.

Sequer estava olhando.

Pelo menos não até o som do coração do bebê tomar conta da sala. A batida rápida e perfeitamente audível foi como um ímã puxando a sua cabeça para o lado.

Foi assim que ela viu quem estava dentro de si pela primeira vez."

O dia em que ela e Sam estavam prestes a ter um momento íntimo, mas o bebê fez um movimento que a machucou e o deixou tão assustado, o que chegou a ser engraçado. O bebê, nesse dia, já estava apertado na barriga dela e tinha nome: Jane, como a sua irmã.

"-Agora você fica quieta, Jane? Depois de quase fazer o Sam ter um ataque cardíaco?- questionou, mas a criança continuou imóvel- Tudo bem, fica quietinha mesmo, pelo menos até eu dormir e acordar."

O pensamento ao qual se agarrou quando entrou em trabalho de parto.

"Jane precisa de mim mais do que nunca."

O que falou depois de dar à luz a Jane e de finalmente saber o que é realmente estar viva, ao tê-la em seus braços depois de tanta persistência.

"-Jane... A gente conseguiu, a gente conseguiu..."

O jeito que todos se apaixonaram por Jane, já nos seus primeiros dias de vida.

"-Obrigada por ficar com ela, irmã.- agradeceu, pegando a garotinha para que a senhora fosse liberada e voltasse aos seus afazeres- Espero não ter demorado muito.

-Não demorou nada, meu amor. Jane é uma benção... Depois que você a amamenta, ela não dá trabalho algum."

O reencontro das duas, depois de oito anos separadas, e surpresa em descobrir que Jane sabia exatamente quem ela era.

"Livia percorreu a pequena distância que separava as duas e prontamente foi abraçada por Jane, que a apertou com mais força do que alguém doente como ela conseguiria. Aquilo provavelmente deve ter esgotado boa parte da sua energia.

-Mamãe, você veio! Eu não acredito! Eu não acredito!"

A primeira vez que prometeram de dedinho...

"-É assim, a gente junta os nossos dedinhos...- Livia pegou o dedo mindinho dela com o seu próprio- ... e faz uma promessa. Se passar um determinado número de dias e a promessa for cumprida, é porque a pessoa que prometeu gosta muito de você, de verdade. Se não cumprir, estraga a brincadeira.

-O que você vai prometer?

-Eu prometo de dedinho que vou voltar em menos de três dias para ficar com você.- ela ergueu as sobrancelhas diante dos olhos ainda um pouco desconfiados da garotinha- E você, o que promete?

-Prometo de dedinho que vou ficar esperando."

Os últimos desejos de Jane, sendo um deles ter um tempo destinado apenas para ficar com ela...

"-Eu também queria ir à praia... Acampar...- ela continuou, fazendo uma pausa entre os itens da lista, como se esperasse uma contestação ou pedisse uma autorização da parte deles- Ter um baile de princesa... Andar de unicórnio...- Sam e Livia entreolharam-se, pensaram em falar alguma coisa sobre o unicórnio, mas apenas a deixaram continuar- Ter um cachorrinho... Fazer uma festa do pijama, porque o Sam nunca me deixa ficar acordada até tarde e... Fazer alguma coisa só com a mamãe, pode ser qualquer coisa."

A reação de Jane ao ver as cicatrizes dela...

"-Eu não vou ter medo de você, mamãe...

-Jane, eu... Jane, não!- Livia falou um pouco mais alto do que gostaria quando Jane levantou a sua saída de praia e se deparou com todas as cicatrizes que ela tinha. Em um impulso, Livia afastou a mão dela e desceu a sua roupa, mas não foi rápida o bastante, a menina havia visto.

Jane congelou onde estava, seus olhos estavam esbugalhados de um jeito, olhando tão fixamente para a saída de praia, que era como se ainda pudesse ver as cicatrizes por trás dela. Livia sentiu o seu coração palpitar, ficou completamente sem reação.

Estava prestes a gritar por Sam quando Jane deixou o próprio choque de lado e envolveu Livia com seus bracinhos, apertando-a tão forte quanto podia."

Quando Jane pintou o cabelo dela de tinta guache rosa...

"-Seu cabelo tá rosa, mamãe! Igual a quando você tava grávida de mim!- no meio tempo que Livia puxou as pontas do seu cabelo para frente e viu que, de fato, estavam cor de rosa, Jane pintou também uma parte do cabelo de Sam- Agora você e a mamãe estão iguais, Sam!"

A primeira vez que falou sobre um garoto, e a única também...

"-Oliver disse que quando a gente crescer mais um pouco, ele vai me pedir em casamento. Eu disse a ele que precisava melhorar antes também, para a gente poder brincar mais na festa!"

E a primeira que disse que a amava.

"-Mamãe...- Jane a fez se virar quando já estava na porta- Te amo."

O jeito que Jane nunca demonstrava o quão mal estava pela doença...

"-Eu já tô bem...- ela esfregou os olhinhos- Só com um pouquinho de sono..."

A felicidade da garotinha ao ganhar Charlie...

"-O que a mamãe trouxe, Sam? É uma boneca?- ela perguntou. Não estava com muita força, mas poucas coisas deixavam Jane tão feliz e animada quanto uma boneca nova.

Sam não respondeu verbalmente, apenas deu uma risadinha e continuou empurrando a cadeira. Vendo os dois se aproximando, Livia colocou o pacotinho no chão e passou a segurá-lo através de uma espécie de corda vermelha, ao que Jane logo associou com uma coleira.

Ela quase que pulou da cadeira de rodas. Teria feito isso, se não tivesse gasto a pouca força que tinha para apontar e quase que gritar:

-É um cachorro! É um cachorrinho! O cachorrinho que eu pedi!"

A ansiedade dela quando taparam seus olhos para que ela não visse a festa do pijama...

"-Mamãe, por que eu não posso abrir os olhos?- Jane perguntou, enquanto segurava firme as mãos de Livia, que a guiava pela escada depois de ter colocado uma venda nela. A ideia de fazer uma surpresa tinha sido de última hora, eles se tocaram de que Jane sabia sobre a festa do pijama, mas não sobre as roupas que Violet havia comprado ou sobre como estava tudo tão bonito no andar de baixo.

-Porque você não vai ver nada de todo jeito, está usando uma venda.- Livia deu uma risadinha, chegando finalmente ao último degrau. Jane notou quando elas pararam de descer, repentinamente.

-Eu posso tirar a venda agora?"

O amor dela por Sam...

"-Você é o melhor irmão do mundo, Sam! Eu te amo, eu te amo!"

E por Carolyn...

"-Sabe o que o Sam me diz?- ela perguntou a Livia, mas não esperou pela resposta para continuar falando- Que quando uma pessoa é muito boa e vai morar no céu, uma estrelinha nova aparece. Uma estrelinha apareceu quando a minha mãe Carolyn foi morar lá, sabia?"

A admiração Livia que recebia dela...

"-Sabia que quando o meu cabelo crescer de novo, eu vou pintar ele de rosa? Igual a como era o seu? Eu quero ser bonita igual a você..."

A alegria estampada naquele rostinho ao ver que Livia havia pintando o cabelo de rosa, da mesma cor que usou na adolescência...

"-Eu queria te fazer uma surpresa... Você gostou?

-Sim! Sim, sim, sim! Eu amei! Eu te amo, eu te amo muito...- disse, apertando o abraço.

-Eu também, filha...- ela disse baixinho, baixo o suficiente para apenas Jane ouvir a resposta.

-Vem brincar comigo? Por favor! Eu quero ficar com você a noite toda!"

A última conversa que tivera com Oliver...

"-Eu queria te dizer que eu gosto muito, muito de você, Jane... Eu vou vir aqui brincar com você e, quando você sair do hospital, a gente brinca lá na sua casa e também assiste televisão. O papai disse que a minha casa fica um pouco longe, mas você pode ir lá também.

-Vai dar para levar os meus brinquedos para conhecerem os seus...- por um instante, ela parecia um pouco mais animada, mas logo perdeu as forças novamente- Você promete que volta?

-Sim, prometo..."

A última vez que elas prometeram de dedinho, que também foi a última coisa que fizeram juntas...

"-Eu prometo de dedinho que, se você não for morar no céu, a gente nunca mais vai se afastar, eu e a Catarina vamos nos mudar para perto daqui, já falei com ela, e eu prometo que, se você for, eu vou falar com você todas as noites, pensar em você todos os dias e, em alguns anos, te encontrar lá no céu e te dar um abraço bem apertado. E você? O que promete?

-Eu prometo de dedinho que, se eu não for morar no céu, vou ficar sempre perto de você e, se eu for, vou ficar te esperando até que você chegue. E a minha estrelinha vai brilhar bem em cima da sua casa, igual a da mamãe Carolyn e a da Belle, que brilham em cima da minha.

-Feito. Se as duas cumprirem, é porque realmente gostamos uma da outra, mas, se não cumprir...

-Estraga a brincadeira!- ela exclamou, com um sorriso livre de receios- Eu não tô mais com medo, mamãe...

-Que bom...- Livia realmente se sentiu aliviada- Vem cá...- ela a puxou para mais perto de si, abraçando-a e beijando-a na cabeça- Eu te amo, filha, eu te amo mais do que tudo, sempre amei e sempre vou amar. Nunca, nunca esqueça disso...

-Eu também te amo, mamãe. Essas foram as melhores semanas da minha vida.

-Daqui em diante, você só vai ser feliz, Jane.- desvencilhou-se da filha, vendo a tranquilidade na expressão dela e olhando o seu rosto mais uma vez, só para ter certeza de que nunca o esqueceria- Pronta para ir?

-Sim!"

Todos esses momentos passavam pela cabeça de Livia, como se fossem as cenas de um filme, em ordem cronológica. Ela podia ver claramente Jane em sua mente e lembrar-se de todos esses eventos, mas não como se tivessem sido verdade. De repente, o seu tempo com Jane não parecia realmente ter acontecido, era como se tudo tivesse sido parte de um sonho. Um sonho incrível, mas ainda assim, só um sonho.

Fisicamente, ela estava no velório, mas o seu psicológico vagava por lugares muito distantes daquele. Ela se lembrava de ter colocado um vestido preto algumas horas antes e de quase ter saído para comprar outro quando viu o tamanho do decote dele. Livia não havia levado roupa para enterro, porque em nenhum momento aceitara, de fato, que talvez tivesse que ir a um.

Ela lembrava de ter pego uma carona com Amelia até o cemitério e de cumprimentar e ser abraçada por algumas pessoas (a maioria era da vila e não sabiam quem ela era), e até se recordava de ter escondido o rosto do sol que incidia sobre a área verde do cemitério, onde acontecia a cerimônia, enquanto ia pegar um assento, o da frente, é claro, mas era só isso. Livia mal havia prestado atenção no que o padre e no que outros conhecidos de Jane disseram sobre ela, não havia se atentado a nenhuma das homenagens ou reparado nas flores, por mais que ela mesma as tivesse escolhido.

Na última semana, Livia tinha feito tudo no automático. Depois de passar a noite no hospital, mantida por remédios, ela entrou em um estado de choque e de certa negação, por assim dizer. Suas lágrimas deviam ter se esvaído depois do baque inicial, porque nada mais a fez chorar de novo. Nem preparar o velório de Jane, nem escolher as fotos que seriam expostas, nem lidar com o pranto incessante de Sam, nem a ausência de Jane no seu quartinho, da vozinha dela pela casa... Nada. O velório estava bem ao seu redor e todas as lágrimas que deveriam descer estavam se transformando em devaneios.

-Lila... Lila...- ela ouviu de modo distante e, no terceiro "Lila", despertou e olhou para o lado. Mike a chamava delicadamente, ele e Elena tinham ido à Stratford o mais rápido que puderam, assim que a notícia lhes foi dada. O rapaz usava um terno preto que devia estar um pouco velho, mas quem ia reparar nisso?- É a sua vez. A homenagem final.

Livia virou a cabeça para trás e viu que todos os olhares estavam nela, esperando por palavras bonitas ou por um ataque de pânico. Ela demorou um pouco para se situar e, só quando reparou no toque no papel que segurava em suas mãos, lembrou-se do que Mike estava falando.

-Ah... Claro.- ela levantou, com dificuldade.

-Eu vou com você...- Elena entrelaçou o seu braço no da irmã, apenas para que ela conseguisse dar os cinco passos necessários e subir as duas escadinhas para chegar ao pequeno altar.

Livia colocou o papel que segurava no púlpito de madeira e olhou para as letras impressas nele. Aquelas não eram palavras suas, eram de Catarina. Ela conseguiu convencer a noiva a não voltar à vila, dando diversas desculpas para isso, sendo que a verdade era que Livia sabia o quanto Catarina odiava enterros, mas não conseguiu escrever um discurso fúnebre e, na última madrugada, ligara para a noiva desesperada pedindo que ela mandasse alguma coisa escrita para ela. Livia nem havia lido, mas era Catarina quem havia feito, então estava bom.

Depois ela olhou para frente. As cadeiras disponíveis eram poucas para a quantidade de pessoas que haviam ido se despedir de Jane. A menininha era muito querida na vila e o velório só não chamara a atenção de mais pessoas, porque eram férias escolares de verão e as famílias com crianças estavam quase todas viajando. Ela não pôde evitar olhar para Sam, ao lado do seu pai, que teria saído a nado da Inglaterra se não tivesse conseguido uma passagem de avião tão rápido, e só o que conseguiu notar foi a cabeça dele baixa a os seus olhos verdes fundos, como se ele tivesse chorado a noite inteira. Livia apostava que ele tinha, assim como apostava que alguém precisara levantá-lo da cama, vesti-lo e colocá-lo dentro de um carro para levá-lo até ali, porque ele não conseguiria sozinho. Era presunção demais dizer que Sam estava vivo naquela última semana, ele era, no máximo, um ser ambulante, quase que diluído em lágrimas e tristeza. Sofia estava do outro lado dele, junto a Violet, que segurava a coleirinha de Charlie, o cachorrinho estava quieto, parecia até que sabia que algo de errado estava acontecendo. Jackson havia ficado no hotel com Oliver, seria demais para uma criança de cinco anos estar ali, todos concordavam com isso.

Voltou-se para o papel, o silêncio das pessoas esperando que ela dissesse alguma coisa era quase que constrangedor. "Quando uma pessoa vai embora" eram as primeiras palavras, mas Livia não conseguiu proferi-las antes de encarar o caixão aberto ao seu lado.

Era tão, tão pequeno, embora parecesse grande demais para o corpo franzino de Jane. Haviam fechado os olhos dela, no mesmo dia em que ela falecera e, se não fosse o caixão, pareceria que ela estava apenas dormindo serenamente, depois de tanto tempo de dor e sofrimento acordada. Ela havia sido trajada com um vestido amarelo cheio de borboletas e uma tiara com um enfeite do animal da mesma cor, as mãozinhas repousavam uma em cima da outra sobre a pequena peça.

Em volta do caixão, estavam flores cor-de-rosa, as favoritas dela, e uma foto sua de quando era mais nova, ela devia ter uns dois anos e estava fantasiada de coelhinha, as duas bochechas com três listrinhas pretas, como se fossem o bigode, e o nariz com uma bolinha vermelha, como se fosse o do coelho. As orelhinhas estavam por cima dos seus cachinhos bagunçados e o sorriso dela estava tão aberto, que fez com que todas as lágrimas que não haviam vindo durante a última semana quisessem vir de uma vez. Era demais, era demais para Livia ver aquela foto em contraste com o corpo inerte no caixão. Era inacreditável de tal maneira, que ela poderia achar que a filha acordaria a qualquer momento e correria para abraçá-la, chamando-a de "mamãe".

Ela voltou novamente para o papel e, assim que sua irmã tocou o seu ombro, voltou também para si, dobrou-o e colocou-o em um dos bolsos do vestido. Inspirou profundamente e fechou os olhos por um momento.

-Dizem que tudo o que acontece é por uma razão...- começou, com as duas palmas apoiadas no púlpito- E eu odeio quando as pessoas dizem isso, porque não passa de uma desculpa esfarrapada. Eu não vou subir aqui e dizer que morrer foi melhor para a minha filha, porque ela estava sofrendo muito e agora está em algum lugar bom.- alguns cochichos discretos ocorreram entre os estranhos, que haviam acabado de descobrir qual era a ligação entre Livia e Jane. Uma lágrima escorreu pelo rosto de Sam- Minha filha não devia nem ter sofrido, para começo de conversa, e o lugar bom para ela era aqui comigo, com o Sam e com o resto das pessoas que ela ama. A Jane não viveu por pouco tempo porque a sua única missão era passar uma mensagem na Terra, ela era uma pessoa, não um pedaço de papel. Ela também não veio para me salvar, salvar o Sam ou para nos ensinar alguma coisa, porque ela era uma criança e crianças precisam ser salvas e ensinadas e não o contrário!- ela bateu no púlpito e sua voz tornou-se mais trêmula e alta.

-Livia...- Elena apertou o ombro dela.

-Tudo bem, eu estou bem...- recompôs-se, respirando fundo mais uma vez para continuar de onde havia parado- S-sendo assim, não houve nenhum propósito plausível para a morte da minha filha. E, se para vocês, que estiveram com a Jane desde que ela nasceu até hoje é difícil, para mim, que perdi praticamente a vida inteira dela, não é mais fácil. Sabem por quê? Porque, não importa quais foram os meus motivos, desde que descobri que estava grávida, eu fiz de tudo para que a Jane não apenas sobrevivesse, mas vivesse. Eu fiz de tudo para que ela não tivesse uma vida como a que eu e tantos outros tivemos... Eu fugi, me humilhei, coloquei pessoas em perigo, fiz o que podia e o que não podia fazer, encontrei uma família incrível para ela...- Livia balançou a cabeça, já com o pranto acumulado começando a descer, e deu uma risadinha ao lembrar-se de toda aquela jornada- E, no final, tudo o que eu assisti foi o nascimento e a morte dela. Pode parecer egoísta e, talvez até seja mesmo, mas eu queria ter visto mais. Queria ter visto a minha filha crescer até depois dos seus oito anos, eu queria vê-la preocupada com as provas do colégio, escrevendo poesias em folhas de caderno para garotos, eu queria vê-la passar horas escolhendo o vestido mais bonito para o último baile da escola... Eu queria vê-la terminar a escola, ir para a faculdade, sair dela, conhecer o mundo e talvez também conhecer alguém...- ela deu uma pausa e apoiou os cotovelos no púlpito, para que o choro forte pudesse sair na privacidade das suas mãos, sentiu Elena apertando o seu ombro e ergueu a cabeça novamente, enxugando as suas bochechas. O choro dela havia puxado o de muitas das pessoas sentadas- Eu não vou ver nada disso no final das contas... Tudo o que eu tive foram algumas semanas quando eu queria uma vida inteira com ela, embora eu tenha certeza de que nunca seria tempo o bastante.

Sam começou a perder o controle sobre si mesmo e o seu pai o abraçou, tentando ajudá-lo. Aquilo partiu a parte do coração de Livia que ainda poderia estar inteira, ela umideceu os lábios antes de continuar e o gosto era muito, muito salgado.

-Então... Se a morte da Jane não teve nenhum propósito, vamos dar um...- Livia sorriu com os lábios trêmulos- Tem algumas poucas coisas que acontecem ao longo das nossas vidas que mudam a nossa percepção, pelo menos por alguns dias. O contato com a morte é uma delas. Quando nós choramos por alguém que morreu, parece que todos os defeitos e momentos ruins que vivemos com a pessoa sumiram e só restaram os bons. Nós choramos principalmente porque sabemos que nunca mais vamos ter a chance de viver um outro momento bom com a pessoa e sentimos falta disso, do que não vamos ter, e isso nos deixa assustados, não é? De repente, nós começamos a ceder às vontades de alguém que amamos, nós brigamos menos por medo da coleção de momentos ruins ser maior do que a dos bons, alguns até vivem mais intensamente, ao repararem que a vida é finita. E isso dura algumas semanas, alguns meses, no máximo, depois tudo volta ao normal e eu não estou criticando, é o ciclo natural... Mas eu quero propor uma coisa.

Antes que ela pudesse completar, Sam levantou da sua cadeira, completamente fora de si e com falta de ar de tanto que chorava, e se viu obrigado a sair dali. Livia quis correr atrás dele, mas todos pareciam concordar que ele precisava ficar sozinho um pouco.

-E-eu queria propor que, todas as vezes que vocês pensarem na Jane, não se lembrem dela como "a garota que morreu de câncer" ou "a que morreu nova demais". Eu não tive a oportunidade de conviver com ela por muito tempo, mas, pelo pouco que vi, sei que a minha filha foi muito mais do que isso, ela foi uma criança que espalhou luz por onde passou e que foi muito, muito, feliz. Então... Eu quero que vocês, todas as vezes que pensarem nela, se permitam invadir pela mudança de percepção que o contato com a ida de uma pessoa querida traz e façam uma coisa boa a partir disso. Pode ser dar um abraço na sua mãe, dizer ao seu avô o quanto você o ama, fazer uma doação, adotar aquele cachorrinho que você planeja há algum tempo, qualquer coisa boa. Essa é a melhor forma de homenagear a Jane, essa é a maneira de fazer com que a gentileza e doçura dela nunca deixem de verdade esta vila...- Livia virou para o lado e segurou a mão da irmã, depois ergueu um pouquinho a cabeça, olhando para o céu na tentativa de ver algo através dele- Filha... Você prometeu que a sua estrelinha ia brilhar bem em cima da minha casa, lembra? Prometeu de dedinho, eu vou cobrar!- ela ergueu o dedo mindinho e forçou um tom sério na voz- Te vejo no céu meu anjinho...

Depois daquilo, foi a vez dela de não aguentar e precisar sair: Livia jogou-se nos braços da irmã, aos prantos, sendo imediatamente abraçada por ela.

-Tudo bem, Lila, tudo bem... Você não tá sozinha...

-Filha...- Livia ouviu a voz de Amelia atrás de si e logo foi abarcada por ela também. Elena e Mike, que haviam seguido a médica até a irmã, franziram a testa ao ouvirem o "filha", mas não perguntaram nada naquele momento. Violet não chegou a tempo de ouvir.

A última coisa que Livia conseguiu distinguir foi alguém perguntando se já poderiam fechar o caixão.

*     *     *

Ai, esses capítulos machucam </3

Eu não nem como perguntar qual foi a parte favorita, porque acho que o que todo mundo queria era que não fosse necessário se despedir, mas, já que precisamos, me digam, qual foi a cena favorita de vocês com a Jane?

Vejo vocês na quarta <3

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